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Educação & Cultura

O que faz a Agência Espacial Brasileira? Saiba tudo sobre a AEB!

O Brasil é um dos países que passou a integrar, recentemente, a lista de nações interessadas em participar do programa Artemis, da NASA, que levará astronautas à Lua novamente e estabelecerá a presença humana sustentável por lá. Em paralelo, há empresas estrangeiras interessadas em desfrutar do potencial das instalações da base de Alcântara, no Maranhão. Essas diferentes movimentações convergem, no fim, para o trabalho da Agência Espacial Brasileira (AEB), entidade que trabalha no programa espacial de nosso país há quase 30 anos.

A AEB foi criada em fevereiro de 1994 para promover o desenvolvimento das atividades espaciais brasileiras. Vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, a AEB desenvolve o Programa Espacial Brasileiro junto do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE) e do Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial, responsável pelo Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE). Juntas, as instituições oferecem o suporte necessário para as atividades espaciais realizadas no país.

Com quase 30 anos de história, o caminho do nascimento da instituição começou a ser trilhado no fim de 1961. Naquele ano, o presidente Jânio Quadros havia criado o Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE) para trabalhar em atividades de radioastronomia, rastreamento óptico de satélites e comunicações também via satélite — o GOCNAE foi, assim, o embrião do atual INPE. Já na segunda metade daquela década, o instituto passou a lançar cargas úteis em foguetes de sondagem.

Para entender o que a AEB já conquistou e o que ainda está por vir, o Canaltech entrevistou Carlos Moura, presidente da Agência Espacial Brasileira. Moura assumiu o cargo em 2019, sendo o primeiro representante da Força Aérea Brasileira à frente da AEB. Coronel engenheiro da reserva, ele atua no segmento espacial desde 1985 e participou da implantação do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), do desenvolvimento do Veículo Lançador de Satélites (VLS), de operações de lançamento e rastreio espaciais, entre outras atividades.

Conheça a trajetória da agência espacial do Brasil e um pouco do que podemos esperar para o futuro!

O início das atividades da AEB

A década de 1960 foi um período marcado pelos primeiros passos do programa espacial brasileiro, acompanhados por vários avanços de destaque. Em 1965, foi inaugurado o Centro de Lançamento da Barreira do Inferno (CLBI), no Rio Grande do Norte. Localizada a apenas 12 km de distância de Natal, a base concentra operações de lançamento de foguetes de menor porte, como os de sondagem — aliás, foi ali que o foguete Nike Apache, da NASA, foi lançado em 15 de dezembro de 1965, marcando o primeiro lançamento já realizado em solo brasileiro.

O Centro de Lançamento da Barreira do Inferno é referência no rastreamento de véiculos lançados no Brasil e em outros países

Com a proximidade do equador magnético, baixo índice de chuvas, ampla área oceânica para impactos e outros benefícios, o centro soma mais de 400 lançamentos em seu histórico, incluindo foguetes de sondagem e veículos de alta performance. Além disso, o CLBI atua também como um apoio ao Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA), no Maranhão. Assim como o CLBI, esta base também é operada pela Força Aérea Brasileira e é considerada um dos melhores lugares do mundo para lançamentos. Muito disso se deve à localização bastante privilegiada: por ficar bem próximo à linha do equador, o centro permite economia de combustível de até 30% nos lançamentos feitos a partir dali.

Considerado o principal centro de lançamentos do hemisfério Sul, a construção de Alcântara se funde à Missão Espacial Completa Brasileira, projeto que trouxe a proposta do desenvolvimento de um veículo lançador e três satélites. O trabalho foi colaborativo: o antigo Instituto de Atividades Espaciais (CTA/IAE) ficou responsável pelo desenvolvimento do veículo e infraestrutura, que resultou na base de Alcântara, e o INPE, por sua vez, cuidou do desenvolvimento de satélites de coleta de dados ambientais e sensoriamento remoto.

O veículo em questão deu origem ao Veículo Lançador de Satélites (VLS), formado por quatro estágios. A base já abrigou lançamentos de veículos diversos, como os foguetes de sondagem da família Sonda e vários VLS — um deles foi marcado por um acidente em 2003, que ficou conhecido como “a tragédia de Alcântara”. O VLS seria usado no lançamento da Operação de São Luís, missão que levaria um microssatélite e um nanossatélite ao espaço; contudo, o foguete foi acionado três dias antes da data prevista para o lançamento, causando um incêndio na torre de lançamento. O ocorrido causou a morte de 21 funcionários.

