Saúde
Aumentam mortes por tuberculose no país
Dados obtidos pelo JOTA, e que ainda podem passar por correção, indicam 5.935 óbitos relacionados à doença em 2023
O Brasil registrou em 2023 um número recorde de mortes por tuberculose. Dados obtidos, e que ainda podem passar por correção, indicam 5.935 óbitos relacionados à doença.
É a maior marca alcançada em uma década e torna mais distante o cumprimento da meta de reduzir o número de mortes pela doença para menos de 230 até 2030.
Quando se analisa o coeficiente de mortalidade (caso de óbitos a cada 100 mil habitantes) os dados também são preocupantes. Em 2022, a taxa estava em 2,72 — o indicador mais alto desde 2008, quando a proporção era de 2,6.
O impacto da doença é grande. Segundo o Ministério da Saúde, em 2022, a tuberculose foi a segunda principal causa de morte associada a um único agente infeccioso, atrás apenas do vírus da COVID-19.
Ainda conforme o ministério, em 2023, 69% dos diagnósticos confirmados foram entre homens, 33,8% tinham entre 20 e 34 anos e 51,8% se declararam pardos.
Pandemia
Em entrevista, a coordenadora geral de Vigilância da Tuberculose, Micoses Endêmicas e Micobactérias não Tuberculosas, Fernanda Dockhorn Costa Johansen, atribuiu o aumento de mortes a uma conjugação de fatores, que se agravaram sobretudo ao período da pandemia.
Johansen observa que a tuberculose está relacionada às condições de vida da população. Durante a emergência de Covid-19, dois fatos acabaram por ampliar os riscos de contaminação.
Para se proteger contra a COVID-19 e atendendo recomendações de especialistas no período mais duro da transmissão, pessoas ficaram mais em casa. A medida, se por um lado era essencial para reduzir o risco de infecção por COVID, aumentou o risco de exposição a pessoas com tuberculose.
Além disso, pacientes postergaram idas a serviços de saúde. Tal fenômeno fez com que muitos dos problemas fossem diagnosticados já em fases mais avançadas. Não foi diferente com a tuberculose.
Por que, então, os casos aumentaram mais recentemente? “O risco de adoecimento ocorre entre 2 a 5 anos após o período de infecção”, conta a coordenadora. Ela avalia que o sistema hoje está mais sensível para identificar casos novos da doença.
“A detecção aumentou. Mas a sensibilidade do sistema ainda é menor do que a gente esperava para detectar precocemente esses casos. Por isso o aumento desse número de óbitos”, completou.
Em 2022, foram registrados 81.604 casos novos de tuberculose. Dados preliminares de 2023 indicam que 80.012 pessoas contraíram a doença.
Em 2023, onze Unidades da Federação (UF) tiveram coeficientes de incidência de tuberculose superiores à média do país (37 casos por 100 mil hab.).
As UF que apresentaram os maiores coeficientes foram Roraima (85,7 casos por 100 mil hab.), Amazonas (81,6 casos por 100 mil hab.) e Rio de Janeiro (70,7 casos por 100 mil hab.)
Cura em queda
Além do aumento de casos, dados do Ministério da Saúde revelam uma tendência de queda de cura com tratamento. Embora os números de 2022 sejam preliminares, os indicadores mostram que a dificuldade persiste há cinco anos, com agravamento durante a pandemia.
Para o ministério, o dado reforça a necessidade da vinculação ao serviço de saúde e do acompanhamento da pessoa em tratamento pela equipe de saúde.
A coordenadora observa que no período da pandemia os serviços, incluindo os de atenção primária, precisaram se reorganizar devido à emergência. “Naquele momento, tuberculose deixou de ser pensada pelos profissionais de saúde.”
Diante deste quadro, o esforço agora é de ampliar a capacitação de profissionais, com cursos a distância e capacitação permanente. Também ampliar a atuação dos enfermeiros.
Biologia Molecular
Johansen disse, ainda, que o Ministério da Saúde quer ampliar o uso de testes de biologia molecular para diagnóstico da doença. “A ideia é ampliar o número de equipamentos em funcionamento, levando também para municípios de menor porte”, disse. Johansen citou também a ampliação do uso de um teste direcionado para pessoas que vivem com HIV-aids, feito a partir de mostras da urina.
Apesar do aumento da mortalidade e da redução dos índices de sucesso de tratamento, a coordenadora afirma que o país não vai abandonar a meta de reduzir os casos da doença até 2030. “Nosso desafio aumentou. Mas com o Brasil Saudável, há um caminho promissor.”
Lançado em fevereiro, o programa traz eixos para serem desenvolvidos por 14 ministérios com populações e territórios prioritários para tuberculose e outras doenças. A estratégia prevê que, além de diagnóstico, tratamento, políticas públicas sejam desenvolvidas para reduzir a vulnerabilidade.
Mais ferramentas
A coordenadora afirma que o país também aposta em novas medidas para prevenção e tratamento da doença. A começar da vacina. “A vacina de BCG é importante para evitar casos graves”, observou. Mas é preciso mais. Johansen diz, que o mundo busca uma vacina que tenha um maior potencial de prevenção.
“A Fiocruz está pesquisando no país e há outras iniciativas internacionais. Nossa esperança é que até 2026 tenhamos alguma vacina também com boa eficácia.”
A coordenadora conta também que o ministério alterou este ano a recomendação do tratamento para crianças. Tradicionalmente, a terapia combinada é feita em seis meses. Na nova estratégia, crianças sem complicações e observados alguns critérios, esse tempo pode ser reduzido para quatro meses. “Pode parecer pouco, mas é uma mudança incrível para as mães”, disse a coordenadora.
O Ministério deve também estudar a adoção de uma droga, a rifapentina. O tratamento também tem como vantagem encurtar o tempo de tratamento de seis para quatro meses. O problema, contudo, é que a terapia não é combinada e, por isso, demanda a ingestão de várias cápsulas – o que pode representar uma dificuldade para a adesão do tratamento.
“Vamos fazer essa pesquisa aqui no Brasil operacional no sentido de ver a aceitabilidade das pessoas do país. Se, mesmo tomando muitos comprimidos ao dia, se vai ser melhor ou não desse esquema nosso em dose fixa combinada”, completou.