Judiciário
Afinal, o que é a certidão carcerária?
Se você estuda, trabalha, ou vive no mundo da execução penal e direito penitenciário já deve ter ouvido falar neste documento
Nas semanas passadas tratamos muito de assuntos ligados à execução penal, como a Progressão de Regime e a Liberdade Provisória, a Análise dos requisitos para a Progressão de Regime e outros. Desta vez, trataremos sobre um documento. Sim, um documento muito importante para quem está cumprindo pena e para o processo de execução penal: a certidão carcerária.
– O que é a certidão carcerária?
O dicionário jurídico afirma que certidão é um documento assinado por servidor público, que sob fé pública, atesta ou declara algum fato ou registro relacionado com o que se pede. Isto é, a certidão é um documento que atestará a ocorrência ou não de algum fato. Logo, a certidão carcerária será o documento que atestará todos os fatos acontecidos com a pessoa presa.
A certidão carcerária é assinada por um servidor público: o diretor do estabelecimento prisional, que vai atestar a veracidade ao que estiver narrado/escrito no documento; é documento oficial do Estado: daí se entende que tem fé pública e serve como prova documental.
A Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, XXXIV, b) garante como direito fundamental a obtenção de certidão junto aos órgãos públicos, sem precisar pagar por isto, para a defesa de direitos ou contra a ilegalidade ou abuso de poder. Assim, esclarece um pouco mais o texto constitucional a Lei nº 9.501/1995, que dá prazo de 15 dias para atendimento do requerimento que pede a certidão, exigindo que neste requerimento (ofício) conste a razão do pedido, uma vez que o direito fundamental de obter a certidão se baseia na defesa de direitos, na luta contra a ilegalidade ou abuso de poder.
– Para que serve a certidão carcerária?
A certidão carcerária serve para registrar, como em um prontuário hospitalar, todas as informações processuais (como datas de prisão e soltura, números dos processos, quantidade de dias remidos, etc) e administrativas (existência de PAD, comportamento carcerário) relevantes, isto é, importantes para serem analisadas em um processo, seja ele ainda uma ação penal, seja execução penal.
Um fator importante e imprescindível desta certidão deve ser a classificação do comportamento da pessoa presa, pois será por meio do comportamento que será verificado o preenchimento do requisito subjetivo para a progressão de regime, livramento condicional, trabalho externo e a saída temporária, ou seja, o chamado bom comportamento carcerário. Para saber mais sobre este ponto, recomendo a leitura do artigo: “Qual o momento para análise dos requisitos da Progressão de Regime? ”.
Na verdade, a certidão carcerária é como um “coringa” no processo, pois além de dar as informações e servir como prova documental, também forma a opinião do julgador (do juiz) na análise de quase todos os pedidos feitos, até mesmo de pedido de remição de pena, pois denota o desenvolvimento do comportamento do preso durante todo o processo. Veja parte de decisao do Tribunal de Justiça de Goiás sobre a certidão carcerária e o pedido de remição:
Embora a comprovação dos dias trabalhados deva ser feita através de ficha de ponto ou outro controle adotado no estabelecimento penal, nada impede que se faça por atestados ou qualquer outra prova idônea. A certidão carcerária, devidamente assinada pelo Supervisor Interino do CIS, constitui meio hábil para comprovar o desempenho dos serviços prestados pelo agravado, bem como atestar o período de seu cumprimento, apta a embasar a concessão do pedido de remição (TJ-GO, AGEPN 535329220138090134, Quirinópolis, Relator: Des. João Waldeck Felix de Sousa. 23/05/2013).
– Como conseguir a certidão carcerária?
Para obter a certidão carcerária é necessário que seja feito um requerimento oficial para a Administração Penitenciária, na figura do diretor da unidade prisional. Este requerimento deve conter a finalidade da obtenção da certidão, os dados de identificação do preso (nome completo, filiação, às vezes o número do prontuário) e do requerente (aquele que está pedindo o documento).
Se o preso for assistido por defensor público, caberá ao defensor requerer, por meio de ofício, ao diretor do estabelecimento prisional a certidão carcerária. Se for patrocinado por advogado, por meio de simples requerimento perante o diretor.
Nada impede que em petição dirigida ao juiz, seja solicitada a certidão carcerária. Desta forma, caberia ao juiz expedir ofício ao diretor do presídio para que envie a certidão. Em verdade, esta é uma das melhores formas de obter o documento.
– Requeri a certidão carcerária e não a recebi. O que fazer?
Este é o drama que muitos familiares de pessoas privadas de liberdade se deparam todos os dias. Muitas vezes mesmo sendo feita a requisição da certidão carcerária, a autoridade administrativa não expede e responde ao requerente. Com isto, não resta alternativa senão a de pedir pela via judicial a obtenção do documento.
Se o familiar do preso chega na Defensoria Pública ou perante o advogado questionando a demora na expedição da certidão carcerária, ou o envio desta, o primeiro passo é analisar quanto tempo se passou desde a requisição. Caso seja constatada a demora, o segundo passo deverá ser a reiteração da requisição e o peticionamento ao juiz, narrando os fatos e requerendo o envio da certidão carcerária, sempre em caráter de urgência, pois trata-se de direito à liberdade.
A demora deve ser constatada com base na realidade. O direito é prisioneiro da realidade, logo, apesar de 15 dias ser um prazo razoável, em alguns casos a expedição demorará mais. Uma coisa é expedir a certidão carcerária de um preso condenado a 6 anos de prisão por crime de roubo, por exemplo, outra coisa é expedir a certidão do Marcola (narcotraficante, com vários processos e condenações).
De qualquer maneira, a demora deverá sempre ser analisada pelo advogado ou defensor público sob os critérios da razoabilidade e proporcionalidade.
Alguns advogados preferem entrar com Ação de Exibição de Documento, mas encontram a negativa no pedido, porque geralmente não houve sequer a expedição da certidão carcerária, assim, não há o que ser exibido e sim o que ser confeccionado. Por isto, a melhor alternativa é buscar com o juiz da execução penal ou o juiz criminal que seja obtida a certidão carcerária.
Se está gostando do tema, veja os demais artigos sobre Execução Penal já escritos:
- Qual o momento para análise dos requisitos da Progressão de Regime?
- A Reabilitação de Falta Grave na Execução Penal.
- O direito de recorrer em liberdade e a progressão de regime. Qual o melhor entendimento?
- Remição de Pena, o direito incompreendido (parte 1).
- Remição de Pena, o direito incompreendido (parte 2).
Caio Vinícius – Bacharel em Direito pela Universidade de Fortaleza (Unifor). Advogado (OAB/CE nº 44.197).