Esporte
Do Jūjutsu ao Jiu-jítsu – Parte 1
Um passeio pela história das artes marciais que deram origem ao Brazilian Jiu-Jítsu
Jūjutsu (柔術) é uma palavra japonesa que pode ser traduzida como “arte suave” ou “técnica suave”. A pronúncia correta é algo como “dju djutsu”, mas, por causa da barreira linguística, a que foi adotada no Ocidente, mais especificamente no Brasil, foi “Jiu-jítsu” e, por isso, adotaremos essa grafia.
O termo é composto por dois kanjis (ideogramas japoneses): “Ju” (柔) significa “suave”, “flexível” ou “adaptável”; “Jutsu” (術) significa “técnica”, “arte” ou “habilidade”.
A ideia central do Jiu-jítsu é usar a flexibilidade, a suavidade e o redirecionamento da força do oponente, em vez de confrontá-lo com força bruta.
Essa luta envolve técnicas como alavancas, torções, imobilizações, arremessos e golpes, permitindo que o praticante neutralize um adversário maior ou mais forte, aproveitando o movimento e a energia do oponente.
Historicamente, a primeira vez que o termo Jiu-jítsu apareceu foi no século XVI, durante o período Sengoku (Guerra Civil) no Japão, quando os samurais precisaram desenvolver técnicas eficazes para lidar com situações em que ficavam desarmados no campo de batalha.
Como a armadura dos guerreiros limitava movimentos, o Jiu-jítsu se tornou uma ferramenta perfeita para neutralizar o oponente sem depender apenas da força física.
Nessa época, praticamente cada clã samurai (o Japão era dividido em clãs altamente estratificados socialmente, e os guerreiros samurais a serviço de seus suseranos estavam no topo da escala) desenvolveu o seu próprio estilo (ryū) de Jiu-jítsu.
Cada ryū tinha suas próprias técnicas e filosofias, refletindo as necessidades e as condições da época e da região onde foi desenvolvido. Muitas dessas escolas surgiram entre os séculos XV e XIX, período marcado por guerras civis e o domínio dos samurais.
Algumas estimativas sugerem que havia mais de 200 estilos de Jiu-jítsu durante o Japão feudal. Como já foi dito, cada clã samurai, província ou mesmo mestre desenvolvia seu próprio conjunto de técnicas, muitas vezes combinando conhecimentos de combate armado e desarmado.
Entre as escolas mais famosas de Jiu-jítsu, destacam-se: Tenshin Shōden Katori Shintō-ryū, uma das mais antigas, fundada no século XV, e que incluía tanto combate armado quanto desarmado.
Takenouchi-ryū, fundado no século XVI, é um dos ryū mais antigos focados especificamente em Jiu-jítsu, além de técnicas com armas.
Yōshin-ryū, uma escola que influenciou diretamente o desenvolvimento do Judo e do Aikidō, conhecida por suas técnicas de imobilização e controle.
Kitō-ryū, famoso por suas técnicas de projeção, foi uma das principais influências do Judo criado por Jigoro Kano.
Daitō-ryū Aiki-Jūjutsu, que influenciou o desenvolvimento do Aikidō, focado em técnicas de controle e harmonização da energia do adversário.
Aqui fazemos uma ressalva para uma escola que era pouco conhecida e que teve grande relevância na formatação da luta de chão (Ne Waza) e que influenciaria diretamente o Brazilian Jiu-Jitsu. A Fusen-ryū tem uma história interessante.
“Fusen” significa algo como “imperfeito” ou “incompleto”, e reflete uma filosofia de que as artes marciais estão sempre em evolução e que nenhum lutador ou estilo é perfeito.
Este conceito é bem diferente do foco tradicional das escolas clássicas de “Jūjutsu”, que geralmente afirmavam ter um conjunto de técnicas “completo”.
A Fusen-ryū se notabilizou por vencer os combates contra a escola de Jigoro Kano, a Judo Kodokan, literalmente puxando os adversários para a guarda de pernas na luta de chão (Ne Waza) e finalizando-os com chaves de braço e estrangulamentos.
Fica claro que cada escola tinha variações específicas de técnicas de luta agarrada, projeções, estrangulamentos e controle das articulações, sempre adaptadas ao uso com ou sem armadura, e dependendo da situação militar ou civil.
Como podemos notar, essas tradições foram fundamentais para a evolução das artes marciais no Japão e, em última análise, influenciaram estilos modernos, como o Judo, o Aikidō e o Brazilian Jiu-Jitsu.
É óbvio, no entanto, que a história das artes marciais no Japão não começou com o Jiu-jítsu, ela surgiu bem antes do citado período Sengoku (século XVI).
Diante disso, muitos leitores podem se perguntar:
e a história de o Jiu-jítsu ter vindo da Índia, através da China, para o Japão? É lenda? É mito? É ficção, ou existe algum fundamento? Bom, temos muito o que conversar aqui…
Até breve.
CARLOS LIBERI – Mestre de Jiu-Jítsu, faixa-coral (sétimo grau); membro do Conselho Diretor da Gracie Barra Flórida, instrutor-chefe da GB Sanford e da GB Campinas. Especialista em história e filosofia das artes marciais pelas Faculdades Integradas de Santo André (FEFISA).