Nacional
Collor e Bolsonaro sob olhar do STF: Brasil pode ter dois ex-presidentes presos em 2026
Se isso ocorrer, metade dos chefes do Executivo do Brasil pós-redemocratização terá sido presa depois de usar a faixa presidencial

O Brasil poderá chegar a 2026 com dois ex-presidentes presos. Além da expectativa sobre a denúncia contra o ex–presidente Jair Bolsonaro (PL) a ser apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), com expectativa de análise célere pelo Supremo Tribunal Federal (STF), há ainda uma ação contra o ex-presidente Fernando Collor de Melo (PRD). Denunciado por corrupção, ele a condenação mantida e está nas possibilidades finais de recurso. O encaminhamento dos casos aponta que é plausível o cenário com Collor e Bolsonaro condenados em 2026.
Os processos são distintos. Bolsonaro, se condenado, deve cumprir pena por crimes cometidos durante seu mandato como presidente. Ele foi indiciado pela Polícia Federal por tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. Já Collor, responderá por corrupção ativa entre 2010 e 2014, cerca de 20 anos depois de ter sido deposto do Planalto. À época do caso, ele era senador.
O andamento das ações deve ter também compassos diferentes. A ação penal contra Collor chegou ao Supremo em 2018 e teve seu julgamento adiado algumas vezes por pedidos de vista. A expectativa é de o caso de Bolsonaro, por sua vez, tenha um julgamento célere. Contam a favor disso, a costumeira diligência do relator do inquérito sobre a investigação dos atos antidemocráticos, o ministro Alexandre de Moraes, o provável encaminhamento à 1ª Turma e o interesse dos ministros de que o julgamento não seja contaminado pelas eleições de 2026.
Se houver a prisão de Bolsonaro e de Collor, o Brasil terá quatro presidentes da República encarcerados desde 1988. O atual chefe do Executivo, Lula (PT), ficou preso por pouco mais de um ano e meio, de 2018 a 2019, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro – processos anulados após o STF declarar incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar as ações.
Também em 2019, Michel Temer (MDB) foi preso preventivamente por lavagem de dinheiro e corrupção. Ele passou cerca de dez dias na cadeia, mas não foi condenado em nenhum processo. Assim como o caso de Collor, as investigações contra Lula e Temer ocorreram no âmbito da Operação Lava Jato.
Collor: o que falta para finalizar o julgamento?
O político alagoano foi condenado pelo Supremo em 2023, por lavagem de dinheiro e recebimento de propina. Para a Corte, ficou comprovado que o ex-presidente recebeu R$ 20 milhões, entre 2010 e 2014, para viabilizar irregularmente contratos da empresa BR Distribuidora – hoje, Vibra Energia – com a UTC Engenharia para a construção de bases de distribuição de combustíveis. A vantagem era dada em troca de apoio político para indicação e manutenção de diretores da estatal.
Não houve unanimidade no voto dos magistrados sobre qual seria a pena a Collor. O ministro Edson Fachin, relator do caso, votou para condená-lo a 33 anos, 10 meses e 10 dias de prisão, já Luís Roberto Barroso foi favorável à aplicação de pena de 15 anos e 4 meses por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. O colegiado formou consenso com a base na média dos votos individuais, depois de realizar dosimetria da pena, e prevaleceu a condenação por oito anos e dez meses em regime fechado.
A defesa entrou com recurso sob o argumento de que o tempo estabelecido pela pena não correspondia ao voto médio discutido em plenário. Em novembro do ano passado, o Supremo negou o questionamento e manteve a pena, por 6 votos a 4. A maioria dos ministros seguiu o voto de Alexandre de Moraes, relator do recurso. Os outros votos seguiram a divergência aberta por Dias Toffoli propondo a redução da pena para quatro anos.
Agora, a defesa de Collor aguarda a publicação do acórdão, peça que oficializa o resultado do julgamento, para avaliar se deve entrar com recurso. O advogado Marcelo Bessa afirmou ao JOTA que só depois da leitura do documento vai decidir os próximos passos. Collor ainda pode apresentar embargos infringentes, recurso final à Corte quando a decisão entre os ministros não é unânime. Só depois disso, a execução da pena poderá ser ordenada.
O caso é julgado pela Corte na Ação Penal (AP) 1025. A denúncia foi apresentada pela PGR em 2015.
Bolsonaro: julgamento vai ser finalizado neste ano?
A expectativa é de que uma conclusão do Supremo sobre o futuro do ex-presidente Jair Bolsonaro ocorra ainda neste ano, conforme já antecipou o JOTA PRO Poder. A denúncia contra o mais recente ex-chefe do Executivo deve ser sintética e parcelada, em moldes similares às denúncias anteriores de todos os condenados pelo 8 de Janeiro, o que permitirá um julgamento mais rápido.