O CLA com a Torre Móvel de Integração, onde acontece a montagem das partes dos foguetes, e VLS à frente

No fim, o desenvolvimento do VLS acabou interrompido. Em sequência, veio o Veículo Lançador de Microssatélites (VLM), projetado para ser o pioneiro brasileiro para levar microssatélites à órbita. O projeto segue em andamento e, desta vez, este novo foguete terá motor de 1,5 m de diâmetro — para comparação, os motores do VLS tinham apenas 1 m de diâmetro. Já há um protótipo em São José dos Campos, que deverá passar por testes em breve para somente depois ter seu desempenho em voo verificado. “A ideia é fazer esse teste em solo agora, confirmar os dados de desempenho e testar em voo no ano que vem”, comenta Carlos Moura, em entrevista ao Canaltech. “Temos a perspectiva de o VLM voar daqui a 2 ou 3 anos, se todo esse avanço tecnológico se confirmar”.

E os satélites brasileiros?

A grande estreia do Brasil na operação e desenvolvimento de satélites aconteceu em 1993, com o lançamento do satélite SCD-1. Pesando 115 kg, o satélite foi totalmente produzido, desenvolvido e integrado pelo INPE, e foi o responsável por adicionar o Brasil à lista de nações que têm domínio do ciclo completo de missões espaciais. Depois, em 1998, o SCD-2 foi lançado, complementando a missão de coleta de dados ambientais iniciada por seu antecessor.

Já em 2002, a renovação de uma parceria com a China trouxe novos itens para a lista de satélites brasileiros: o novo acordo resultou nos satélites CBERS (China-Brazil Earth Resources Satellite – Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres), sendo que o CBERS-1, o primeiro deles, foi lançado em 1999. Outros cinco do mesmo programa foram lançados posteriormente e proporcionaram inúmeras contribuições para estudos sobre desmatamento, controle de incêndios na região amazônica e monitoramento de recursos hídricos.

O satélite CBERS-4A foi o sexto fruto da parceria entre Brasil e China

Finalmente, 2021 é o ano em que o Brasil lançou o Amazonia-1, o primeiro satélite de observação da Terra totalmente projetado, integrado, testado e operado nacionalmente. Além de contribuir para o monitoramento do desmatamento da região da Amazônia, este satélite representa também a validação da Plataforma Multimissão (PMM), um módulo de serviço também desenvolvido pelo INPE com todos os recursos necessários para as cargas úteis funcionarem em órbita. Em junho, o satélite foi considerado oficialmente apto para iniciar suas operações de rotina, passando a distribuir imagens do Brasil e da sociedade para o mundo.

Este marco demonstra a robustez de seu sistema e do funcionamento da PMM, que poderá ser usada tanto para novas versões do satélite quanto para outras aplicações — e além. “As empresas brasileiras que forneceram os sistemas para essa plataforma podem, agora, mostrar ao mercado que têm preço e qualidade confirmados”, explicou Moura ao Canaltech. “Essa era uma dificuldade que as nossas empresas tinham: elas se qualificavam, mas como só testavam em laboratórios, faltava a experiência comprovada”, continua. Daqui em diante, a indústria brasileira terá mais competitividade nesta categoria.

A Plataforma Multimissão

Enquanto o Amazonia-1 tem massa de 640 kg, os satélites menores, com até 100 kg de massa, vêm aquecendo cada vez mais o mercado em função do amplo leque de aplicações que oferecem. “Hoje, temos 10 projetos desses no Brasil, realizados por empresas e universidades financiados ou apoiados pela AEB”, contou o presidente da agência. Um desses é a constelação Catarina: desenvolvida pela AEB e por instituições de Santa Catarina, ela será formada por 13 satélites de pequeno porte para atuação na defesa civil e melhorias na agricultura de precisão. Como terão vida útil de 2 a 3 anos, os satélites vão precisar ser substituídos com frequência, o que proporciona ainda mais dinamismo para a indústria nacional.

O Brasil na Estação Espacial Internacional

Atualmente, a Agência Espacial Brasileira tem parcerias com países da Ásia, Europa e das Américas, mas as colaborações com outras nações não são recentes — tanto que o Brasil foi um dos países a dar apoio financeiro para o desenvolvimento da Estação Espacial Internacional (ISS) e, como consequência, poderia enviar um astronauta ao laboratório orbital. Entretanto, o acordo acabou cancelado por problemas de pagamento por parte do governo brasileiro da época.

Demorou um pouco até nosso país levar um cidadão brasileiro para além da atmosfera terrestre, mas o objetivo foi cumprido: foi em 2006 que Marcos Pontes, ex-astronauta brasileiro, partiu rumo a uma missão na ISS. A empreitada recebeu o nome de Missão Centenário para celebrar os 100 anos do voo de Santos Dummont com o avião 14-Bis, em Paris, e foi possível graças a um acordo fechado com a Roscosmos, a agência espacial da Rússia. Pontes viajou a bordo de uma nave Soyuz, acompanhado pelo astronauta Jeffrey Williams, da NASA, e pelo cosmonauta Pavel Vinogradov.

