Nacional
A crise da colaboração premiada no Brasil
Reflexões sobre a obra de Francisco Schertel Mendes
A Lei das Organizações Criminosas estabeleceu um regime jurídico relativamente simples para as colaborações premidas ao afirmar que “o juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal” (art. 4º), desde que fossem alcançados, ao final do processo criminal, algum dos objetivos previstos na lei.
A mesma lei previa também a hipótese de oferecimento da imunidade penal se o colaborador não fosse líder da organização criminosa e fosse o primeiro a prestar efetiva colaboração (§ 4º do art. 4º) e a possibilidade de antecipação da progressão de regime (§ 5º do art. 4º).
Apesar da singeleza do regime legal, acordos de colaboração cada vez mais criativos foram celebrados pelo Ministério Público com um número elevado de colaboradores. A experiência recente nesse campo mostrou que os acordos de colaboração premiada se distanciaram progressivamente do marco legal e instituíram um novo modelo de justiça criminal cujos efeitos não foram até agora completamente diagnosticados.
O precioso livro de Francisco Schertel Mendes – “Leniency Policies in the Prosecution of Economic Crimes and Corruption: Consensual Justice and Search for Truth in Brazilian and German Law” – contém a reflexão acadêmica mais bem estruturada sobre o tema da justiça penal negociada já produzida até o momento.[1]
É um convite à crítica mais qualificada a respeito das práticas desenvolvidas pelo Ministério Público brasileiro e que conduziram à consolidação daquilo que o ministro Gilmar Mendes referiu como um verdadeiro estado de coisas inconstitucional na implementação do regime de colaboração premiada no direito brasileiro.[2]
A partir de larga experiência acadêmica e profissional acumulada pelo autor no campo da política de leniência no direito da concorrência – trabalhou no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), é consultor legislativo na área de direito concorrencial e escreveu importante dissertação de mestrado sobre o tema[3] – apresentou ao leitor um quadro teórico indispensável à compreensão das externalidades positivas e negativas produzidas pela expansão da consensualidade no campo penal.
Os principais riscos decorrentes da ampliação dos programas de leniência – e.g. falsa representação dos fatos, efeitos negativos das anistias, exploração de interesses particulares pelos agentes colaboradores, entre outros –, fartamente documentados na obra de Francisco Schertel, são valiosos para a reflexão em torno do modelo ideal de justiça penal negociada.
O livro de Francisco Schertel apresenta ao leitor uma indispensável visão do direito comparado sobre o tema. O fato de o autor conhecer profundamente a literatura e a jurisprudência alemãs abre caminho para o aprimoramento dos estudos brasileiros a respeito dos limites constitucionais impostos à colaboração premiada.
Afinal, o nosso modelo processual penal é muito similar ao alemão e o excesso de criatividade na celebração de acordos de colaboração premiada não é uma peculiaridade brasileira. Também lá, como aqui, o Ministério Público desenvolveu sofisticadas estratégias para acumular, progressivamente, maior liberdade na negociação de benefícios aos colaboradores. Apenas em 2013, com uma célebre sentença do Tribunal Constitucional alemão, os acordos no processo penal foram conduzidos ao parâmetro da legalidade.[4]
A reafirmação de que apenas o Judiciário pode aplicar penas criminais – em conformidade com o princípio da culpabilidade – e também de que os benefícios passíveis de deferimento ao colaborador são exclusivamente aqueles previstos em lei foi um passo decisivo do Tribunal Constitucional da Alemanha na consolidação do Estado de Direito no campo da justiça penal negociada.
Toda essa história da deslegalização dos acordos que culminou na importantíssima sentença de 2013 do Tribunal Constitucional alemão é não só registrada como também examinada criticamente por Francisco Schertel, com enorme proveito para a compreensão da realidade brasileira nesse setor.
