Judiciário
Como recuperar o meu veículo da busca e apreensão fazendo o pagamento da dívida?
Uma alternativa para quem teve o seu veículo apreendido em uma ação de busca e apreensão é realizar o pagamento da dívida para evitar que o bem seja levado a leilão.
Esse pagamento é chamado de purgação da mora e há alguns requisitos que a própria lei estabelece para que ele seja válido e aceitável pela Justiça, fazendo com que o veículo volte para o comprador/devedor e não seja leiloado.
Você sabe como isso funciona?
Veja esse texto e, se você estiver passando por uma situação difícil como essa, é de suma importância entender todos os detalhes para tomar uma decisão acertada para recuperar o seu veículo.
A ação de busca e apreensão de veículos
A ação de busca e apreensão para retomada de veículos que foram financiados, geralmente através de um financiamento bancário, é a medida legal utilizada pelo credor para retomada rápida do bem, que foi dado em garantia, para que o crédito seja recebido.
Ela é regulada pelo Decreto n.º 911/1969 e sofreu, ao longo dos anos, inúmeras mudanças.
Recentemente, inclusive, o Superior Tribunal de Justiça adotou uma posição muito favorável aos bancos, passando a não mais exigir que haja qualquer comprovação de recebimento da notificação que é essencial para o uso dessa ação, bastando o comprovante de envio, veja isso nesse outro texto.
Após a inadimplência do comprador, o credor irá enviar uma notificação para constitui-lo em mora – algo que possibilita o ingresso da ação de busca e apreensão, sendo recebida ou não essa notificação, não havendo o pagamento das parcelas em atraso, o credor irá adotar o próximo passo, que é o ingresso da ação de busca e apreensão.
Essa ação permite um tipo específico de liminar: a de apreensão do veículo, que é analisada logo no início do processo, pelo magistrado, sem que o comprador/devedor tenha ciência da ação ou de qualquer outro procedimento.
Concedida a medida liminar, será expedido um mandado de busca e apreensão a ser cumprido pelo oficial de justiça, com possível auxílio da polícia militar, para efetuar a apreensão do veículo, onde quer que ele esteja e com qualquer pessoa.
Geralmente, é nesse momento, da apreensão, propriamente dita, que o comprador/devedor terá a ciência do processo judicial, ou seja, quando perder o carro.
Recuperando o veículo por meio do pagamento
Existem várias questões que podem ser alegadas para reverter a apreensão realizada, como nulidades no processo e outras questões, veja uma explicação sobre isso nesse outro texto: O que os bancos não te contam sobre a busca e apreensão de veículo.
Ocorre que, em algumas situações, pode não haver nada de interessante a ser alegado para recuperar o veículo. O procedimento realizado pelo banco pode ter cumprido todos os requisitos legais.
Nessa situação, ou quando o comprador/devedor preferir simplesmente recuperar o veículo pagando os valores devidos, a lei lhe assegura a realizar a purgação da mora, que é o pagamento de todo o débito para evitar que ocorra o leilão.
Como é feito esse pagamento dos valores para evitar que o veículo seja leiloado?
O pagamento é previsto no art. 3º, § 1º e 2º, do Decreto n.º 911, que diz o seguinte:
Art. 3º. O proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2o do art. 2o, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, podendo ser apreciada em plantão judiciário.
§ 1º. Cinco dias após executada a liminar mencionada no caput, consolidar-se-ão a propriedade e a posse plena e exclusiva do bem no patrimônio do credor fiduciário, cabendo às repartições competentes, quando for o caso, expedir novo certificado de registro de propriedade em nome do credor, ou de terceiro por ele indicado, livre do ônus da propriedade fiduciária.
§ 2º. No prazo do § 1º, o devedor fiduciante poderá pagar a integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial, hipótese na qual o bem lhe será restituído livre do ônus.
Da leitura acima, algumas questões são bem claras de se entender e outras nem tanto assim.
Primeiramente, em relação aos valores a serem pagos, é importante que o devedor compreenda que não será aceito apenas o pagamento das parcelas que estavam em atraso (vencidas), isso somente poderia ser feito quando do recebimento da notificação.
Para que haja a purgação da mora, é necessário que o pagamento abranja tanto as parcelas vencidas como as que ainda tinham a vencer, chamadas de vincenda. Em resumo, esse pagamento é a quitação integral do contrato.
O valor para realizar essa quitação, na maior parte dos casos, é uma quantia elevada, por isso, é importante sempre analisar muito bem o processo e suas condições financeiras para optar por esta medida.
