Internacional
Alemanha já consumiu em 4 meses o limite de um ano inteiro
Se todo mundo seguisse o ritmo dos alemães, a humanidade precisaria de três planetas para atender à demanda por recursos de forma sustentável – e ainda assim isso não necessariamente significaria mais bem-estar
A Alemanha atingiu em quatro meses o limite de consumo sustentável para o ano inteiro. Se o mundo inteiro seguisse o exemplo do país europeu, a humanidade precisaria de três planetas para atender à demanda por recursos de forma sustentável.
O cálculo é da ONG americana de meio ambiente Global Footprint Network, e considera a demanda nacional por recursos e serviços ecológicos perante a capacidade de regeneração do planeta.
Os países que mais esbanjam, como Catar e Luxemburgo, já excederam sua cota em fevereiro. Na ponta oposta do fenômeno estão nações como o Cambodja e Madagascar, que devem ficar muito abaixo dos limites de consumo sustentável.
Na Alemanha, o ritmo de degradação planetária está acelerando. No ano passado, o país estourou sua cota no dia 4 de maio. Neste ano, a marca foi batida um dia mais cedo, em 2 de maio – a diferença se deve ao fato de 2024 ser um ano bissexto, com 366 em vez dos usuais 365 dias.
Chamado à ação urgente
“O Dia da Sobrecarga da Terra na Alemanha é um lembrete para mudar as condições subjacentes em todos os setores agora, de modo que o comportamento sustentável se torne o novo normal”, afirma Aylin Lehnert em um comunicado da ONG ambientalista alemã Germanwatch.
Segundo Lehnert, a sobrecarga do planeta é uma dívida que precisa ser freada. “Precisamos de um novo freio da dívida”, diz, aludindo à restrição de endividamento do governo alemão que brecou investimentos na transição verde da economia.
A Germanwatch aponta a produção e o consumo de carne na Alemanha como um dos maiores motores da demanda excessiva por recursos planetários. O país destina aproximadamente 60% de suas terras cultiváveis à produção de ração animal, além de importar outras milhares de toneladas do exterior.
Entre 2016 e 2018, o total de importações alemãs levou à destruição de 138 mil hectares de floresta tropical mundo afora, segundo dados da Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ).
Boa parte do fardo desse consumismo é carregado pelo Sul Global, que em grande medida vive dentro de limites sustentáveis, mas sofre com a destruição ambiental e os danos provocados pelas mudanças climáticas.
Para a Federação Alemã para Proteção Ambiental e da Natureza (Bund), a Alemanha faz uso irresponsável de seu solo, água e outros recursos naturais.
“Nosso planeta está sobrecarregado. Um país que consome tantos recursos como nós está operando de forma ruim e irresponsável’, afirmou nesta terça-feira (30/4) o presidente da Bund, Olaf Bandt.
A ONG ambiental está apelando ao governo alemão para que crie uma lei de proteção ao solo, águas, florestas e madeira.
Mais consumo = mais bem-estar?
Outro estudo divulgado nesta quinta-feira por um think tank berlinense mostra que todo esse consumo excessivo não necessariamente está melhorando as vidas das pessoas.
Compilado pelo Hot or Cool Institute, o “Índice de Felicidade Planetária”combina dados sobre bem-estar, expectativa de vida e pegada de carbono para avaliar quão bem os países estão cuidando de seus cidadãos sem sobrecarregar o planeta.
Suécia e Alemanha, por exemplo, têm níveis muito parecidos de bem-estar geral e expectativa de vida, mas a Suécia conseguiu atingir esse patamar com 16% menos emissões per capita do que a Alemanha e menos da metade da pegada de carbono per capita dos Estados Unidos. Já a Costa Rica tem qualidade de vida semelhante à alemã, mas menos da metade de seu impacto ambiental.
Ainda assim, pelos cálculos da Global Footprint Network, a Suécia estourou sua cota de consumo anual em 21 de abril – antes mesmo da Alemanha –, enquanto a Costa Rica chegará neste patamar em 31 de julho.
Os países mais equilibrados
Além de Suécia e Costa Rica, El Salvador, Nicaragua e Vanuatu, país insular na Oceania, lideram o ranking por exibirem bons índices de qualidade de vida e baixo impacto ambiental.
O índice, que também considera a renda, revela que 10% dos países mais ricos são responsáveis por quase a metade de todas as emissões, mas quase não tiveram ganhos em termos de bem-estar e saúde se comparados a países com níveis baixos de emissão de carbono.
Um bom exemplo disso são as viagens aéreas. Pessoas que voam com frequência emitem muito mais carbono, mas não apresentam ganhos significativos em termos de bem-estar quando comparados aos que voam menos.
Nos Estados Unidos, um estudo de 2020 mostrou que lares mais ricos consomem 25% mais energia que famílias de baixa renda, sendo que ambos tinham níveis iguais de satisfação com a vida.
Diretora administrativa do Hot or Cool Institute, Lewis Akenji urge países a repensar suas prioridades: “Precisamos focar no consumo desperdiçador e na desigualdade, que estão piorando a crise planetária.”