ECONOMIA
Dólar segue em alta e pode atingir R$ 6: cenário fiscal e incerteza econômica elevam pressões no Brasil
O mercado financeiro brasileiro enfrenta uma tempestade de incertezas, especialmente quando se trata da relação cambial entre o real e o dólar. Na última sexta-feira, 1º de novembro, o dólar americano alcançou o valor de R$ 5,87, consolidando a moeda americana acima de R$ 5 por um período de 219 dias consecutivos – uma marca histórica que pressiona de maneira significativa os índices de inflação e aumenta a apreensão do mercado em torno do futuro econômico do país. Analistas temem que, sem uma política fiscal sólida e eficaz, o dólar possa ultrapassar a marca de R$ 6, refletindo a percepção de vulnerabilidade fiscal e a falta de direcionamento nas contas públicas.
A desvalorização do real frente ao dólar tem origem em um quadro de incertezas fiscais e em políticas econômicas pouco claras para controlar o déficit público. Desde 28 de março de 2024, a cotação da moeda americana permanece elevada, reflexo direto de uma economia brasileira que carece de ações concretas. Analistas de mercado já sinalizaram a urgência de uma resposta governamental, especialmente após o resultado das eleições municipais em outubro, que reforçou a expectativa de medidas imediatas para conter os gastos públicos.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, atualmente em viagem pela Europa até nove de novembro, adiou o anúncio das esperadas medidas fiscal para após seu retorno. Este adiamento gerou frustração entre investidores e economistas, que esperavam um posicionamento firme do governo, considerando a instabilidade atual. Esse atraso foi percebido como um sinal de desorganização e falta de compromisso, o que impulsionou ainda mais a alta do dólar.
De acordo com Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos, a escalada do dólar é um reflexo direto da insegurança gerada pela ausência de um ajuste fiscal concreto. Ele observa que o governo ainda não apresentou um plano robusto capaz de garantir um equilíbrio nas contas, deixando o mercado em estado de apreensão. Barros explica: “A ausência de garantias fiscais impacta a confiança e, consequentemente, o câmbio. Enquanto essa percepção não mudar, continuaremos observando a valorização do dólar frente ao real”.
Para Écio Costa, economista da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a política expansionista adotada pelo governo em 2024 é a principal causa da desvalorização do real. “O aumento dos gastos públicos sem contrapartidas de controle está gerando um déficit preocupante. Isso diminui a confiança e torna o real vulnerável”, ressalta Costa, apontando que a situação exige um comprometimento maior com a disciplina fiscal.
A alta do dólar traz consequências diretas para a inflação, já que muitos produtos importados ou cotados em dólar, como soja, milho e petróleo, tornam-se mais caros. Esse fenômeno, conhecido como *pass-through*, impacta rapidamente os preços internos. Felippe Serigati, economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explica que a valorização do dólar afeta desde os combustíveis até alimentos e insumos, fazendo com que o aumento nos preços se reflita diretamente no consumidor final.
O índice de inflação IPCA-15, que antecipa a inflação oficial, apontou uma alta de 0,54% em outubro, somando 4,47% no acumulado de 12 meses. O Boletim Focus do Banco Central já projeta uma inflação de 4,55% para o ano, superior à meta de 3% estabelecida para 2024, o que representa uma ameaça adicional ao poder de compra das famílias brasileiras.
Outro fator importante que contribui para a alta do dólar é a previsão de queda no superávit da balança comercial brasileira para 2024, estimado em US$ 70,4 bilhões, abaixo do saldo de US$ 98,9 bilhões registrado no ano anterior. Esse cenário implica uma menor entrada de dólares no país, o que exerce uma pressão direta sobre a taxa de câmbio. Segundo Écio Costa, “um superávit mais baixo significa menos dólares circulando internamente, o que, aliado à incerteza fiscal, valoriza ainda mais a moeda americana”.
Ao nível global, as eleições presidenciais nos Estados Unidos, que colocam Kamala Harris e Donald Trump em uma acirrada disputa, adicionam volatilidade ao mercado. Qualquer mudança na política econômica americana pode ter implicações para moedas de países emergentes como o Brasil. A expectativa é que, dependendo do resultado, a taxa de câmbio internacional seja ainda mais pressionada.
Recentemente, o governo Lula ajustou a meta fiscal para 2025, prevendo um superávit zero, o que desencadeou uma reação negativa do mercado. Muitos analistas questionam a eficácia dessa meta, uma vez que ela não traz garantias de corte de gastos, essencial para manter o equilíbrio econômico e reduzir a pressão sobre o dólar. Para Felippe Serigati, essa alteração da meta fiscal é um sinal claro de que o governo evita adotar uma postura austera. “Sem um compromisso firme com a disciplina fiscal, a política atual coloca o país em uma situação de vulnerabilidade constante”, argumenta.
Com a política de endividamento elevado e falta de previsibilidade, o Brasil pode enfrentar um ciclo de inflação persistente, onde o aumento dos gastos públicos resulta em mais endividamento e possível emissão de moeda. Esse desequilíbrio afeta a economia, pressionando a inflação e encarecendo produtos e serviços para a população.
A situação impõe à equipe econômica de Lula o desafio de adotar medidas concretas e eficientes para controlar o câmbio e reduzir a inflação. A apresentação de um plano fiscal confiável e robusto, que inclua corte de gastos e contenção do endividamento, é essencial para reverter à atual desvalorização do real e restaurar a confiança do mercado.