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PEC 135/19: Voto impresso auditável e os 25 anos da urna eletrônica
Em maio de 2021, discussões em volta da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 135/19, que trata sobre a alteração Constitucional quanto ao processo eleitoral, repercutiram intensamente. Vamos entender o que busca a PEC 135/19 e como ela pode mudar o sistema eleitoral no Brasil.
Entendendo a PEC 135/19
A PEC tem autoria da Deputada Federal Bia Kicis (PSL-DF) e pretende realizar uma mudança significativa no sistema eleitoral brasileiro com a inclusão de cédulas de papel junto as urnas eletrônicas, popularmente debatido atualmente como o voto impresso.
O texto da proposta sintetiza a inclusão do parágrafo 12 no Art. 14, da Constituição Federal. Dessa forma, caso a PEC seja aprovada no Legislativo, teremos o seguinte texto na CF:
“Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:
(…)
§ 12 No processo de votação e apuração das eleições, dos plebiscitos e dos referendos, independentemente do meio empregado para o registro do voto, é obrigatória a expedição de cédulas físicas conferíveis pelo eleitor, a serem depositadas, de forma automática e sem contato manual, em urnas indevassáveis, para fins de auditoria.”
Em razão da sensibilidade do tema, a PEC foi encaminhada para análise da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC), que tem por finalidade avaliar se a proposta não fere algum princípio constitucional ou cláusula pétrea (norma inalterável da Constituição Federal).
Importante destacar que a CCJC, que irá discutir a PEC 135/19, é composta por deputados federais que dispõem suas considerações na comissão, pelos convidados que fazem o depoimento, pelo Relator Deputado Federal Filipe Barros (PSL-PR), pelo presidente da comissão, Deputado Paulo Eduardo Martins (PSC-PR), e pela vice-presidência na pessoa de Pompeo de Matos (PDT-RS).
QUAL A MODIFICAÇÃO PROPOSTA PELA PEC 135/19?
Como mencionamos, a proposta busca incluir o parágrafo 12, no Art. 14 da CF, para o processo eleitoral. Isso significa que o eleitor, assim que realizar o voto na urna eletrônica, irá visualizar um documento impresso confirmando seu voto – em seguida, a cédula é depositada automaticamente em uma urna lacrada que será utilizada para fins de auditoria. Dessa maneira, a urna eletrônica não seria descartada, haveria uma inclusão de outra urna com cédulas impressas depositadas pelos eleitores.
A deputada federal Bia Kicis defende que dentro do sistema eleitoral eletrônico é essencial ao eleitor ver e conferir com seus próprios recursos o conteúdo inalterável que registre seu voto, criticando decisões tomadas pelo Tribunal Superior Eleitoral no decorrer dos anos. Importante destacar que a cédula impressa não irá associar o voto a cada eleitor, mas sim, evidenciar o candidato que recebeu o voto.
A URNA ELETRÔNICA É SEGURA?
Nesse debate, outra discussão importante é quanto à segurança das urnas eletrônicas. O Tribunal Superior Eleitoral, inclusive, já alegou inúmeras vezes que a seguridade da urna é garantida, isto pois: a urna eletrônica utiliza o sistema operacional Linux; não utiliza conexões bluetooth e wi-fi (o que impossibilita ataques cibernéticos) e é conectada apenas ao cabo de energia; a segurança das urnas é realizada em diversas camadas ou barreiras; e os softwares são assinados e desenvolvidos digitalmente pelo TSE exclusivamente para as eleições.
Por fim, o Tribunal garante a aplicação de diversas auditorias para realizar o levantamento de eventuais falhas e melhorias no processo eleitoral. O processo de auditorias é sucintamente feito em três etapas principais, que são:
- Testes públicos de segurança (testes técnicos nos quais atuam desenvolvedores, PF, técnicos e demais interessados);
- Inspeção dos programas eleitorais (verificação do programa eleitoral, avaliando sua estabilidade e segurança);
- Cerimônia de assinaturas e lacração (etapa de recolhimento das assinaturas das entidades públicas).
O teste público de segurança realiza, durante uma semana, vários testes (ataques legais) ao sistema eleitoral das urnas onde atuam desenvolvedores, Polícia Federal, hackers, técnicos da computação e demais interessados. Após a certificação dos testes e inspeção dos programas eleitorais, ocorre a cerimônia pública de assinaturas e, por fim, o processo denominado como Lacração. Essa etapa garante que o documento físico assinado pelas autoridades públicas seja guardado em uma sala cofre no TSE, que está disponível para consulta a qualquer momento.
Ao todo, realizam-se nove tipos de auditorias que contemplam os variados tipos de verificação de segurança nas urnas eletrônicas e no processo eleitoral. O TSE alega que este sistema de votação procura reduzir a manipulação humana e promover maior agilidade ao processo eleitoral.
Em maio de 2021, completam-se exatos 25 anos da implantação da urna eletrônica. A Justiça Eleitoral destaca a importância desse marco histórico exaltando como, a partir da utilização da urna eletrônica, o processo eleitoral ganhou celeridade e maior segurança. Atualmente, é possível saber o resultado das eleições no mesmo dia – algo muito mais demorado na vigência do voto impresso.