O andamento da denúncia também pode ser acelerado pela usual rapidez do ministro Alexandre de Moraes na liberação dos casos. O julgamento deve ser encaminhado à 1ª Turma, composta apenas pelos ministros Cármen Lúcia, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Flávio Dino, além do próprio Moraes, e não ao plenário. Neste caso, é esperada condenação unânime.
A Polícia Federal (PF) encaminhou, em novembro do ano passado, à PGR relatório final com o indiciamento de Bolsonaro e outras 36 pessoas. Foram atribuídos ao ex-presidente os crimes de abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de estado e organização criminosa. Para começar a instrução da ação penal no Supremo, deve haver antes a denúncia da PGR à Corte. Nela, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, pode ainda ampliar a lista dos crimes atribuídos a Bolsonaro.
Lula e Temer: dois presidentes já foram presos
O atual chefe do Executivo foi o primeiro presidente pós-redemocratização a ser preso. Em abril de 2018, o então juiz Sergio Moro determinou a prisão de Lula para cumprir a pena de 12 anos e 1 mês de prisão pela condenação em segundo grau no caso do triplex em Guarujá (SP). Lula também foi condenado em segunda instância no caso do Sítio de Atibaia, mas, um ano depois, o STF considerou que os processos não tinham correlação com a Operação Lava Jato e anulou as condenações. Em seguida, o Tribunal também reconheceu a parcialidade de Moro na condução dos processos. Com isso, as decisões do ex-juiz em relação a Lula foram anuladas.
Parte do tempo em que Lula esteve encarcerado na sede da Polícia Federal em Curitiba coincidiu com a estadia de Michel Temer na Superintendência da PF no Rio de Janeiro e, posteriormente, na sede da PF em São Paulo. Denunciado três vezes pela PGR enquanto ainda era presidente e alvo de dez inquéritos, ele foi preso poucos meses depois de deixar o cargo, em março de 2019. Passou cinco dias detido no Rio de Janeiro. Depois, em maio do mesmo ano, voltou à prisão, desta vez em São Paulo, onde ficou por menos de uma semana.
Assim como Lula, Temer também foi preso no contexto da Lava Jato. Mas diferentemente do atual presidente, ele não chegou a ser condenado. Foi preso preventivamente, em março, em mandado expedido pelo juiz Marcelo Bretas, então na 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro. Deixou a prisão poucos dias depois, quando o juiz Antonio Ivan Athié, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), aceitou um habeas corpus da defesa. A decisão de Athié foi derrubada pela 1ª Turma do TRF2, em maio, e Temer voltou para a prisão. Ele foi solto novamente depois de novo habeas corpus concedido pelo STJ.
Temer foi o primeiro presidente da República a ser denunciado criminalmente durante o exercício do mandato. Não apenas uma, mas três vezes. Duas delas foram impedidas de tramitar durante o mandato pela Câmara e a terceira foi apresentada poucos dias antes de Temer deixar o Planalto e não chegou a ser votada pelos deputados.
Em 2022, a Justiça Federal de Brasília absolveu Temer no processo que o havia levado à prisão. A ação penal por suposta corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo Angra 3 foi encerrada.
Presidente: profissão de risco?
Se houver a prisão de Bolsonaro e Collor em 2026, metade dos chefes do Executivo brasileiros pós-redemocratização terá ido para a cadeia depois de usar a faixa presidencial. Desde o fim da ditadura, o país teve oito presidentes. Quatro deles não foram presos depois do mandato: José Sarney (MDB), Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Dilma Rousseff (PT). Mas todos foram envolvidos de alguma forma na Operação Lava Jato. Dilma, que sofreu impeachment por causa de pedaladas fiscais, se tornou ré por supostamente integrar o “quadrilhão do PT”, um esquema montado para a coleta de propinas de R$ 1,48 bi de 2002 a 2016. Dilma foi absolvida e o processo foi arquivado.
Sarney chegou a ser denunciado ao Supremo pela PGR sob a acusação de ter recebido R$ 16,25 milhões em propina de recursos desviados de contratos da Transpetro. Em 2023, a denúncia foi rejeitada a pedido da própria PGR. FHC, por sua vez, foi citado na delação de Emílio Odebrecht, à época dono da construtora que protagonizou a operação. O empresário disse que o ex-presidente havia recebido vantagens indevidas e não contabilizadas durante suas duas campanhas presidenciais. O caso não gerou repercussões penais. Já o governo de Itamar foi citado na delação do ex-senador Delcídio Amaral, que disse que havia um esquema de corrupção na Petrobras durante a gestão do ex-presidente, morto em 2011, assim como na de FHC, à época em que Joel Rennó presidia a empresa.
Jota