Educação & Cultura
Segurança escolar e ataques com armas em escolas no Brasil
Mais de 20 projetos sobre essa temática tramitam na Câmara dos Deputados
A segurança nas escolas é uma preocupação fundamental em todo o mundo, e o Brasil não é exceção, tendo enfrentado desafios importantes em relação à segurança escolar, particularmente no que diz respeito a ataques armados em escolas de ensino básico. Diversas medidas são estudadas e postas em discussão para garantir um ambiente seguro nas escolas, como a presença de porteiros, sistemas de monitoramento por câmeras, controle de acesso e programas de prevenção ao bullying e ao uso de drogas.
O objetivo é proporcionar um espaço propício para o aprendizado, onde estudantes, professores e funcionários se sintam protegidos. O trabalho da Câmara dos Deputados é pensar sobre o que de fato deve ou não ser implementado e quais ações são de fato positivas para abordar essa situação complexa de segurança nas escolas.
Os casos recentes desses incidentes envolveram, em geral, alunos ou ex-alunos que, de forma trágica, entram nas instituições de ensino com a intenção de causar algum tipo de dano. Os impactos desses ataques são devastadores, não apenas para as vítimas diretas, mas para toda a comunidade escolar e a sociedade em geral.
Diversos fatores podem contribuir para ocorrências desse tipo. Problemas de saúde mental não tratados são uma causa importante, já que a falta de acesso a um tratamento adequado pode levar a crises extremas. A facilidade de acesso às armas de fogo é outra preocupação significativa, pois facilita a concretização de atos violentos.
Antes do início do novo milênio, a preocupação da população brasileira em relação aos ataques às escolas era praticamente inexistente. No entanto, esse cenário se transformou no primeiro ataque registrado em Salvador, Bahia, no ano de 2002, conforme relatado por Pellanda et al. (2022)[1]. Nesse caso, os estudantes da escola Sigma foram vítimas de um ataque perpetrado por um jovem menor de idade, que atirou contra dois de seus colegas, resultando em ferimentos graves e, tristemente, em uma fatalidade.
Desde o ano de 2002, ocorreram pelo menos 25 ataques[2] documentados em escolas brasileiras. Notavelmente, entre setembro de 2022 e março de 2023, um período de seis meses, testemunhamos a ocorrência de seis desses ataques. Essa crescente incidência e frequência cada vez maior de tais eventos evidenciam que o problema, anteriormente associado predominantemente aos Estados Unidos, chegou ao Brasil, tornando-se uma questão real que exige atenção.
A situação se tornou tão premente que uma equipe de pesquisadores envolvida na Campanha Nacional pelo Direito à Educação elaborou um relatório específico sobre a abordagem desse tipo de crime[3]. Este relatório foi apresentado à equipe de transição do governo eleito de Lula em dezembro de 2022, destacando a necessidade urgente de enfrentar esse desafio e proteger a segurança nas escolas brasileiras.
Essas informações podem explicar o cenário observado na Câmara entre os meses de março a maio de 2023, quando foram apresentados 22 PLs que versam sobre a temática de segurança escolar, além de estarem em tramitação também outros quatro PLs de legislaturas anteriores.
Os PLs 2388/2021 e 4012/2019 receberam PLs de 2023 e encontram-se em fase de aguardar o parecer do relator na Comissão de Educação. Já os PLs 2876/2022 e 1449/2023 receberam outros PLs de 2023 e se encontram também apensados ao PL 2388/2021, tramitando conjuntamente. Outros dois PLs que aguardam o parecer do relator na Comissão de Educação são os PLs 1725/2023 e 237/2019.
Os quatros PLs citados que estão em tramitação aguardando parecer versam sobre admissão e contratação de funcionários, autorização de armas de eletrochoque e sprays de pimenta por professores, implantação de policiamento escolar e a implementação do Plano Nacional de Prevenção e Enfrentamento à Violência no ambiente escolar.
