Nacional
Projetos travados no Congresso: desafios na retomada pós-eleições
A lista abrange propostas relacionadas às áreas de energia, economia e questões sociais, que ficaram em segundo plano enquanto os congressistas voltaram suas atenções para as eleições municipais
Com o fim do segundo turno das eleições municipais, o Congresso Nacional volta a concentrar sua atenção em uma série de projetos prioritários que estão travados, afetando diretamente a pauta econômica, energética e social do país. Durante o período eleitoral, senadores e deputados diminuíram o ritmo de votações, o que resultou no acúmulo de propostas pendentes, algumas delas paradas há meses, por divergências internas e pela complexidade dos temas.
Um dos projetos mais aguardados é o que limita os supersalários no setor público. O texto, que visa reduzir os benefícios adicionais que ultrapassam o teto remuneratório de servidores, aguarda parecer do relator há quase um ano. Esse é apenas um dos diversos temas que terão prioridade no retorno dos trabalhos legislativos.
Reforma Tributária: Desafios e Expectativas
A regulamentação da reforma tributária, considerada uma das principais pautas do governo, foi um dos textos que mais sofreram atrasos. Embora o projeto tenha sido aprovado na Câmara, ele encontrou dificuldades ao chegar ao Senado, especialmente em julho deste ano. A reforma unifica os impostos sobre bens e serviços (IBS e CBS) para criar um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, mas pontos como as alíquotas e isenções ainda precisam ser ajustados.
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, afirmou que o texto será debatido entre outubro e novembro, tendo o senador Eduardo Braga como relator. Segundo Pacheco, empresários devem adotar uma postura de concessões para que o projeto avance. Ainda há divergências entre setores econômicos, e as expectativas para sua aprovação ainda este ano permanecem incertas.
Legalização dos Jogos de Azar e a CPI das Bets
Outro tema que gera polêmica é o projeto de legalização dos jogos de azar. Embora o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha se mostrado inicialmente favorável à proposta, as preocupações com o impacto das apostas esportivas (bets) no endividamento das famílias levaram o governo a frear o avanço dessa pauta. Rodrigo Pacheco, que desejava votar o PL dos Jogos de Azar em setembro, enfrentou resistência da ala conservadora e optou por arquivar temporariamente o projeto.
O surgimento da CPI das Bets, aberta para investigar possíveis irregularidades no setor de apostas esportivas, também contribuiu para a demora na votação. Senadores como Omar Aziz e Soraya Thronicke reforçaram a necessidade de uma maior regulamentação do setor, comparando o impacto das propagandas de bets ao vício em drogas como a cocaína. O projeto, contudo, tem potencial econômico significativo, com projeções de investimentos de até R$ 100 bilhões e geração de 1,5 milhões de empregos.
Energia Eólica Offshore e o Mercado de Carbono
Os projetos relacionados à regulamentação de energias renováveis, como a exploração de usinas eólicas Offshore, também estão travados. O texto original foi distorcido com a inserção de “jabutis”, como a prorrogação de usinas térmicas movidas a carvão, o que gerou críticas. Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, articula para barrar o texto, apontando que ele poderia aumentar os encargos setoriais e elevar a conta de energia do consumidor final.
Outro tema que deve ser retomado é a regulamentação do mercado de carbono, considerado crucial para as metas ambientais do Brasil. O projeto tem apoio do governo e pode ser votado antes do fim de 2024, quando termina a gestão de Rodrigo Pacheco à frente do Senado. Leila Barros, relatora do texto, demonstrou confiança de que a proposta será aprovada ainda neste ano, especialmente com a aproximação da COP29, que ocorrerá em novembro no Azerbaijão.
A Autonomia do Banco Central e a Inteligência Artificial
A autonomia do Banco Central (BC) também permanece um tema delicado no Congresso. Apesar das tentativas do governo de impedir a tramitação da PEC que estabelece essa autonomia, já há votos suficientes para sua aprovação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Com a nomeação de Gabriel Galípolo para substituir Roberto Campos Neto na presidência do BC, a resistência do governo tende a diminuir, embora questões jurídicas ainda precisem ser resolvidas, como a garantia de estabilidade dos servidores e aposentados da instituição.
Outro ponto importante é o projeto que regulamenta o uso da Inteligência Artificial (IA). A proposta cria diretrizes para o uso e desenvolvimento de IA no Brasil, além de estabelecer a responsabilidade sobre o uso dessa tecnologia. O texto está em análise por uma comissão especial e inclui normas para identificar conteúdos modificados por IA, um ponto crucial em tempos de desinformação.
Supersalários: Expectativa de Avanço
A limitação dos supersalários de servidores públicos, aprovada pela Câmara em 2021, segue em análise no Senado. A proposta visa impedir o acúmulo de benefícios que fazem com que alguns funcionários ultrapassem o teto remuneratório estabelecido pela Constituição. A expectativa é que o relator Eduardo Gomes apresente seu parecer após o segundo turno das eleições municipais. O presidente da CCJ, Davi Alcolumbre, ainda precisa pautar a votação do texto, mas há dúvidas sobre se a proposta será votada no plenário em 2024.
Taxação de Streamings: Impasse e Divergências
Por fim, a taxação das plataformas de vídeo sob demanda (VOD), como Netflix, permanece sem consenso no Congresso. O projeto de lei que propõe a cobrança de até 6% da receita bruta dessas empresas, destinada ao desenvolvimento da indústria cinematográfica nacional, tem sido adiado por falta de acordo entre os partidos. O relator do projeto, deputado André Figueiredo, chegou a incluir o tema na pauta de maio, mas a votação foi adiada devido a resistências dentro da própria Câmara.
O Cenário Pós-Eleições
Com o retorno dos trabalhos legislativos, o Congresso enfrentará uma agenda complexa e cheia de desafios. Além dos temas mencionados, a atenção dos parlamentares também estará voltada para a continuidade das reformas estruturais, como a tributária, e para a regulamentação de setores estratégicos da economia, como o energético e o tecnológico.
A capacidade de articulação entre governo e Congresso será decisiva para o avanço dessas pautas, que têm o potencial de moldar o cenário econômico e social do Brasil nos próximos anos. A expectativa agora é que, superado o período eleitoral, os parlamentares se concentrem na aprovação desses projetos, que, embora travados, são essenciais para o desenvolvimento do país.