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QUEM É CONTRA A PEC?
A eventual implantação do voto impresso (em conjunto com a urna eletrônica) provocaria um gasto público estimado de R$ 2 Bilhões, conforme ressalta o Presidente do TSE Luís Roberto Barroso, em entrevista ao Jornal CNN Política.
Além disso, Barroso aponta um fator importante que pode vir a ser prejudicado caso o projeto de lei seja aprovado: a quebra do sigilo de voto. A Constituição Federal apresenta em seu Art. 14: “Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:” (…); esse direito fundamental aos cidadãos garante que o voto dos eleitores seja secreto, sendo qualquer prática de interferência crime eleitoral, pois desrespeita um princípio da constituição.
Desta forma, a prática de constrangimento ou até mesmo a compra de votos são consideradas violações do direito ao voto secreto. Se imaginarmos a comunidade de pessoas com deficiência visual, por exemplo, para que fosse possível auditar o voto impresso, seria necessário o apoio de demais voluntários – o que já corromperia o princípio constitucional .
QUEM É A FAVOR DA PEC?
No cenário atual, utilizam-se muitos argumentos em favor da implantação do voto impresso no sistema eleitoral, dentre eles se destacam: maior segurança nas eleições; o eleitor teria a garantia de ter votado no candidato que escolheu; seria possível evitar uma eventual “fraude eleitoral” e; seria possível auditar o voto além da urna eletrônica.
Vale lembrar que, apesar de diversas alegações de fraude no sistema da urna eletrônica, não se circula uma tese ou matéria jornalística verdadeira que comprove de fato que o atual sistema seja falho. Como defende o Tribunal Superior Eleitoral, a urna eletrônica nunca apresentou falha eleitoral em seus 25 anos de utilização.
A Deputada Federal Bia Kicis fundamenta a PEC 135/19 acerca do que a Suprema Corte Alemã decidiu em 2005 sobre a suspensão das urnas eletrônicas no processo eleitoral (atualmente utilizando o voto impresso). A decisão gira em torno do princípio da publicidade, no qual todos os passos essenciais da eleição estejam sujeitos a comprovação pública perante o eleitor.
Assim, a PEC fundamenta a questão da transparência no processo com a implementação de um eventual voto impresso, criticando o TSE e suas decisões tomadas nos processos eleitorais feitos nestes 25 anos.
QUAL A PERSPECTIVA DE IMPLANTAÇÃO DO VOTO IMPRESSO?
Apesar do embate sobre o tema, ainda não se mostrou nenhuma fundamentação consistente que desacredite a utilização de urnas eletrônicas. A PEC 135/19 passa atualmente por avaliação na Comissão de Justiça e Cidadania. Se aprovada, deverá obter um total de 308 votos para passar pela Câmara de Deputados e seguir para votação no Senado Federal.
A urna eletrônica é, na atualidade, utilizada em outros países além do Brasil, conforme levantamento do Instituto para Democracia e Assistência Eleitoral Internacional (Idea) – organização intergovernamental que aponta 16 países que também adotam máquinas para votação com gravação direta, ou seja, sem a impressão do voto.
Hipoteticamente, a PEC sendo aprovada nas duas casas legislativas em dois turnos (Câmara e Senado), por três quintos (3/5) dos respectivos membros, pode-se haver uma decisão do Supremo Tribunal Federal que barre a proposta. Tal episódio já foi visto em 2018, quando o STF julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5889, proposta pela Procuradoria-Geral da República, contra o voto impresso que era sinalizado na “minirreforma eleitoral” – Lei 13.165/2015, atualmente vetada pelo Supremo.
REFERÊNCIAS:
PEC 135/19: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1807035 <acesso em 16/05/2021>
Presidente do TSE explica sobre a segurança do voto – https://youtu.be/Yu5MvFVO4NU
25 anos da urna eletrônica – https://www.justicaeleitoral.jus.br/25-anos-urna/ <acesso em 16/05/2021
https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2020/Novembro/urna-eletronica-seguranca-integridade-e-transparencia-nas-eleicoes <acesso em 16/05/2021>
https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2220292 <acesso em 16/05/2021>
https://www.cnnbrasil.com.br/politica/2021/05/15/entenda-o-projeto-de-voto-impresso-que-sera-analisado-por-comissao-da-camara <acesso em 16/05/2021>
https://www.tse.jus.br/legislacao-tse/res/2011/RES233632011.htm <acesso em 16/05/2021>
https://www.uol/eleicoes/especiais/urna-eletronica-voto-impresso-brasil-e-pelo-mundo-fraude-eleicoes-voto-secreto.htm#ha-um-sistema-ideal <acesso em 16/05/2021>
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2015/lei-13165-29-setembro-2015-781615-norma-pl.html <acesso em 16/05/2021>
https://www.politize.com.br/eleicoes-alemanha/<acesso em 10/06/2021>
https://www.idea.int/data-tools/world-view/61?st=evt#rep<acesso em 10/06/2021>
https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2021/Maio/fato-ou-boato-alem-do-brasil-outros-46-paises-utilizam-urnas-eletronicas-nas-eleicoes<acesso em 10/06/2021>