Internacional
Quais as chances de uma contraofensiva da Ucrânia no sul?
Há sinais de que Kiev esteja preparando um contra-ataque em grande escala em torno de Kherson. Segundo especialistas militares, hora e lugar seriam ideais. E caberia apressar-se, pois a oportunidade ameaça durar pouco
Entre as questões que ocupam os ucranianos neste início de setembro, uma das mais prementes é se serão capazes de expulsar as forças russas de seu sul, como conseguiram no norte. Caso positivo, dentro de que prazo? Há indicações crescentes de uma contraofensiva a caminho para retomar Kherson, porém a situação no solo permanece opaca.
Quando a Rússia invadiu o país vizinho, em fevereiro, suas tropas tentaram capturar Kiev, mas fracassaram. Em março, tiveram que recuar de sua posição no norte da capital e a Ucrânia reassumiu o controle. Agora o foco ucraniano é a cidade de Kherson, logo a noroeste da península da Crimeia, anexada unilateralmente por Moscou há oito anos.
Na segunda-feira (29/08), representantes do Exército ucraniano informaram que “operações ofensivas” estavam sendo realizadas no sul. A imprensa ocidental noticiou que diversas localidades já haviam sido reconquistadas, porém a liderança nacional se mantém reticente, com o presidente Volodimir Zelenski advertindo que nenhum detalhe da campanha seria tornado público.
Por sua vez, o Ministério da Defesa russo afirmou que teria repelido recentemente um contra-ataque. Ben Hodges, ex-general comandante do Exército dos Estados Unidos na Europa, comentou à DW: “Realmente dá a impressão de que algo grande está começando, mas ainda não estamos seguros. Há muito mais para ocorrer nos próximos dias.”
Por que Kherson é tão importante
Kherson é a maior cidade ucraniana sob ocupação russa. Nos primeiros estágios da guerra, as tropas de Moscou se deslocaram rapidamente para o norte, a partir da Crimeia ocupada, estabelecendo um corredor terrestre com a Rússia e conquistando amplos trechos das costa do Mar de Azov e do Mar Negro. Trata-se de território de grande importância estratégica, pois a Ucrânia exporta mercadoria a partir dos portos locais.
O rio Dniepre, que atravessa a região, abastecia a Crimeia de água potável. Depois que a Rússia tomou a península, em 2014, a Ucrânia cortou essa fonte, porém desde que as tropas invasoras ocuparam a área, elas voltaram a direcionar água para lá, via um canal.
Durante semanas especulou-se sobre uma potencial contraofensiva no sul. Falando ao jornal britânico The Times, em junho, o ministro ucraniano da Defesa, Oleksii Reznikov, revelou que Zelenski ordenara a retomada das zonas litorâneas do país.
No momento, ninguém sabe com certeza se essa operação está em curso, mas, segundo o ex-comandante Hodges, a ocasião seria ideal: “Se a Ucrânia realmente lançar sua ofensiva, ela terá escolhido a hora e lugar certos.”
Com armamentos pesados fornecidos pelo Ocidente, em especial o sistema de mísseis High Mobility Artillery Rocket System (Himars), de fabricação americana, a Ucrânia tem atingido as linhas de abastecimento russas ao leste do Dniepre, próximo a Kherson. A própria cidade se situa na margem ocidental do rio, o que dificulta o envio de reforços russos.
Imagens de satélite também provam que as Forças Armadas ucranianas conseguiram danificar diversas pontes nas proximidades de Kherson. O Himars também foi empregado para atacar postos de comando e controle russos, observa Hodges.
Kiev pressionado a partir para a ofensiva
O contra-ataque ucraniano despertou grandes expectativas entre a população civil, desejosa de que seu exército não só defenda, mas também reconquiste território. “Kiev está sob pressão para não apenas jogar na defensiva, mas partir para a ofensiva”, confirma o analista militar Bradley Bowman, do think tank FDD, sediado nos EUA – um sentimento compreensível, segundo ele, considerando-se tudo por que o país tem passado.
Além disso, acrescenta, a Ucrânia deveria avançar agora com a campanha, pois a janela de oportunidade poderá se fechar em breve. Além de notícias de reforços russos para a área, a Rússia está preparando um referendo para justificar a anexação do sul da Ucrânia, como fez na Crimeia em 2014.
Para o especialista britânico em assuntos militares Justin Crump, a campanha ucraniana recente “certamente parece uma operação ofensiva muito mais significativa, alinhando-se com o que o presidente queria”. No entanto, o tempo mais frio e úmido no outono e inverno (que se aproximam no hemisfério norte) complicará os esforços para recuperar território.
Numa mensagem de vídeo aos líderes do G7, em junho, Zelenski afirmou querer dar fim à guerra até o inverno. Contudo, quando um repórter da DW abordou o assunto no fim de agosto, o presidente recusou posicionar-se. Por outro lado, ressalvou que a Ucrânia está determinada a se defender, e só negociará com a Rússia quando sentir que deve fazê-lo.