Internacional
Racismo e pobreza na Alemanha: dois lados de uma moeda?
Cidadãos negros, muçulmanos e de origem estrangeira são alvos de discriminação, desde educação a moradia e trabalho. O resultado é um maior risco de pobreza. Nem mesmo uma boa formação profissional os protege
Que o racismo é difundido na Alemanha, não se discute. Mas quais são as consequências para os afetados? O Centro Alemão de Pesquisa em Integração e Migração (DeZIM), sediado em Berlim, abordou a questão no estudo intitulado Limites da igualdade: racismo e risco de pobreza.
As sociólogas Zerrin Salikutluk e Klara Podkowik basearam-se em dados do Monitor Nacional para Discriminação e Racismo (NaDiRa), uma consulta representativa recorrente sobre experiências quotidianas de racismo, financiada desde 2020 pelo Bundestag (câmara baixa do parlamento alemão).
“Nas estatísticas oficiais ou nos relatórios do governo sobre pobreza e riqueza, os dados costumam ser divididos segundo se há origem migratória ou cidadania alemã”, explica Salikutluk. “O que até agora não pudemos determinar, é como realmente estão indo aqueles que são afetados pelo racismo.”
Discriminação quotidiana na Alemanha
As pesquisadoras identificaram discriminação no sistema educacional, nos mercados de trabalho e imobiliário, e no setor de saúde. Estudos anteriores haviam demonstrado que imigrantes ou seus descendentes em geral são discriminados quando procuram emprego, o que eleva o risco de terem que viver abaixo da linha da pobreza. Na Alemanha, risco de pobreza significa uma renda mensal de menos de 60% da média estatística, que em 2023 era de 1.310 euros (R$ 7.160).
Dos consultados para a pesquisa do DeZIM, 5% dos alemães sem origem migratória, empregados em regime integral, se declararam abaixo da linha da pobreza. No entanto, essa cifra sobe para 20%, em média, entre os participantes negros, muçulmanos ou asiáticos.
Nem mesmo uma alta formação universitária ou treinamento profissional protegem contra um resvalo na pobreza: para quem sofre de discriminação racista, esse risco é de duas a sete vezes maior do que entre os cidadãos alemães sem origens estrangeiras.
Risco de pobreza máximo entre refugiados
A ameaça é especialmente grave para os muçulmanos do sexo masculino, com uma taxa de 33%. A socióloga Salikutluk atribui o fato ao alto número de refugiados com esse perfil que chegaram ao país desde 2013.
Cerca de 20% dos participantes muçulmanos provém da Síria e do Afeganistão, países seriamente afetados por guerras e pobreza, “e já sabemos que refugiados estão sob risco maior de pobreza, devido a seu acesso limitado ao mercado de trabalho”.
Contudo, é alvo de discriminação mesmo quem tem origens estrangeiras mas vive na Alemanha há muitos anos, ou nasceu no país, ou tem cidadania alemã. A pesquisadora recorda experimentos em que os mesmos documentos de candidatura para um emprego foram submetidos sob nomes diferentes. O resultado: “indivíduos com um sobrenome que soe turco, por exemplo, têm menos chances de ser convidados para uma entrevista de seleção.”
Como reduzir a taxa de pobreza entre os refugiados?
Na opinião de Zerrin Salikutluk, as constatações da enquete evidenciam a necessidade de medidas direcionadas para combater a pobreza e promover igualdade de oportunidades para os grupos desfavorecidos. Um passo nesse sentido seria a Alemanha reconhecer as qualificações educacionais e profissionais adquiridas no exterior.
“Isso ia acelerar a entrada dos refugiados e outros imigrantes no mercado de trabalho alemão e dar acesso a profissões adequadas para os trabalhadores qualificados que adquiriram suas credenciais no exterior”, recomenda o estudo.
Para acelerar a integração ao mercado, as sociólogas pleiteiam acesso mais rápido a cursos de idioma e integração. Sua conclusão é que a única forma de reverter a taxa de pobreza entre os refugiados seria garantir que possam financiar sua subsistência com os ganhos do próprio trabalho.