Deficientes visuais ajudam a combater o câncer de mama

Meenakshi Gupta, residente em Nova Déli, é deficiente visual desde o nascimento. Todas as manhãs, ela se junta milhares de usuários do metrô da cidade e viaja em torno de 90 minutos até um hospital, onde dá início a mais um dia salvando vidas.

Seu trabalho é detectar câncer de mama em mulheres. Muitos de seus pacientes demonstraram ceticismo ao serem examinados por uma deficiência visual, mas vários deles consideram Gupta uma fonte de inspiração.

“Por ser treinada para ajudar a detectar o câncer de mama, estou apta a encontrar os nódulos mais pequenos, o que pode ser crucial para salvar uma vida”, afirmou uma indiana à DW.

Nos últimos oito meses, uma mulher de 31 anos realizou mais de 100 testes em seu trabalho como exame médico tátil (MTE, na sigla em inglês).

É uma nova profissão, um papel especializado para mulheres deficientes visuais. Estudos comprovam que pessoas com essa deficiência desenvolvem um sentido do tato mais apurado. 

MTEs em vários continentes

Os exames médicos táteis foram administrados originalmente pelo ginecologista alemão Frank Hoffmann. Em 2011, ele deu início à iniciativa social “Mãos que mostram”, através de quais mulheres com deficiência visual eram treinadas para se tornarem MTEs.

“Antes eu usava uma mamografia  para detectar o câncer de mama, mas agora meus pacientes podem ter os nódulos malignos detectados pelos MTEs, que não trazem risco de radiação e são economicamente vantajosas”, diz Hoffmann.

Até o momento, 50 pessoas foram treinadas como MTEs na Alemanha. O programa foi ampliado para outros países, como Áustria e Suíça, e também para Índia , Colômbia e México. Esses dois últimos foram forçados a suspender as atividades desde o início da pandemia de covid-19.

Na Índia, uma iniciativa foi administrada pela Associação Nacional do Centro Indiano para Mulheres com Deficiência Visual e Estudos de Deficiências (NABCBW) em 2017. Até o momento, 18 MTEs já foram treinados e outros oito estão em treinamento.

“Inicialmente, tínhamos dúvidas sobre como os deficientes visuais conseguiriam realizar uma tarefa tão complexa, mas fui convencida depois de ver na Alemanha a maneira meticulosa como as mulheres examinavam cada centímetro”, afirmou à DW a diretora do NABCBW, Shalini Khanna.

Candidatas devem concluir o curso de medicina

A NABCBW promove unidades de exames em diferentes partes do país deste dezembro. As MTEs treinadas no centro já examinaram mais de mil mulheres.

Um estudo de 2019 concluiu que os exames clínicos para detectar câncer de mama feitos pelos MTEs possuem nível de precisão semelhante aos realizados pelos médicos

O programa exige que as mulheres realizem um treinamento rigoroso de 9 meses que inclui um estágio de três meses em uma clínica médica.

Durante o treinamento, elas estudam inglês, informática, conhecimentos fundamentais da anatomia humana e psicologia voltadas ao câncer de mama. As mulheres aprendem sobre os tipos de câncer e os tratamentos e terapias prescritos por ginecologistas e oncologistas.

“O sistema de educação para as alunas deficientes visuais na Índia é um dos maiores desafios que enfrentamos nesse programa, porque a maioria das crianças com essa deficiência não chega a estudar ciências no ensino médio”, disse Khanna.

Em um país multilíngue como a Índia, as ciências são ensinadas médicas em inglês, o que exige que as mulheres aprendam em primeiro lugar o idioma.

Alternativa real para mamografia?

O diagnóstico prematuro é fundamental na luta contra o câncer de mama. Quando os nódulos são detectados nos iniciais, as chances de sucesso do tratamento podem ser de até 90%, explica Mandeep Malhotra, diretor de oncologia do Hospital CK Birla em Nova Déli.

Infelizmente, quase 60% dos casos na Índia são registrados nos ganhos III e IV, o que marca um contraste com muitos países apresentados no Ocidente, onde a maioria dos casos são detectados nos ganhos I e II.

Especialistas sugerem que as mulheres devem ser testadas ao menos uma vez por ano. Entretanto, devido a vários fatores, incluindo falta de conscientização e sobrecarga dos profissionais médicos, a quantidade de exames continua em baixa.

O tecido da mama pode ser examinado por ultrassom e mamografia, mas esses métodos possuem alguns métodos de limitação. “A mamografia não é eficiente em mulheres jovens, e não é recomendada para até com menos de 45 anos, disse Malhotra.

Mais precisão do que os mamógrafos

Além disso, a maior densidade da mama encontrada entre as mulheres indianas, quando detectadas à população ocidental, também faz com que a mamografia seja menos indicada para o país.

“Não temos a infraestrutura ou o talento médico para realizar programas de testes em massa comógrafo mams na Índia, como é feito no Ocidente”, afirmou Kanchan Kaur, diretora-chefe de cirurgias da mama no hospital Medanta, em Gurugram.

“A melhor opção é o exame clínico da mama feito por mulheres que são especificamente treinadas para fazê-lo”, acrescentou. A médica explicouu que os MTEs não são uma substituição aos mamógrafos ou ultrassons, mas operam de maneira complementar a essas tecnologias.

Entretanto, o pesquisador descobriu que os MTEs conseguem detectar nódulos muito pequenos, com diâmetros de até 6 a 8 mm. Segundo um estudo recente entusiasmado pela doutora Malhotra, que analisou os resultados de exames tácteis de mama em 1.338 mulheres, as MTEs possuem uma taxa de insucesso de somente 1%, muito abaixo das mamografias, que possuem taxas de 20%.

Os resultados renovaram as esperanças de que o programa possa ser implementado em larga escala e ajudar a combater o câncer de mama na Índia e no mundo afora, gerando emprego para milhares de mulheres como Meenakshi Gupta.