A partir da leitura da obra de Francisco Schertel, percebe-se claramente que doutrina e jurisprudência brasileiras exageraram na suposta função “quase-revolucionária” imputada aos acordos de colaboração a partir da Lei nº 12.850/2013. Setores importantes do Ministério Público brasileiro – não sem a complacência do Judiciário e do apoio de parcela relevante da doutrina – passaram a enxergar nos acordos de colaboração premiada regidos pela Lei nº 12.850/2013, sem qualquer respaldo legal, verdadeiro mecanismo de plea bargaining.[5]
É evidente, contudo, a profunda diferença que existe entre o ordenamento jurídico norte-americano, em que o processo penal é visto como uma disputa entre duas partes – no qual, portanto, o acusador tem ampla discricionariedade para dispor e negociar a pena[6] – e o sistema jurídico brasileiro, que é orientado pelos princípios da obrigatoriedade da ação penal e da absoluta reserva de jurisdição para aplicação da penas criminais.[7]
O amplo referencial teórico oferecido por Francisco Schertel permite ao leitor mais atento concluir que o approach excessivamente contratualista ou privatista que orientou a experiência recente do Brasil nesse campo deu abertura para a criação ad hoc de um modelo de justiça negocial, inventado sem qualquer base legal pelos atores do sistema de justiça criminal.
É cada vez mais necessária, entre nós, uma intervenção mais ampla do Supremo Tribunal Federal (STF) na recondução dos acordos de colaboração premiada aos parâmetros da legalidade e da culpabilidade, de modo a afastar do cenário nacional a criação, pelo Ministério Público, de benefícios e penas não previstos em lei.
Daí a importância de o STF reafirmar a noção básica segundo a qual apenas o juiz pode determinar, nos termos da lei, as penas dos colaboradores em função da eficácia probatória da sua parceria com a acusação. Tal como Francisco Schertel demonstrou com absoluto rigor científico, a conhecida sentença de 2013 do Tribunal Constitucional alemão sobre o tema parece ser um norte seguro para a constitucionalização da colaboração premiada no Brasil.
Sem prejuízo da profunda crise de legitimidade de que padece o modelo brasileiro de negociação dos acordos de colaboração premiada – que deu origem, sem qualquer cobertura legal, à prática do bargaining for testimony[8] entre nós –, parece fora de dúvida que se construiu, nos últimos anos, um verdadeiro sistema paralelo de justiça penal negociada à brasileira.[9]
A obra de Francisco Schertel também é particularmente valiosa ao demonstrar que, apesar da existência de relação inicialmente bilateral entre colaborador e acusação, o negócio jurídico se projeta sobre a esfera jurídica de terceiros, como é da natureza desse instrumento de obtenção de prova.
Daí porque se apresenta como problemático o entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento do HC nº 127.483, de relatoria do ministro Dias Toffoli, no sentido de que, “por se tratar de negócio jurídico personalíssimo, o acordo de colaboração premiada não pode ser impugnado por coautores ou partícipes do colaborador na organização criminosa e nas infrações penais por ela praticadas, ainda que venham a ser expressamente nominados no respectivo instrumento no ‘relato da colaboração e seus possíveis resultados”.[10]
Em linha com as reflexões apresentadas por Francisco Schertel, também entendo que essa compreensão excessivamente restritiva quanto ao controle de legalidade dos acordos de colaboração premiada produziu, na prática, um quadro de proteção deficiente dos direitos e garantias dos delatados. Afinal, criou-se um microssistema de produção de prova penal com base nos acordos de colaboração premiada imune ao controle judicial.
Não é difícil perceber que a diretriz jurisprudencial firmada no julgamento do HC nº 127.483 criou um ambiente favorável à perpetração de graves violações ao direito à tutela jurisdicional substancial, que exige seja franqueado ao jurisdicionado meios processos idôneos para responder às violações dos seus direitos fundamentais.
Felizmente, a crescente percepção de que aquela diretriz jurisprudencial restritiva firmada no julgamento do HC nº 127.483 poderia implicar, na prática, restrição ilegítima do direito fundamental à tutela jurisdicional resultou em importante aperfeiçoamento jurisprudencial a respeito do tema nos últimos anos: a 2ª Turma do STF já admitiu, em diversas oportunidades similares à presente – referentes à invalidade do negócio jurídico –, a possibilidade de delatados impugnarem acordos de colaboração premiada e as provas derivadas.[11]
O interesse do delatado na impugnação do acordo de colaboração premiada está na aptidão que as declarações e as provas produzidas pelo colaborador têm para afetar a sua esfera jurídica.
