Internacional
Relatório revela supostos crimes de guerra, repressão e tortura do regime de Assad
Comissão de Inquérito da ONU para a Síria fez duas visitas após dezembro; especialistas estiveram em valas comuns e antigos centros de detenção; peritos liderados pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro querem mecanismos de justiça confiáveis
Um relatório da Comissão de Inquérito da ONU para a Síria publicado na segunda-feira revelou provas de uso sistemático de detenção arbitrária, tortura e desaparecimentos forçados pelo regime do ex-presidente do país, Bashar al-Assad.
O grupo de especialistas, liderado pelo brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, enfatiza que é preciso garantir que esses atos potencialmente considerados crimes de guerra e contra a humanidade, não voltem a ser cometidos. Para eles, o conflito é marcado por “graves violações sistemáticas do direito internacional”.
Acabar com a impunidade
O relatório foi publicado após quase 14 anos de investigação e revela “um momento crítico”, no qual o governo de transição e as futuras autoridades sírias podem garantir a não repetição desses crimes.
Paulo Sérgio Pinheiro disse esperar que as constatações sobre o período analisado “ajudem a acabar com a impunidade nesses padrões de abuso.”
Relatório ressalta a angústia persistente de dezenas de milhares de famílias que ainda procuram parentes desaparecidos
Na sequência da derrubada do governo de Bashar al-Assad, em dezembro, foram libertados inúmeros detidos. No entanto, o relatório ressalta a angústia persistente de dezenas de milhares de famílias que ainda procuram parentes desaparecidos.
A comissão já despachou duas equipes que visitaram valas comuns e antigos centros de detenção estaduais na área d a capital Damasco, incluindo a notória prisão militar de Sednaya.
Provas queimadas ou destruídas
Em locais de detenção, como a Divisão de Inteligência Militar 235 e as Filiais de Inteligência da Força Aérea em Mezzeh e Harasta, foram verificadas provas documentais significativas, mas várias delas foram queimadas ou destruídas.
Para o perito Lynn Welchman, os sírios que não encontraram seus entes queridos entre os libertados têm nessas provas e depoimentos de detentos “sua maior esperança de descobrir a verdade sobre parentes desaparecidos”.
Nessas instalações, os prisioneiros vivenciaram atos como espancamento severo, choques elétricos, estupro e tortura psicológica. Sobreviventes falam de casos de desnutrição, doenças e execuções, com cadáveres deixados em celas comunitárias por dias.
Welchman elogiou a decisão do governo interino sírio de proteger valas comuns e locais de crimes e pediu ainda mais esforços da sociedade civil síria relevante e atores internacionais.
Mecanismos de justiça confiáveis
A integrante Hanny Megally pediu apoio contínuo aos sobreviventes e famílias, enfatizando a importância de mecanismos de justiça confiáveis em cooperação com órgãos como o Mecanismo Internacional, Imparcial e Independente, Iiim.
O relatório compilou mais de 2 mil depoimentos de testemunhas, incluindo 550 sobreviventes de tortura. A ONU revela que a análise é a mais abrangente até o momento sobre atrocidades associadas às detenções cometidas pelo regime deposto.