Educação & Cultura
Inteligência Artificial e inclusão: como usar a tecnologia para tornar as aulas mais acessíveis
Do planejamento das aulas às atividades na classe, a IA pode ser uma aliada de professores e gestores na diminuição de barreiras de acessibilidade nas escolas

Planejar aulas, personalizar os processos de ensino e aprendizagem, elaborar materiais didáticos, ajudar na recomposição de aprendizagens: são várias as funções para as quais a Inteligência Artificial (IA) pode ser adotada dentro das escolas. E uma das principais é tornar o ambiente mais inclusivo.
Na educação inclusiva, o papel das escolas torna-se central ao remover barreiras de acessibilidade, que podem ser atitudinais (relacionadas às ações do corpo docente, funcionários e colegas), físicas (relacionadas à arquitetura do ambiente), as relacionadas ao processo de aprendizagem e as comunicacionais. Essas duas últimas podem contar com a ajuda da IA para serem minimizadas, ou até eliminadas.
“Ferramentas como leitores de tela e assistentes de voz possibilitam que alunos com deficiência visual acessem conteúdos de forma autônoma, enquanto softwares de legendagem automática e tradução simultânea auxiliam estudantes surdos ou com dificuldades auditivas”, exemplifica Adriano Teixeira, doutor em Informática na Educação, professor universitário e secretário de Educação de Passo Fundo (RS).
Vera Cabral, diretora para a Indústria de Educação para as Américas na Microsoft, dá outro exemplo: “Uma vez, eu estava em uma escola onde um dos alunos tinha disgrafia. Ele me disse que não conseguia anotar o que o professor falava. Então, ele ditava para o computador, usando ferramentas da Microsoft, e obtinha a transcrição desse ditado, garantindo suas próprias anotações”.
O Microsoft Teams para educação oferece uma série de ferramentas de acessibilidade integradas para garantir que todos os alunos possam participar e aprender de maneira eficaz. Aqui estão algumas das principais ferramentas disponíveis:
Leitor Imersivo – ajuda a melhorar a leitura e a compreensão do texto, oferecendo recursos como leitura em voz alta, espaçamento de texto, temas de contraste e tradução de texto.
Legendas ao vivo – durante as reuniões e aulas, o Teams para educação oferece legendas ao vivo, permitindo que os alunos acompanhem o conteúdo falado em tempo real.
Transcrição ao vivo – as reuniões podem ser transcritas em tempo real, facilitando o acompanhamento e a revisão do conteúdo discutido.
Modo de alto contraste – o Teams permite ativar o modo de alto contraste, que melhora a visibilidade do conteúdo para alunos com dificuldades visuais.
Verificador de acessibilidade – ferramenta que verifica documentos, planilhas e apresentações para garantir que sejam acessíveis a todos os usuários Você pode conhecer mais sobre as ferramentas de acessibilidade disponibilizadas pela Microsoft aqui.
A IA é ainda uma importante aliada na personalização da aprendizagem, algo essencial para a inclusão. Com ela, cria-se a possibilidade de compreensão dos processos individuais de aprendizagem, a partir de informações que permitem a definição de estratégias e trilhas personalizadas, com a recomendação de conteúdos, em seus melhores formatos, e atividades mais adequadas a cada estudante.
IA pode ajudar a tornar a aula mais inclusiva
Embora a IA ajude, como retratam os exemplos, não basta utilizar os recursos tecnológicos para garantir uma aula inclusiva e acessível. É necessário bastante planejamento e intencionalidade para assegurar a acessibilidade, que deve estar presente desde a concepção das atividades.
“Uma aula inclusiva é aquela em que todos os alunos conseguem participar de forma equânime”, afirma Rosimar Esquinsani, especialista em Práticas Educacionais Inclusivas, doutora em Educação e professora na Universidade de Passo Fundo (UPF). “É aquela aula em que todos têm condições de participar, cada um no seu tempo, cada um da sua forma”, completa.
Segundo a especialista, é necessário que uma aula inclusiva contemple “o cenário de todos os alunos que estão naquela classe”. Isso significa considerar não apenas estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e com altas habilidades ou superdotação, mas também alunos típicos. “A grande questão para a inclusão diz respeito aos tempos de cada sujeito”, observa Rosimar.
Nesse sentido, o primeiro passo para planejar uma aula inclusiva é conhecer muito bem a turma. O professor precisa ter informações específicas dos seus alunos, compreender seus ritmos de aprendizagem, necessidades específicas, experiências prévias e gostos pessoais.
“Não se trata de um ensino para cada um, mas de uma oferta ampla e diversificada, que tenha como ponto de partida, nas crenças pedagógicas do professor, que todos aprendem e que não é possível controlar a aprendizagem”, afirma Nathália Meneghine, professora de Atendimento Educacional Especializado (AEE) da rede pública municipal de Juiz de Fora (MG), especialista em Educação e coordenadora de grupos de estudos em Educação Inclusiva.
