Judiciário
O direito à crítica deve ser garantido em uma sociedade democrática
Passo importante para a consolidação da democracia no Brasil é o amadurecimento e a autorresponsabilização dos líderes de nossas instituições
Os últimos acontecimentos em torno da polêmica do Pix reavivam o debate sobre a diferença entre desinformação e a crítica, especialmente nas redes sociais. O vídeo que o deputado Nikolas Ferreira postou sobre a fiscalização do Pix viralizou com mais de 300 milhões de visualizações e causou as mais diversas reações, tanto em defesa quanto em ataques.
As análises do vídeo perpassam desde as que o acusam de fake news e de hipocrisia até aquelas que acreditam que o vídeo demonstrou uma estratégia política muito bem colocada, a partir do momento em que conseguiu sintetizar a insatisfação e a falta de confiança da população no governo.
A questão desse texto não é avaliar o vídeo em si, se a estratégia política é hipócrita ou não, ou se as visualizações foram orgânicas ou impulsionadas pelos assessores, mas sim compreender que uma crítica dura, embora incômoda, faz parte do jogo. Até porque, ao contrário do que se pode pensar atualmente, criticar as ações de um governo com uma retórica forte não é crime. Na verdade, é política, e isso é ainda mais importante em uma sociedade democrática.
O que muitos podem esquecer devido aos altos níveis de polarização atuais, é que esses embates sempre aconteceram. Cabe lembrar que na época de FHC, a então oposição realizava críticas contundentes ao plano Real. Apesar de ter demonstrado ser um plano econômico que mudou a história do país, a crítica a essa medida não foi considerada crime.
Uma sociedade verdadeiramente democrática inclui a habilidade de saber conviver e debater com quem pensa diferente. Vivemos desafios com a tecnologia massificada e a velocidade que uma desinformação pode correr, mas isso não pode ser usado como pretexto para criminalizar opiniões que são apenas divergentes.
Esse é o perigo da supressão de opiniões como forma de combate à desinformação. Essa dinâmica pode levar aos “tribunais da verdade”. O problema é: quem define o que é verdade ou não? Limitar o discurso com base em critérios amplos, como “desordem informacional” — seja lá o que isso signifique —, gera problemas a partir do momento em que qualquer discurso de oposição pode ser enquadrado.
No documento “Liberdade de expressão: da necessidade proteção e promoção”, realizado pelo Centro Voxius através do Instituto Sivis, o texto defende que é válida a discussão de alguns limites à liberdade de expressão, desde que circunscritos e pontuais. Mas, via de regra, é a liberdade de expressão que fará a verdade, o conhecimento e a transparência florescerem, enquanto a censura certamente prejudicará esses fins.
Um passo importante para a consolidação da democracia no Brasil é o amadurecimento e a autorresponsabilização dos líderes presentes em nossas instituições. Culpar as fakes news por falta de comunicação e erros é um caminho fácil. De fato, a desinformação precisa ser combatida, mas esse problema encontra raízes profundas como a falta de educação formal e cidadã, por exemplo, que não será tratado realizando supressão de discursos em cima de critérios amplos, como autocracias fazem.