Também nesse ponto a obra de Francisco Schertel oferece inovadora e indispensável contribuição ao aperfeiçoamento do regime jurídico das colaborações premiadas entre nós.
Com efeito, o acordo é instrumento processual vocacionado a restringir os direitos fundamentais do delatado – e.g. liberdade de locomoção, patrimônio, imagem e honra.[12] Mostra-se, portanto, incongruente reconhecer que o acordo de colaboração premiada é meio de obtenção de prova, equiparável às interceptações telefônicas e buscas e apreensões, mas negar ao Poder Judiciário a possibilidade de escrutinar a validade da medida.[13]
Ainda que a jurisprudência do plenário do STF não reconheça a possibilidade de o terceiro impugnar, por meio de demanda autônoma, a validade do acordo de colaboração premiada em que figura como delatado, sempre foi possível ao delatado impugnar, no âmbito da própria ação penal a que responde, a validade das provas produzidas pelo colaborador – inclusive do próprio acordo de colaboração premiada – e daquelas dela provas derivadas.
Foi essa a conclusão a que chegou a 2ª Turma no já citado julgamento do HC nº 142.205, oportunidade em que o ministro Gilmar Mendes reafirmou a compreensão de que o entendimento de que terceiros não possuem legitimidade para impugnar o acordo de colaboração premiada não pode significar a impossibilidade de que o delatado discuta a licitude das provas contra ele produzidas no processo-crime. E isso impõe que se reconheça pelo menos o direito do delatado a discutir “a ilicitude das provas produzidas em razão de acordo de colaboração premiada”.[14]
A obra de Francisco Schertel apresenta também a mais importante contribuição doutrinária já produzida sobre a recente experiência brasileira no que diz respeito à concessão de benefícios não previstos em lei em favor dos colaboradores.
Embora essa prática se tenha generalizado na experiência recente do país, é preciso aprofundar o debate sobre o oferecimento de benefícios e vantagens ilegais nos acordos de colaboração premiada.[15] O livro de Francisco Schertel oferece o mais completo referencial dogmático e jurisprudencial comparados para qualificar esse debate tão necessário entre nós.
Com efeito, os benefícios penais e processuais suscetíveis de serem concedidos ao colaborador foram estabelecidos taxativamente no art. 4º da Lei nº 12.850/2013.[16] A concessão de benefícios no âmbito de acordo de colaboração premiada está subordinada ao princípio da legalidade criminal.
Não é possível, portanto, negociar benefícios que não estão previstos na Lei nº 12.850/2013 ou estipular vantagens que desbordem das balizas legalmente estabelecidas. Na lição de J.J. Gomes Canotilho e Nuno Brandão, “as vantagens que não se encontram penalmente previstas em lei não podem ser prometidos ou concedidas” pelo Ministério Público ou pela autoridade policial.[17]
Como bem demonstrou Francisco Schertel em sua obra, a Lei nº 12.850/2013 não autoriza a convenção sobre o quantum exato da pena como resposta a inúmeros procedimentos criminais. Essa prática – conhecida como “package deals” – permite a celebração de um só acordo destinado a abranger diferentes investigações por meio de uma única negociação da qual costuma resultar uma só pena criminal pontual.
O autor mostra com clareza que, embora esses “package deals” tenham sido celebrados por muitos anos na Alemanha, passaram a ser considerados ilegais pelo Tribunal Constitucional em 2013.[18]
As contribuições da obra de Francisco Schertel não se resumem aos pontos referidos neste brevíssimo ensaio. Os gravíssimos déficits de transparência e racionalidade de que padece o nosso modelo atual de colaboração premiada também são objeto de interessante crítica do autor.
A esse respeito, a obra nos lembra que, de acordo com a jurisprudência do Tribunal Constitucional da Alemanha, a condução de negociações que falham em observar as regras de transparência e documentação conduz à nulidade do acordo.[19]
Isso para não falar dos sinais preocupantes de opacidade em relação aos resultados práticos alcançados pelo crescimento galopante do número de acordos de colaboração premiada no país.
Em síntese, a excepcional contribuição dogmática de Francisco Schertel para o estudo das colaborações premiadas no Brasil é a prova de que a doutrina ainda pode exercer o seu mister como “quarto poder”,[20] com vistas a auxiliar a enunciação de parâmetros para constitucionalização desse importante meio de obtenção de prova para o porvir.