E para você saber qual é o valor exato a se pagar, basta analisar a petição inicial do banco, na própria ação de busca e apreensão, que deverá informar, de forma clara, o valor da dívida.
Qual é o prazo para esse pagamento ser feito?
O prazo é muito curto, são apenas 5 (cinco) dias para que toda a dívida seja quitada. E esse prazo é contado em dias corridos.
O início desse prazo não ocorra da juntada, no processo, do mandado de busca e apreensão cumprido ou qualquer outra formalidade, ele se inicia quando ocorre a apreensão do veículo, o cumprimento da liminar.
É excluído, para fins de cálculo desse prazo, apenas o primeiro dia, iniciando-se, no seguinte, a contagem.
Imagine, portanto, que o veículo foi apreendido em uma sexta-feira. O prazo, por incrível que pareça, se iniciará logo no sábado e não na segunda-feira, fazendo com que o último dia para pagamento seja na quarta-feira da semana seguinte. Caso o último dia do prazo caia em um feriado ou dia não útil, como um sábado ou domingo, o prazo é prorrogado para o primeiro dia útil seguinte.
Sobre isso, os Tribunais possuem um entendimento muito pacífico:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. PURGAÇÃO DA MORA. PRAZO MATERIAL. CONTAGEM EM DIAS CORRIDOS. EXCLUSÃO DO PRIMEIRO DIA. TERMO FINAL EM FERIADO. PAGAMENTO PRORROGADO PARA O PRÓXIMO DIA ÚTIL. ARTIGO 132 DO CÓDIGO CIVIL. DEPÓSITO EXTEMPORÂNEO. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS.
1. Para a purgação da mora em ação de busca e apreensão, é imperativo que o devedor efetue o pagamento integral do débito no prazo de cinco (5) dias após a execução da liminar, em consonância com o entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.418.593/MS, bem como pelo teor da Súmula 59 do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.
2. O prazo previsto no artigo 3º, parágrafo 2º, do Decreto-lei nº 911/69, que rege a matéria, ostenta natureza de direito material, não se submetendo à contagem em dias úteis. No entanto, faz-se necessário aplicar a norma do artigo 132, do Código Civil, na contagem desse prazo, excluindo o dia do início e incluindo o dia do vencimento. Destaca-se que, caso o último dia do prazo recaia em dia não útil, o termo final do prazo será prorrogado para o próximo dia útil.
3. Quanto aos honorários sucumbenciais, diante da interposição do recurso, com fundamento no artigo 85, parágrafo 11, o Código de Processo Civil, deve ser majorado para 12% (doze por cento) sobre o valor arbitrado. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA
É muito importante estar atento ao termo final desse prazo porque se você não fizer o pagamento nesse prazo, mesmo que o faça depois, podendo ser apenas um dia de atraso, o seu veículo não lhe será restituído.
Nesse julgado acima, inclusive, a situação foi exatamente essa: um único dia de atraso. Algo que impossibilitou a devolução do veículo:
Destarte, à luz da atual legislação e do posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, para a contagem do prazo para a purgação da mora não se pode deixar de considerar a exclusão do dia do começo, bem como para o termo final considerar o dia útil imediatamente subsequente, se este recair em feriado.
Nessa perspectiva, mister frisar que o prazo para o devedor fiduciante quitar a dívida após a apreensão do bem possui natureza material e não processual, motivo pelo qual deve ser contado em dias corridos (art. 219, § único, CPC), nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
O prazo para a purgação da mora não admite interpretação extensiva, muito menos interpretação que mais convenha ao devedor, uma vez que já expressamente consignado na lei que rege o contrato de alienação fiduciária, devendo, portanto, ser estritamente observada a execução da liminar como o termo inicial para a contagem do prazo legal para o devedor depositar o valor devido.
No caso em exame, embora a liminar de busca e apreensão do veículo tenha sido efetivada em 1º de abril de 2023, e, considerando que o prazo final para a quitação do débito se deu em um dia não útil, 6 de abril de 2023 (quinta-feira/ponto facultativo), o recorrente deveria ter realizado o depósito no dia útil seguinte, ou seja, aos 10 de abril de 2023. Contudo, somente o fez aos 11 de abril de 2023, quando já transcorrido o período legal para essa providência.
Assim, não havendo dúvida sobre a intempestividade do depósito realizado pelo recorrente, não se há falar em purgação da mora. Pensar o contrário seria beneficiar a conduta desidiosa do devedor em detrimento da postura do autor, que agiu em conformidade com o que prescreve a legislação.
Atenção máxima, portanto, ao prazo, que é muito curto e imprescindível que seja observado, sob pena do depósito feito, um único dia após o seu vencimento, não importar em restituição do veículo.
