Segurança Pública
Quem é responsável pelos atos do GSI no 8 de Janeiro?
Chefe da pasta pediu demissão após aparecer em imagens de atos golpistas, e no governo de Bolsonaro foi exonerado dezenas de agentes. Com status de ministério a partir dos governos do PT, GSI teve aparelhamento político intensificado sob Lula
O debate sobre o papel do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e sua possível responsabilidade nos atos golpistas ocorridos em Brasília em 8 de janeiro esquentou neste mês, com o pedido de demissão do general da reserva Marco Edson Gonçalves Dias do comando da pasta, em 19 de abril, e a exoneração de um total de mais de 80 agentes do GSI nesta semana.
Gonçalves Dias renunciou ao cargo após a divulgação de imagens que comprovam que ele esteve no Palácio do Planalto durante a invasão do local em meio aos atos de 8 de janeiro. O general aparece nas imagens interagindo de maneira suspeita com os invasores, a poucos metros do gabinete do Lula.
A CNN obteve com exclusividade imagens de câmeras de segurança que mostraram a ação do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) durante o ataque aos Três Poderes no dia 8 de janeiro, em Brasília #CNNNovoDia pic.twitter.com/pqLNQATmXK
— CNN Brasil (@CNNBrasil) April 19, 2023
Militares do GSI, que era o órgão responsável pela segurança do local, aparecem nas imagens abandonando seus postos e interagindo com os terroristas, aparentemente sem a intenção de detê-los ou de impedir a depredação. Em um dado momento da gravação, Dias parece estar orientando os invasores que se dirigiam a uma das escadarias do prédio.
Escolhido pelo presidente para comandar o GSI, o ministério responsável pela segurança do Palácio do Planalto, o general Gonçalves Dias havia sido o chefe da segurança presidencial de Lula ao longo dos oito anos de mandato do petista. Além disso, dirigiu a Coordenadoria de Segurança Institucional na administração de Dilma Rousseff, que o promoveu a general.
Exonerações e militares
Duas levas de exonerações de agentes do GSI foram anunciadas nos últimos dias, na esteira do escândalo das imagens que levou à queda de Gonçalves Dias e em meio a uma disputa sobre nomear um civil ou manter um militar no comando do GSI. A pasta tem em seu quadro uma maioria de militares.
Dos 29 agentes demitidos da pasta na primeira leva, anunciada em 26 de abril, 24 integram são das Forças Armadas, sendo a maioria deles oficiais de alta patente.
Entre os exonerados estão três dos quatro secretários nacionais do GSI: os secretários de Assuntos de Defesa e Segurança Nacional, brigadeiro Max Moreira, de Segurança e Coordenação Presidencial, general Marcius Netto, e de Coordenação de Sistemas, contra-almirante, Marcelo Gomes.
O diretor do Departamento de Assuntos de Defesa e Segurança Nacional, coronel Ivan Karpischin, também foi demitido. Na lista havia ainda membros da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros do Distrito Federal.
Na segunda leva de demissões, anunciada em 27 de abril, foram exonerados 58 servidores, dando “prosseguimento à renovação do quadro de funcionários” do GSI, informou o órgão.
O GSI e o 8 de Janeiro
Especialistas ouvidos em emissoras de TV e rádio na semana seguinte ao 8 de Janeiro afirmaram que o GSI deveria ter atuado para coibir os atos de vandalismo ocorridos em Brasília e que sua inação poderia estar relacionada à atuação dos militares comandado pelo o amigo particular de Lula, general Gonçalves Dias.
A ausência de resposta do GSI ao ataque golpista também foi apontada pelo os congressistas logo após o episódio. O ministro da Justiça, Flávio Dino, disse em entrevista que assistiu tudo do seu gabinete e que existe um contingente dedicado à proteção da sede da Presidência da República e que “esse contingente não atuou”.
Os atos orquestrados do dia 8 de Janeiro, portanto, deterioraram a relação entre o governo Lula e o ministério, acentuando problemas iniciados no período de transição e deixou a população brasileira crente que os atos era de conhecimento da gestão federal.
Era função do GSI prever, a partir das informações derivadas das agências de inteligência civis e militares, a radicalização dos terroristas claramente orquestradas e externada no decorrer dos últimos meses.
