Internacional
A brutal realidade das prisões em Belarus
Ao libertar 2 mil detidos nos protestos em Minsk, vice-ministro do Interior bielorrusso assegurou não haver maus-tratos. Três presos contam à DW uma história de surras, humilhações, eletrochoques e arbitrariedade.
“Eles espancavam e perguntavam: ‘Então, nós somos fascistas?’ Quando estão te enchendo de cacetadas, você certamente não vai dizer: ‘Claro que vocês são fascistas!'” Quem conta é “Andrei”, que não quer ter seu nome verdadeiro revelado.
“Mas então o que é que vocês são”, pergunta o bielorrusso, dirigindo-se às forças de segurança que maltrataram os presos, “se o trabalho de vocês é surrar gente, e vocês ainda por cima se divertem?” Ele é um dos quase 7 mil cidadãos detidos em Belarus durante os protestos após as eleições presidenciais.
Na quinta-feira (13/08), depois de o governo libertar mais de 2 mil deles, o vice-ministro do Interior, Alexander Barsukov, se apresentou à imprensa, diante de um presídio na capital Minsk, anunciando: “Não houve maus-tratos!” Andrei e dois outros presos contam uma história diferente à DW.
Eletrochoque nos rins
Pavel Chudka foi preso na noite de 10 de agosto em Minsk. Depois de já estar caído no chão, os agentes de segurança ainda o torturaram com eletrochoques na região dos rins. “É certo que não deixa marcas visíveis, mas eu ainda sentia os choques elétricos três a cinco minutos mais tarde, nem conseguia andar.”
Sua garganta e mandíbula inferior ficaram tão tensas, que ele não podia falar, e mais de um dia e meio depois não conseguia engolir; até hoje as mãos lhe tremem. E aos maus-tratos físicos somou-se a humilhação: “E aí, está gostando?”, gritavam seus algozes. “Quer mais? Vai agora para a rua protestar?”
Em seguida, Pavel foi levado à prisão da rua Okrestina. Entre as centenas de manifestantes lá reunidos, viu muitos que também haviam apanhado. Foi forçado a esperar no pátio interno do prédio, em posições dolorosas.
“Você fica ajoelhado por duas horas, com as mãos atrás da cabeça, e a cabeça no chão. Ou se apoia numa parede com as mãos e a cabeça.” A cada 20 minutos, aproximadamente, os policiais ordenavam aos presos para engatinharem de uma parede à outra, a uma distância de 20 a 30 metros.
No tempo em que esteve detido, uma ambulância passou quatro vezes, mas os paramédicos foram impedidos de entrar. O presídio estava superlotado: “Numa cela de dez metros quadrados ficavam 25 pessoas, também menores de idade que mais tarde foram os primeiros a ser libertados.”
Cara no chão e atas falsas
Andrei foi preso na noite de 11 de agosto, próximo à estação de metrô Pushkinskaya. Já no furgão de presos lhe bateram nas pernas e ele teve que se ajoelhar. Chegando ao estacionamento da delegacia central de polícia, “já tinha 30 outros deitados, com o rosto no asfalto”.
“Os vigias andavam entre eles, para cima e para baixo, gritando. Nós, recém-chegados, também tivemos que nos deitar, levamos cacetadas e nos jogaram água.” Ele permaneceu cerca de três horas no chão. Apesar de trazer hematomas nas pernas e nas costas, considera-se “um dos sortudos”: “Eu vi gente saindo de lá que estava muito mal mesmo.”
Os presos também tiveram que endossar atas de interrogatório, conta Andrei: foi-lhes apresentado um texto impresso de que constava que o detido “participou de ações não autorizadas, gritou slogans de provocação”. Quem se recusasse a assinar, era levado para a sala ao lado e apanhava mais, até ceder.
Mais tarde, os presos foram trancados em celas lotadas, sem sequer receber água para beber. Na manhã seguinte, Andrei foi transferido para a prisão na Okrestina, onde voltou a ser espancado, só sendo libertado em 13 de agosto.
“Que morram de sede!”
Mikhail (nome modificado a pedido do entrevistado) conta que foi preso e colocado numa van com feridos graves. Uma médica que foi chamada gritou com os soldados, chamando-os de animais, os quais responderam: “Tudo bem, começa a trabalhar.” A noite foi passada na delegacia Leninskom, na capital.
Ele sequer participara de uma manifestação, conta, foi simplesmente arrancado de seu carro. “Ficamos presos num engarrafamento. Uns homens de escudos e cassetetes vieram até nós, pensei que fossem da tropa especial das forças internas. Eles nos mandaram sair do carro e entregar nossos celulares, para conferir se a gente levava fotos ou vídeos dos protestos.”
Mikhail tinha um vídeo em que manifestantes portavam a bandeira branca e vermelha que até 1995 foi o pavilhão nacional de Belarus, e atualmente é usada por partes da oposição. Ele foi imediatamente detido.
“Os soldados que me levaram me aconselharam a ficar quieto. Por isso não me bateram. Outros foram espancados brutalmente no furgão de transporte. Do meu lado, estava um homem que nem conseguia mais falar. Ele só gemia baixinho e parecia que não se sustentava sozinho nas pernas.”
Na delegacia Leninskom, Mikhail também presenciou surras a cacetadas e socos. Entre os presos viu quatro mulheres e um adolescente. Ele passou a noite do lado de fora, com o rosto para o muro e algemado. Embora estivesse tonto, não deixaram que se sentasse, e não lhe deram nada para beber. Um dos vigias gritou: “Tirem a água deles, deixem morrer de sede!”
Ao ser libertado pela manhã, Mikhail reconheceu que, apesar de tudo, sua detenção fora relativamente inofensiva, comparado a tudo o que presenciara.
DW