A compreensão desse grande volume de propostas apresentadas no primeiro semestre do ano pode estar relacionada à crescente incidência de ataques, tornando 2023 o ano com o maior registro de tais incidentes[4]. E, ainda, em abril de 2023 se espalhou por todo país as ameaças de ataques às escolas, fazendo com que essas instituições suspendessem suas aulas e/ou realizassem programação especial, após boatos espalhados pelas redes sociais que geraram medo em pais e alunos[5]. Indicando a conexão com o aumento específico na quantidade de PLs que foram submetidos à análise e discussão na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados.
Algumas das propostas tratam especificamente do uso de arma de fogo por profissionais da educação, contratação de policiamento armado para as escolas, bem como indenização às famílias vítimas, colocando em pauta assuntos delicados e importantes quando se trata de acesso a uma educação saudável e de qualidade para crianças e adolescentes.
O PL 2388/2021 é o que chama mais atenção pelo seu grande volume de PLs apensados, significando que muitos deputados apoiam medidas similares, aumentando as chances dele ser aprovado. Este dispositivo determina que a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios devem, em colaboração, estabelecer o policiamento escolar como medida de proteção de crianças e adolescentes.
O batalhão escolar, modo como o PL nomeia o policiamento que deverá ser criado, terá a responsabilidade de realizar o policiamento, promover a conscientização, prevenir e combater a violência, o uso de drogas e o bullying. Além disso, caberá à instituição de ensino garantir o controle de acesso às suas instalações e zelar pela segurança dos profissionais de educação e dos alunos no ambiente escolar.
O PL 237/2019 torna obrigatório que escolas, tanto públicas quanto privadas, que atendam crianças de até 12 anos, exijam atestados de antecedentes criminais de seus funcionários, proibindo a contratação de pessoas condenadas, independentemente da natureza do crime. O autor do projeto, justifica a medida devido aos casos comuns de crianças maltratadas por supostos profissionais do ensino e busca priorizar a proteção das crianças. O projeto também garante aos pais ou responsáveis acesso aos atestados e certificados de antecedentes dos funcionários.
Por outro lado, o PL 4012/2019 autoriza os professores a usar armas de eletrochoque e sprays de pimenta para sua proteção pessoal em situações específicas, estabelecendo critérios rigorosos, como princípios de legalidade, necessidade, razoabilidade e proporcionalidade. Os professores devem possuir formação e capacitação completa e obter um registro e porte de arma de incapacitação neuromuscular. Por fim, o PL 725/2023 trata sobre a implementação do Plano Nacional de Prevenção e Enfrentamento à Violência no ambiente escolar.
Essa seria a melhor solução mais eficaz e rápida? Será que os pais e os responsáveis, assim como os profissionais da educação, estão de acordo com essa proposta? Existe algum estudo científico que comprove que a introdução de armas e policiamento nas instituições reduzirá realmente a incidência e a frequência dos ataques? Esses são alguns dos questionamentos cruciais que emergem quando se conduz uma pesquisa sobre esse tema.
Em resumo, a segurança escolar e os ataques com armas nas escolas de ensino básico no Brasil são desafios que requerem uma atenção constante e esforços coletivos para proteger a integridade e o bem-estar de crianças, jovens e profissionais da educação. A prevenção e o apoio são as chaves para a criação de ambientes escolares seguros e propícios ao aprendizado e ao crescimento. E como esse tema tem sido bastante discutido nas reuniões da Comissão de Educação, tem gerado muitas flexões, principalmente a respeito da implementação de seguranças armados nas escolas.
As informações apresentadas no presente texto são parte integrante da pesquisa e coleta de dados consolidados pelo Observatório do Direito à Educação (ObsEdu) da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) durante o segundo semestre de 2023. O Observatório, comprometido com a análise e compreensão aprofundada dos cenários educacionais, empreende esforços constantes para contribuir significativamente para o avanço do conhecimento no campo da educação.