Judiciário
Responsabilidade social e democracia
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Segundo destacada lição do brilhante professor Peter Häberle, há uma específica omissão na conformação do Estado Constitucional na ordem jurídica moderna; a saber: muito já se tratou e muito já se falou sobre liberdade e igualdade, mas pouco se discute acerca do terceiro valor fundamental da Revolução Francesa de 1789, a fraternidade.
No Brasil, ao passo que o texto constitucional de 1988 buscou reunir as aspirações de uma sociedade que se afastava de mais de duas décadas de repressão, mediante uma agenda social que transcende de longe aspectos meramente formais, o diagnóstico de Häberle se confirmou no âmbito da efetivação de direitos.
Tal constatação ficou mais que evidente durante a trágica pandemia de Covid-19. O surgimento de uma crise sanitária de grandes proporções reforçou a incapacidade de os atuais marcos normativos oferecerem respostas eficazes e articuladas. A pandemia, igualmente, rememorou não ser viável qualquer discussão sobre saúde pública sem cuidar de temas como saneamento básico, política habitacional, educação, segurança pública e garantia de meios reais de subsistência.
A partir dessa tragédia por nós experimentada, passou a ganhar força a noção de que o Poder Público brasileiro precisa atuar de forma balizada pela responsabilidade social.
O Brasil foi um dos pioneiros entre economias emergentes a adotar uma Lei de Responsabilidade Fiscal, com inegável sucesso no objetivo de criar uma cultura de controle e transparência na atividade financeira do Estado. Choca o fato de, até hoje, não termos feito o mesmo no âmbito social.
Quanto aos serviços universais e benefícios contributivos, é preciso que o Estado brasileiro funcione melhor, mediante cooperação entre os entes federados que aumente a sinergia entre os poderes locais, estaduais e o nacional; e que previna os “apagões decisórios” constatados durante a pandemia de Covid-19.
O país carece de determinação legal instituidora de gestão social responsável, que teria por finalidade a melhoria dos índices sociais e econômicos de grupos vulneráveis, além da fixação de balizas mínimas para aprimorar a prestação de serviços públicos essenciais.
Forjar um Poder Público responsivo socialmente é a “condição de possibilidade” para reduzir o fosso de desigualdade que subtrai a dignidade de milhões de famílias brasileiras, inibindo a capacidade de engajamento político e o desfrute dos mais relevantes direitos e liberdades constitucionais. Não há mecanismo mais eficiente de superação dos círculos viciosos de transmissão intergeracional da pobreza.
Termino como comecei: na boa companhia de Häberle. No tempo presente, em que a liberdade e a igualdade são desafiadas pelas inversões mais difamantes possíveis ao legado do constitucionalismo moderno, está na ordem do dia do direito constitucional inserir no debate político-constitucional o valor fundamental da fraternidade.
A responsabilidade social operacionaliza a promessa revolucionária da fraternidade e pode constituir a chave por meio da qual abriremos várias portas para a solução dos principais problemas hoje vividos pela humanidade em tema de liberdade e igualdade, para o bem da manutenção da ordem democrática.
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Fonte: CNN Brasil