Internacional
A América Latina está dividida e, portanto, mais fraca do que nunca
A América Latina de hoje lembra a dos anos 1980: uma região carente de solidariedade e que ignora sua identidade comum. Ao não tomar as rédeas do próprio destino, ela vem perdendo peso no cenário internacional.
O triste cabo de guerra durante a eleição do novo presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) mostra claramente como a América Latina afundou: embora os latino-americanos sempre tenham estado no comando do banco desde que foi fundado, em 1959, o governo dos Estados Unidos agora escolheu um norte-americano como novo presidente. Com Mauricio Claver-Carone, o presidente Trump elegeu um político que até agora deu pouca atenção ao desenvolvimento e ao financiamento. O advogado é um dos dos principais linhas-duras anti-Cuba nos EUA, e desempenhou um papel fundamental na política de Trump de embargo à Venezuela.
No curto prazo, a decisão pessoal de Trump pode ser explicada em termos de tática eleitoral e, no médio prazo, se dirige contra a China. Trump quer garantir os votos dos conservadores latino-americanos na Flórida nas eleições presidenciais em novembro. E, ao assumir o comando do banco interamericano, Claver-Carone também deve conter a influência da China como investidora – o país concede cerca de 14 bilhões de dólares em empréstimos por ano na região.
Como mais importante acionista do BID, os Estados Unidos têm grande influência nas decisões relativas a pessoal. Mesmo assim, Claver-Carone precisava de apoiadores na região – o que para Trump não foi difícil de conseguir. Dos 28 Estados da região, 23 teriam votado no candidato dos EUA. O resultado exato da votação não será divulgado. Brasil e Colômbia já haviam se manifestado publicamente a favor de Claver-Carone. Os governos de esquerda da Argentina e do México – que, junto com a Costa Rica, o Chile e os acionistas europeus queriam adiar a votação para após as eleições nos Estados Unidos – também acabaram cedendo.
A vergonhosa derrota dos latino-americanos numa das instituições multilaterais mais importantes do continente mostra que os governos não falam em uníssono, nem querem tomar juntos as rédeas do próprio destino. A América Latina de hoje lembra a dos os anos 80 do século passado: uma região dividida, carente de solidariedade e que ignora sua identidade comum. Cada governo só se preocupa consigo mesmo, o que torna a América Latina passiva – e fraca.
Mesmo governos ideologicamente semelhantes não trabalham juntos: o que se aplica a presidentes de esquerda como os da Argentina e do México. Mas também ao governo populista de direita de Bolsonaro, que não apenas não consegue encontrar uma posição comum com os chefes de Estado conservadores do Chile ou da Colômbia – como nem mesmo está à procura dela. A diplomacia do Brasil busca proximidade apenas com os Estados Unidos. Os governos nem pensam mais em promover projetos regionais, como o Mercosul ou a Aliança do Pacífico.
Para a América Latina, é um mau sinal: unidos, os países teriam peso na política mundial – por exemplo, na ONU. Mesmo como fornecedora mundial de alimentos e matérias-primas, uma América Latina unida poderia aumentar significativamente a influência da região. Sozinhas, até mesmo grandes economias, como as do Brasil e do México, são apenas pesos-leves no cenário internacional.
Há mais de 25 anos, o jornalista Alexander Busch é correspondente de América do Sul do grupo editorial Handelsblatt (que publica o semanário Wirtschaftswoche e o diário Handelsblatt) e do jornal Neue Zürcher Zeitung. Nascido em 1963, cresceu na Venezuela e estudou economia e política em Colônia e em Buenos Aires. Busch vive e trabalha em São Paulo e Salvador. É autor de vários livros sobre o Brasil.