Segurança Pública
O fim do Exército Brasileiro da forma que o conhecemos: a transformação bruta, mas imperceptível, com mais militares temporários e menos militares profissionais
Oficiais cientistas crescem em número, mas permanecem pouquíssimo tempo na força, longe de operações e campos de batalha

Poucos na sociedade civil estão percebendo. Mas as Forças Armadas brasileiras tem sofrido uma transformação que impacta sua base profissional. Enquanto aqueles que se consideram como militares profissionais, os que ingressam ainda na adolescência ou como jovens adultos em escolas de oficiais e graduados, têm sido diminuídos em número, os militares temporários, aqueles que já ingressam com cursos técnicos e graduação, tem crescido bastante em várias posições das forças, inclusive em postos de oficial superior.
De 2014 até 2024, um intervalo de somente 12 anos, o número de vagas disponibilizadas pelo Exército Brasileiro para a prova da ExPCex, que garante o ingresso como oficial na Academia Militar das Agulhas Negras, diminui de 520 para 440, o que equivale a cerca de 16%. A AMAN é o único centro de formação que forma os oficiais chamados de combatentes, aqueles que podem chegar até General de Exército, o último posto na força terrestre.
Em um intervalo também de 12 anos, entre 2013 e 2025, saltou de 7.537 para 15.725 o número de militares graduados temporários na força terrestre, foi um crescimento de mais de 108%. Nesse mesmo intervalo de tempo a quantidade de militares temporários nos postos de oficiais, que só podem permanecer na força por um período máximo de 8 anos, também cresceu de forma abrupta, na faixa de 30%, passando de 8.085 oficiais para 10.528.
Nas mais diversas profissões, de cursos técnicos a mestrados, os militares temporários chegam com seu conhecimento “extra Forças Armadas” e passam por cursos de adaptação para a vida militar, sendo então incorporados às fileiras das Forças Armadas.
Promoção até subtenentes e generais só para quem é de carreira
O acesso aos postos e graduações mais altos de cada círculo – generais e subtenentes – continua restrito aos chamados militares de carreira, ou militares profissionais, que são aqueles que ingressaram por concurso público e tem exclusividade para ascender até os postos e graduações mais altos em suas respectivas áreas.
Para entender a visão dos próprios militares coletamos 196 comentários sobre o tema e resumimos os pensamentos majoritários sobre a situação. Apuramos que os próprios militares interpretam as mudanças no Exército como negativas, apontando uma erosão da estrutura, perda de motivação e abandono dos valores tradicionais das Forças Armadas. Os militares temporários são retratados como “descartáveis” e “sem direitos”, enquanto há também forte indignação com supostos privilégios de oficiais e generais.

Essa indignação com privilégios das altas patentes vem crescendo ao longo do tempo, uma postagem há alguns meses feita pela Revista Sociedade Militar revelou a construção de uma mansão no valor de mais de 3 milhões de reais em área restrita do Exército. O imóvel seria ocupado por um General de Exército com 4 estrelas. A postagem foi replicada por diversos sites e jornais e gerou grande repercussão tanto entre militares como entre civis, que interpretaram o privilégio como exagerado.
Transcrição dos comentários mais relevantes em post que analisa o crescimento do número de militares temporários no Exército Brasileiro.
Comentários com sentimento de falência institucional e crítica:
“Desmoralização! Grande maioria que está na ativa apenas quer sua última promoção e ir embora.”
“Não vale a pena ser militar no Brasil… só um bando de puxa-saco mandando um nos outros se achando superior aos demais.”
“Enquanto isso outros países estão treinando e aumentando suas forças armadas! Mas o Brasil tá certo, confia meu povo.”
“As forças armadas entrou em total descrédito entre a população.”
“Auto-sucateamento. Quem tem pena é galinha.”
Comentários que expressam opinião neutra ou analítica, mas crítica da estrutura:
“No caso das FFAA, temos a formalidade, mas descuidamos no quesito envelhecimento/expectativa de vida… Temporários não geram passivo, mas outras medidas precisam ser tomadas.”
“Tem que mudar mesmo, acabar com estabilidade, reduzir custos e se tornar mais profissional e tecnológico. Como as grandes nações.”
“Sou a favor de ter somente contratados e acabar com os de carreira que têm muitas vantagens e pouco produzem.”
Comentários com análise e tom de alerta:
“Mão de obra barata! Temporário tem o mesmo dever, menos as prerrogativas. Resumindo muito econômico, ficou doente? Põe pra fora… Ou seja, mão de obra barata e descartável!” — 48 curtidas
“Um passado de glória, um presente para esquecer e futuro nenhum…” — 50 curtidas
“A gambiarra da contratação dos temporários não resolve o déficit de evasão dos de carreira… agora estão buscando suprir as lacunas com os técnicos que no máximo serão 1° tenentes… que sacada de mestre esses generais hein?” — 52 curtidas
“Virou uma empresa Fardada. Não tem valorização da carreira pra ser atrativa aos jovens” — 32 curtidas
Os oficiais superiores cientistas temporários e sua notória cultura
As novidades no campo da contratação tem chegado com frequência. As Forças Armadas aparentemente tem se focado mais na chamada “cultura científica” e já admitem homens e mulheres com mais de 60 anos de idade, que podem ingressar como oficiais superiores temporários. Nos processo de seleção as forças deixam bem claro que há um vínculo frágil, precário, com as instituições militares
É PRECÁRIO, COM DURAÇÃO MÁXIMA DE ATÉ 96 (NOVENTA E SEIS) MESES, NÃO GERANDO QUALQUER EXPECTATIVA QUANTO À PERMANÊNCIA, À ESTABILIDADE E À TRANSFERÊNCIA PARA A RESERVA REMUNERADA, AS QUAIS SÃO RESTRITAS AOS MILITARES DE CARREIRA,
A justificativa da Marinha para a contratação de temporários RM3, por exemplo, é: “preenchimento das necessidades temporárias de Oficiais de 3a Classe da Reserva da Marinha (RM3) em Organizações Militares (OM) da Marinha, para a aplicação de sua reconhecida competência técnico – profissional ou de sua notória cultura científica.”