Marcos Pontes, Pavel Vinogradov e Jeffrey Williams, os astronautas da Expedição 13

A missão durou dez dias e, em dois deles, o astronauta brasileiro se manteve a bordo da nave em que viajou. Durante o período no espaço, ele realizou oito experimentos científicos — seis foram desenvolvidos por pesquisadores e estudantes universitários, e outros dois por alunos do ensino médio de São José dos Campos, cidade do interior paulista. Os experimentos foram voltados para diferentes áreas, como a germinação de sementes e cinética de enzimas em microgravidade e cromatografia da clorofila. Hoje, Pontes é ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações do Brasil.

Já se passaram 15 anos desde a realização da Missão Centenário e ainda fica o gostinho de “quero mais” quando pensamos se, futuramente, poderemos ter outros brasileiros indo em missões no espaço. Moura explica que, devido à situação orçamentária atual da agência, ainda não há atividades de missões tripuladas na AEB, mas isso deverá mudar gradualmente. “Mesmo não havendo, ainda, uma retomada de atividades tripuladas em nosso programa espacial, tem muita gente motivada com o envolvimento de seres humanos em missões desse tipo”, aponta.

O futuro da AEB

No ano passado, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações e a AEB assinaram um acordo de intenção de cooperação com a NASA que sinalizava o compromisso brasileiro de participar do programa Artemis, iniciativa que visa levar os próximos astronautas para a superfície lunar em 2024. Naquele momento, os oficiais do governo brasileiro declararam que o país seria responsável por produzir e desenvolver pequenos equipamentos científicos, que iriam ajudar na exploração lunar. Foi somente em junho de 2021 que o Brasil assinou o acordo que oficializa a participação no programa.

Ainda não há novas informações sobre os equipamentos mencionados anteriormente, mas podemos esperar diferentes possibilidades para a atuação do Brasil: “uma que vemos de imediato poderia ser algo relacionado à investigação do solo lunar, algo que desse conexão com nossas atividades de mineração, geologia, que é algo que o Brasil tem um bom domínio”, propôs o presidente da AEB. “Mas nós poderíamos também expandir para outro tipo de experimento científico, alguma coisa relacionada a investigações do ambiente lunar, ou alguma coisa relacionada à comunicação”, complementa.

O presidente Jair Bolsonaro e o ministro Marcos Pontes na cerimônia de assinatura dos Acordos Artemis, em junho

Já as atividades em território nacional deverão ficar agitadas em um futuro não tão distante: em abril, foram fechadas parcerias com empresas dos Estados Unidos e Canadá para o uso da base de Alcântara, com foco em lançamentos de nanossatélites. Por enquanto, o processo segue na etapa de negociação, ajustes contratuais e licenciamento espacial, mas as operações poderão começar em breve. “Nossa expectativa é que, no segundo semestre, essa fase contratual fique acertada e já possamos ter lançamentos em 2022”, disse Moura ao Canaltech.

As empresas Hyperion, Orion AST, Virgin Orbit e C6 Launch demonstraram interesse em usar as instalações e, inicialmente, há quatro delas com possibilidades de lançamentos — aqui, vale destacar a Virgin Orbit, que já lançou satélites com sucesso. Somado ao recente voo turístico espacial da Virgin Galactic, empresa que também é membro do Virgin Group, o grupo vem mostrando boas perspectivas. “A gente espera que essa empresa consiga fazer esses lançamentos de satélites em Alcântara e que, potencialmente, tenhamos atividades turísticas. É uma região propícia tanto para o turismo espacial quanto para o tradicional”, explicou Moura.

O potencial das instalações da base deverá ser aproveitado de duas formas principais. “Uma é colocando Alcântara como um espaçoporto, que fique aberto para a atividade nacional e internacional; a outra, é vencer esse desafio de termos o nosso próprio lançamento”, disse. Com o desenvolvimento do novo VLM, é possível que este e outros objetivos estejam cada vez mais próximos de serem cumpridos, mesmo com os vários desafios no meio do caminho. “À medida que pudermos aumentar o conhecimento e mostrar que é possível fazer bastante, tenho certeza que vamos ter resultados mais concretos e a população vai se sentir beneficiada, e vai nos cobrar mais. É isso que a gente quer: que sejamos cobrados para entregar soluções”, afirmou Moura.

Fonte: ITA (12) AEB (123, 4), INPE, FAB (123)

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