É obra cuja leitura é obrigatória para todos aqueles que, como nós, dedicamos energia para o aperfeiçoamento do sistema de justiça criminal nacional e para a reafirmação da ideia de império da lei também no âmbito dos acordos de colaboração premiada.
[1] Tive a honra de acompanhar a discussão da tese de doutorado de Francisco Schertel Mendes que deu origem a este livro na “Rechtsphilosophisches Donnerstag-Seminar”, realizada na prestigiada Faculdade de Direito da Humboldt Universität, sob a condução do Professor Luís Greco.
[2] STF. Ag. Reg. na PET n° 8.482, Tribunal Pleno, DJe 04/06/2021.
[3] Cf. O controle de condutas no direito concorrencial brasileiro: características e especificidades. Disponível em: <https://repositorio.unb.br/handle/10482/14731>. Acesso em: 2 de agosto de 2021.
[4] Tribunal Constitucional da Alemanha. BVerfG, Sentença do Segundo Senado, de 19 de março de 2013 – 2 BvR 2628/10 -, Rn. 1-132.
[5] Cf., em perspectiva crítica desse fenômeno, Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró. “A colaboração premiada: meio de prova, meio de obtenção de prova ou um novo modelo de justiça penal não epistêmica?”. In: Colaboração premiada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017, p. 127-149.
[6] O acordo de plea bargain nada mais é do que o processo por meio do qual o acusado admite sua culpa em troca de concessões por parte do Estado. Ao contrário da lei brasileira, que condiciona a concessão de vantagens à colaboração efetiva, avaliada a partir da obtenção de resultados específicos, no modelo norte-americano, a única condição para a celebração da forma mais básica do acordo é a admissão de culpa. Langbein já observara que essa prática marca uma diferença fundamental entre os sistemas anglo-saxões e continentais, na medida em que, nos últimos, é perfeitamente possível que o acusado se declare culpado e ainda assim seja julgado. No sistema do common law, por outro lado, a convenção sempre foi a de tratar a confissão como uma desistência do direito ao julgamento (John H. Lagbein. “Understanding the Short History of Plea Bargain”. Law and Society Review, vol. 13, 1979, p. 268).
[7] Cf., sobre o tema no direito comparado, Máximo Langer. “From legal transplants to legal translations: the globalization of plea bargaining and the Americanization thesis in criminal procedure”. Harvard International Law Journal, vol. 45, nº 1, 2004, p. 1-64,
[8] No plea bargain for testimony, “o acordo para se declarar culpado é combinado com a concordância do acusado em cooperar com as forças investigantes, o que normalmente envolve o dever de fornecer informações e provas contra outros investigados” (Ronald Jay Allen, William J. Stuntz, Joseph L Hoffmann, Debra A. Livingston, Andrew D. Leipold e Tracy L. Meares Comprehensive Criminal Procedure. Nova York: Wolters Kluwer, 2016, p. 1278, tradução livre). Mesmo nos EUA, os críticos mais contundentes chegam ao ponto de defender que a prática subverte os valores do sistema de justiça criminal, pois “em essência, o plea bargaining permite que o acusado escape à responsabilidade plena por seus atos ao receber um ‘desconto na justiça’. (…) Porque um acusado não é plenamente responsabilizado por seus atos, o plea bargaining reduz o efeito dissuasivo da punição”. Erwin Chemerinski e Laurie L. Levenson. Criminal Procedure. Nova York: Wolters Kluwer, 2018, p. 913, tradução livre. No mesmo sentido, ver John Kaplan. “American Merchandising and the Guilty Plea: replacing the bazaar with the department store”. American Journal of Criminal Law, vol. 5, n° 2, 1977, p. 215-218. A prática do bargaining for testimony recebe críticas adicionais em razão das vantagens oferecidas nos acordos, não apenas por resultarem em penas muito baixas, mas também pela gravidade dos atos criminosos em geral cometidos pelo colaborador. Cf., a propósito, Kenneth Mann. Defending White Collar Crime: a portrait of attorneys at work. New Haven: Yale University Press, 1985.