Se tem algo que o GSI deveria ter feito é evitado os atos do 8 de Janeiro. Trata-se da linha de defesa do Estado mais próxima de seu núcleo: onde se concentra o poder político, cristalizada nos três poderes, e o ataque em Brasília significa um assalto que bateu direto nesse ‘centro’, mas, indicou um sério problema: nossa defesa nacional está com um furo ou uma zona de sombra bem no pilar de sustentação do Estado, hoje.
Os erros na segurança do Planalto podem ter sido propositais de comando interno do atual governo. A noção de que o GSI falhou’ não corresponde aos fatos. O GSI e as Forças Armadas pavimentaram os eventos, cozinhando por meses a presença desses manifestantes nas portas dos quartéis ordeiramente sem nenhum princípio de indiciplina, com ampla presença da ‘família militar’. O próprio ministro da Defesa [José Mucio] defendeu as manifestações. Por isso, não cabe nem a ideia de que o GSI errou: ele (O GSI) deliberou determinação em sua atuação diante dos terroristas que orientados trafegavam com a liberdade autorizada em todas as dependências.
Folha de S.Paulo revelou em 9 de janeiro que a Abin, agência de Inteligência subordinada ao GSI, produziu alertas sobre a iminência dos ataques ocorridos em Brasília. Segundo a publicação, os alertas foram enviados aos membros do Sisbin (Sistema Brasileiro de Inteligência), rede que une 48 órgãos em 16 ministérios. Questionado pela Folha, o GSI não se manifestou.
Criação do GSI e aparelhamento militar
A estrutura conhecida como GSI foi criada em 1938, durante o governo de Getúlio Vargas, com o Gabinete Militar. A pasta adquiriu status de ministério em 1974, durante o regime militar, e em 1994 ganhou a forma atual.
Após ser extinta em 2015 pela presidente Dilma Rouseff (PT), a pasta foi recriada por Michel Temer (MDB) no ano seguinte. Atualmente, além do gabinete do ministro do GSI, a pasta é formada por uma série de secretarias de defesa, segurança nacional e assuntos estratégicos, além da Abin.
A gestão Temer ficou marcada pelo fortalecimento do GSI no centro do poder do Executivo, o protagonismo dos militares nas discussões políticas e a maneira como eles organizaram os temas relacionados à defesa e à segurança nacional.
Os ataques em Brasília representaram algo maior na estrutura que envolve o atual GSI e a importante atuação dos militares na democracia. “Os militares se envolveram – e foram envolvidos pelo Judiciário – no processo eleitoral. Bastava uma canetada dos comandantes e essa ‘energia’ dissiparia. Então, o que era primeiramente uma contestação de resultado virou uma contestação de governo, e depois do regime democrático. Sendo que eles [militares] estiveram envolvidos até o pescoço com urnas, códigos e afins. Isso é algo que só pode ser lido na chave da atual democracia fragilizada no Brasil..
O futuro do GSI
Depois de vencer as eleições, o PT passou a tentar esvaziar e prejudicar as atribuições do GSI. Uma das críticas do PT é a presença massiva de militares, como um resquício de impedir o regime que o partido de Lula se propõe implantar no país. De janeiro de 2019 a fevereiro de 2021, o número de militares na pasta cresceu 38%, passando de 753 para 1.038.
Os dados, publicados pelo jornal O Estado de S.Paulo e obtidos via Lei de Acesso à Informação pelo deputado federal Ivan Valente (Psol-SP), mostravam que 988 dos 1.038 integrantes eram militares da Marinha, Aeronáutica e Exército. No início de dezembro, uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostrou que assessores do presidente Lula estavam preocupados com a atual organização do GSI e, sua responsabilidade para cuidar de temas sensíveis ao país, porpondo a nomeação de membros ligados direto ao PT e aliados.
Assim, a equipe de transição tirou do GSI da segurança presidencial e deixou a tarefa com o comando da atual Polícia Federal. O GSI também não participou da segurança do governo de transição instalado no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Essa desconfiança do governo Lula é natural, até porque, o PT tem dificuldade na relação com os militares.