Qual é o valor que tenho de pagar para recuperar o veículo que sofreu busca e apreensão?
Como dito acima, para que haja a purgação da mora e devolução do veículo, não basta o pagamento das parcelas em atraso, mas de todo o contrato.
O valor claro da dívida deve estar previsto na petição inicial da busca e apreensão ajuizada pelo credor, caso não haja esse valor, isso poderá resultar na nulidade do processo de busca e apreensão.
No valor informado pelo banco, em alguns casos, há o acréscimo de cobrança de honorários de sucumbência, geralmente de 10% (dez por cento) sobre o valor da dívida e, também, das custas do processo.
A cobrança desses valores não pode impedir a realização da purgação da mora, visto que a lei exige apenas o pagamento dos valores do contrato (valor da dívida), sem inclusão de tais despesas para que haja a devolução do veículo:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. DECRETO-LEI Nº 911/1969. PURGAÇÃO DA MORA. PAGAMENTO INTEGRAL DA DÍVIDA. IMPOSSIBILIDADE DE INCLUSÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E CUSTAS PROCESSUAIS. ASTREINTES. REDUÇÃO DO VALOR E FIXAÇÃO DE PERIODICIDADE. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. DECISÃO REFORMADA EM PARTE.
1. Na ação de busca e apreensão a purgação da mora caracteriza-se com o pagamento da integralidade da dívida pendente, que compreende, exclusivamente, as parcelas vencidas, vincendas e encargos, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na petição inicial, não incluindo atualização de encargos até a data do depósito, despesas processuais e honorários advocatícios, consoante dicção do artigo 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto Lei n. 911/1969.
2. Conquanto admissível a aplicação da multa cominatória, a sua fixação em valor único se mostra desarrazoada, razão pela qual impõe-se a reforma da decisão para fixá-la em R$ 500,00 (quinhentos reais) limitada a 30 (trinta) dias, a fim de compelir o cumprimento da obrigação dentro dos parâmetros de razoabilidade e proporcionalidade, bem como não permitindo o enriquecimento ilícito da parte. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Agravos -> Agravo de Instrumento 5611600-64.2023.8.09.0093, Rel. Des (a). JULIANA PEREIRA DINIZ PRUDENTE, 8ª Câmara Cível, julgado em 13/11/2023, DJe de 13/11/2023)
Não é que não seja possível a cobrança desses valores do devedor, ao final do processo. É que as quantias relativas às custas e honorários de advogado não podem ser utilizadas para calcular o valor da dívida, para que seja possibilitada a restituição do veículo.
Como é feito o pagamento para recuperação do veículo apreendido em busca e apreensão?
O pagamento deve ser feito mediante depósito judicial, em uma conta bancária vinculada ao Juízo do processo, que somente poderá ser movimentada mediante alvará expedido pelo juiz daquele processo.
Qual a importância de ter um auxílio de um advogado para reaver meu veículo apreendido na busca e apreensão?
O advogado que atua nessa área será o diferencial para te esclarecer sobre o melhor caminho a ser tomado: realizar o depósito dos valores ou buscar a anulação do procedimento por alguma irregularidade/nulidade.
Além disso, ele poderá te informar se as taxas de juros cobradas pela instituição financeira estão de acordo com o que a legislação e justiça entendem como razoáveis.
Optando pelo caminho do depósito dos valores, o advogado irá abrir a conta judicial e emitir o boleto para que você faça o pagamento.
Ele poderá, ainda, realizar pedido de gratuidade de justiça, ao juiz, para que ele te isente do pagamento das custas e honorários advocatícios, algo que, certamente, você seria condenado fazendo simplesmente o pagamento no processo.
Você receberá, do profissional, a informação correta acerca dos valores adequados a serem pagos para recebimento dos valores, sem ficar preso às informações que o banco lhe passa que, em muitos casos, tem valores acrescidos sem necessidade.
Por fim, tendo um advogado para te auxiliar, você se livra de possíveis golpes e fraudes, além das “espertezas” do banco, com suas armadinhas disfarçadas de “negociação” para devolução do veículo.
Desse modo, passando por uma situação como essa, buscar auxílio jurídico com um profissional capacitado, especialista no assunto, faz toda a diferença na proteção do seu patrimonial e recuperação do veículo.
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Rafael Rocha Filho é advogado, especialista em Imóveis, Contratos e Dívidas, com atuação em demandas de pessoas e empresas em Empréstimos Bancários, Financiamentos Imobiliários, Processos de Execução, Execução Fiscal, Revisionais de Contratos, Ações de Indenização, Busca e Apreensão de Veículos e Leilões de Imóveis.