Saúde
Cesarianas antecipam partos, com riscos para os bebês
Nos hospitais totalmente privados do Brasil, 86% dos partos são cesarianas
Cesarianas demais
As evidências mostram que, no Brasil, muitas cesáreas previstas para ocorrer em meio a feriados, como o de carnaval, são antecipadas ou postergadas. Pesquisadores do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa investigaram os efeitos dessa manipulação da data do parto na saúde dos bebês.
A pesquisa revela que a postergação de partos gera aumento na idade gestacional e uma redução na mortalidade neonatal. Já a antecipação reduz a idade gestacional e o peso ao nascer dos bebês, sobretudo daqueles de gestações de alto risco e da parte inferior da distribuição de peso ao nascer.
Em termos líquidos, as festividades de carnaval, na média, aumentam o tempo gestacional em 0,06 dia e reduzem as taxas de mortalidade neonatal e de mortalidade neonatal precoce em 0,30 e 0,26 por 1 mil nascidos vivos, respectivamente.
“Nossa pesquisa mostrou que existe, sim, uma extensa manipulação das datas dos partos em função do feriado de carnaval. Isso acontece por meio do deslocamento de cesarianas programadas e envolve, principalmente, mulheres menos vulneráveis, de maior nível educacional,” disse a pesquisadora Carolina Melo.
Embora a pesquisa tenha fechado seu foco no período do carnaval, a pesquisadora acredita que a tendência de antecipar artificialmente as datas dos partos é mais geral, e não se restringe aos feriados. “Enquanto a OMS recomenda um período gestacional mínimo de 39 semanas, a média brasileira é de 38,5 semanas. Isso significa que muitos bebês estão nascendo antes do tempo seguro”, diz.
Nos hospitais totalmente privados (que não atendem pelo SUS), 86% dos partos são cesarianas. O índice é muito mais elevado do que a média nacional, de 55%, que já é altíssima. Vale lembrar que a proporção de partos cesarianos recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é de até 15%. E que, com seus 55%, o Brasil ocupa a segunda posição no ranking mundial, depois da República Dominicana (58,1%).
A cesariana também é associada com a não amamentação do bebê.
Necessidade de ação governamental
Outra informação importante é que a tendência entre as mães de nível educacional mais alto é a antecipação dos partos, para que estes não ocorram durante o feriado. Mas esse tipo de providência, que privilegia o conforto da parturiente e do médico, encurtando artificialmente o período de gestação, podendo colocar os bebês em risco.
“Quando, por vários motivos, os nascimentos não podem ser antecipados por meio de cesarianas, as gestantes acabam esperando um pouco mais e muitas entram em trabalho de parto naturalmente e acabam tendo partos vaginais. As análises mostram que isso pode levar a resultados melhores em termos de maturidade gestacional e sobrevivência neonatal,” disse Carolina.
A pesquisadora alerta que, se a postergação de partos devido a um feriado é capaz de mexer em um indicador tão extremo como a mortalidade neonatal, é provável que o comum seja os nascimentos ocorrerem muito cedo no país – fato associado à antecipação de partos por meio de cesáreas eletivas -, e os bebês nascerem com condições de saúde piores do que eles poderiam nascer caso as gestações fossem prolongadas.
A conclusão dos pesquisadores é que existe uma necessidade de políticas públicas que restrinjam a antecipação de partos sem justificativas médicas, para minimizar os riscos associados a nascimentos prematuros e baixo peso ao nascer.