[9] Cf., nesse sentido, Thiago Bottino. “Colaboração premiada e incentivos à cooperação no processo penal: uma análise crítica dos acordos firmados na ‘operação lava jato’”. Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 122, set./out. 2016, p. 359-390.
[10] STF. HC n° 127.483, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 04/02/2016.
[11] Cf., por todos, STF. HC n° 142.205, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 30/09/2020; STF. HC n° 151.605, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 23/07/2020.
[12] J. J. Gomes Canotilho e Nuno Brandão. “Colaboração premiada: reflexões críticas sobre os acordos fundantes da Operação Lava Jato”. Revista Brasileira de Ciências Criminais, vol. 133, jul. 2017, p. 146.
[13] Flávio A. Cruz. “Plea bargaining e delação premiada: algumas perplexidades”. Revista Jurídica da Escola Superior de Advocacia da OAB-PR, vol. 1, n° 2, dez. 2016, p. 206.
[14] Cf., a propósito, o aditamento ao voto apresentado pelo Ministro Gilmar Mendes: “A questão debatida neste processo se distingue dos termos decididos pelo Plenário deste Supremo Tribunal Federal. Não se trata aqui de uma impugnação ao acordo de colaboração premiada por terceiros. O que se discute é a produção de provas pelo colaborador nos processos que tramitam em face dos pacientes desta ação. O foco da impugnação diz respeito à utilização de provas contra os imputados e o modo que tais elementos foram produzidos, a partir de um cenário de acordos e colaborações temerários e claramente questionáveis. Não podemos afirmar que o precedente pelo Plenário proíbe qualquer impugnação a provas ilícitas, pois, se o fizermos, inviabilizaremos qualquer tipo de controle de ilegalidades no processo penal. Aqui analisamos a ilicitude de provas produzidas em razão de acordo de colaboração premiada. Portanto, não se trata de alterar a jurisprudência do Plenário, que trata da impugnação do acordo por terceiros, que podem nem ter sido ainda citados em declarações efetivamente produzidas no processo como provas. De modo distinto, temos aqui um cenário de um lastro probatório já produzido, que afeta diretamente a esfera jurídica dos pacientes deste habeas corpus. Creio, desse modo, que o voto anteriormente proferido não enfrenta a posição adotada pelo Plenário, mas desenvolve e refina seus termos para analisar as consequências que precisam ser controláveis pelo Poder Judiciário. Nessa perspectiva afirmei que ‘diante da complexidade das relações que se colocam em uma Justiça Criminal Negocial, precisamos avançar para traçar critérios adequados à limitação de abusos’. Diante disso, mantenho o voto anteriormente proferido e ressalto que não há incompatibilidade com o precedente firmado pelo Plenário deste Supremo Tribunal Federal” (STF. HC n° 142.205, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 30/09/2020).
[15] Cf., a propósito, STF. HC n° 142.205, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 30/09/2020.
[16] J. J. Gomes Canotilho e Nuno Brandão. “Colaboração premiada e auxílio judiciário em matéria penal: a ordem pública como obstáculo à cooperação com a operação Lava Jato”. Revista de Legislação e de Jurisprudência, n° 4000, set./nov. 2016.
[17] J. J. Gomes Canotilho e Nuno Brandão. “Colaboração premiada e auxílio judiciário em matéria penal: a ordem pública como obstáculo à cooperação com a operação Lava Jato”. Revista de Legislação e de Jurisprudência, n° 4000, set./nov. 2016. Cf., no mesmo sentido, Vinicius G. Vasconcellos. Colaboração premiada no processo penal. 2ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2018, p. 119.
[18] Tribunal Constitucional da Alemanha. BVerfG, Sentença do Segundo Senado de 19 de março de 2013 – 2 BvR 2628/10 -, Rn. 1-132.
[19] Tribunal Constitucional da Alemanha. BVerfG, Sentença do Segundo Senado de 19 de março de 2013 – 2 BvR 2628/10 -, Rn. 1-132.
[20] A expressão de Bernd Schünemann. Direito Penal no Estado Democrático de Direito, in: Bernd Schünemann (Adriano Teixeira org.), Direito Penal, racionalidade e dogmática, São Paulo, 2018, p. 21 e ss., p. 44 e ss.
ADEMAR BORGES – Professor do programa de mestrado e doutorado em Direito Constitucional do IDP.