Saúde
Medula espinhal tem aprendizado e memória independentes do cérebro
Medulas espinhais que associaram a posição da perna a uma experiência desagradável aprenderam a reposicioná-la depois de apenas 10 minutos; e retiveram a memória no dia seguinte
Aprendizado fora do cérebro
Cientistas japoneses descobriram um circuito neural na medula espinhal que permite o aprendizado motor independente do cérebro.
Já se sabia da possibilidade da geração motora produzida pela medula espinhal em insetos, cujas pernas ainda podem ser treinadas para evitar sinais externos mesmo quando eles ficam sem cabeça. Até agora, porém, ninguém havia visto isto em mamíferos e nem descoberto exatamente como isso é possível. E, sem essa compreensão, o fenômeno não passava de um fato curioso da natureza.
A equipe da professora Aya Takeoka, do Centro Riken de Ciências do Cérebro, localizou agora dois grupos críticos de neurônios da medula espinhal, um necessário para um novo aprendizado adaptativo e outro para relembrar adaptações depois de aprendidas – tudo funcionando independentemente do cérebro.
Isto promete ajudar no desenvolvimento de maneiras de auxiliar na recuperação motora após uma lesão na medula espinhal, que hoje tipicamente deixa a pessoa paraplégica ou tetraplégica.
“Obter insights sobre o mecanismo subjacente é essencial se quisermos compreender os fundamentos da automaticidade do movimento em pessoas saudáveis e usar esse conhecimento para melhorar a recuperação após uma lesão na medula espinhal,” disse a pesquisadora.
Os cientistas mapearam os circuitos neurais responsáveis pelo aprendizado e memória da medula espinhal.
Aprendendo com a medula
Antes de estudar o circuito neural propriamente dito, os pesquisadores tiveram que desenvolver uma configuração experimental que lhes permitiu estudar a adaptação da medula espinhal de camundongos, tanto na aprendizagem quanto na recordação, sem informações do cérebro.
Cada experimento envolvia um camundongo experimental e um camundongo de controle, cujas patas traseiras balançavam livremente. Se a perna traseira do animal experimental caísse demais, ele tomava um pequeno choque, emulando algo que um camundongo gostaria de evitar. O animal controle recebeu a mesma estimulação elétrica ao mesmo tempo que o primeiro, ou seja, sem qualquer associação com a posição das suas próprias patas.
Após apenas 10 minutos, os cientistas observaram aprendizagem motora apenas nos camundongos experimentais: Suas pernas permaneceram erguidas, evitando qualquer estimulação elétrica. Este resultado mostrou que a medula espinhal pode associar uma sensação desagradável à posição da perna e adaptar sua geração motora para que a perna evite a sensação desagradável – tudo sem a necessidade de usar o cérebro.
Vinte e quatro horas depois, o teste foi repetido, mas invertendo os camundongos experimentais e de controle: Os animais experimentais originais ainda mantinham as pernas levantadas, indicando que a medula espinhal retém uma memória da experiência passada, o que influencia novas aprendizagens.
Foi então uma questão de mapear o circuito neuronal responsável pelo aprendizado e por sua lembrança. “Estes resultados não apenas contestam a noção predominante de que a aprendizagem motora e a memória estão confinadas apenas aos circuitos cerebrais, mas também mostramos que podemos manipular a recordação motora da medula espinhal, o que tem implicações para terapias destinadas a melhorar a recuperação após danos no cordão da medula espinhal,” disse Takeoka.