“ Quando pensamos em inclusão, não pensamos exclusivamente nas pessoas com deficiência, mas em pessoas que aprendem, se concentram e têm ritmos de aprendizagem diferentes. ”
— Vera Cabral, diretora para a Indústria de Educação para as Américas na Microsoft
Adriano afirma que uma boa forma de garantir que todas as pessoas sejam atendidas em suas necessidades e, ao mesmo tempo, que haja uma vivência em comunidade é adotar “um planejamento flexível, que contemple metodologias ativas, ensino híbrido e diferentes formatos de avaliação, permitindo que todos os alunos encontrem caminhos para a aprendizagem de acordo com suas potencialidades”.
As IA generativas, como o Copilot, da Microsoft, podem ajudar no planejamento de atividades. Uma boa dica para os professores é utilizar o conhecimento prévio sobre a turma no prompt (o comando) dado à ferramenta. Durante a criação de um plano de aula com ajuda da IA, por exemplo, o docente pode solicitar que o sistema considere um certo tipo de público ou uma determinada metodologia ativa. A prática de escrever prompts mais completos e estruturados – de acordo com nossas necessidades e expectativas – garante resultados mais assertivos.
“As plataformas inteligentes podem sugerir abordagens metodológicas alinhadas às necessidades dos alunos, auxiliando os professores na diversificação das estratégias de ensino”, diz Adriano. Além disso, é possível pedir sugestões de como apresentar o mesmo tipo de atividade em múltiplos formatos, como textos, áudios, vídeos legendados e ferramentas de leitura assistida. “A inclusão efetiva ocorre quando os recursos de acessibilidade são integrados naturalmente ao ensino, e não apenas como adaptações pontuais para alguns alunos”, afirma o especialista.
Outra dica é planejar atividades que contemplem a gamificação e o uso de realidade aumentada. “Essas tecnologias permitem que conteúdos complexos sejam trabalhados de forma lúdica e imersiva, beneficiando especialmente estudantes neuro divergentes ou que apresentam dificuldades de concentração e processamento de informações”, explica Adriano. Para assegurar a acessibilidade, ele recomenda incentivar os alunos a participarem ativamente do processo de inclusão, testando ferramentas e sugerindo ao professor soluções que facilitariam sua aprendizagem. “Essa abordagem colaborativa não só melhora a experiência dos alunos, mas também fortalece sua autonomia e protagonismo no ambiente escolar”, diz o secretário.
Como a IA pode tornar as aulas mais inclusivas?
Planejamento
Recomendações para o professor
- Conhecer a turma e a individualidade de cada estudante.
- Pesquisar metodologias e ferramentas que possam contemplar as diferenças presentes na classe.
- Explorar as funcionalidades das ferramentas antes de levá-las para a sala de aula, sempre alinhando a tecnologia com o contexto educacional e com a intencionalidade pedagógica.
Como a IA pode apoiar?
Na hora de produzir um plano de aula, IA generativas podem ser usadas para personalizar o ensino de acordo com o contexto da turma, sugerindo ferramentas e metodologias. Para isso, é essencial que o professor produza prompts completos: veja aqui dicas de como personalizar o ensino criando planos de aula com IA generativa.
Em sala de aula
Recomendações para a prática pedagógica
- O conteúdo deve ser apresentado em múltiplos formatos, contemplando todos os públicos.
- Os alunos podem e devem participar sugerindo ferramentas e testando soluções.
- O professor deve mediar todo o processo, buscando derrubar barreiras atitudinais e garantindo o uso ético e seguro das ferramentas tecnológicas.
Como a IA pode apoiar?
Em sala de aula, a IA pode trabalhar os conteúdos para que sejam acessíveis em diversos formatos. Confira alguns exemplos:
- Ferramentas de legendagem simultânea transformam a fala do professor em texto.
- Ferramentas transformam texto em voz.
- Tecnologias aceitam comando de voz para executar diversas funções, como montar apresentações, fazer resumos ou gerar textos.
- Plataformas geram resumos acessíveis.
- Ferramentas transformam conteúdos automaticamente em Libras ou Braille.
Chatbots educacionais e tutores virtuais esclarecem dúvidas e gamificam o ensino de forma interativa e acessível.
Atenção com a interação humana na escola
Embora a IA apoie o processo de inclusão, ela não pode ser a única solução adotada pelos professores. Isso porque é essencial derrubar a barreira atitudinal para garantir a acessibilidade por completo. “A acessibilidade é, antes de tudo, uma questão de interação humana. Portanto, não adianta ter recursos da mais alta tecnologia disponíveis se o professor não aposta que todos aprendem, se ele acredita que a deficiência é uma sentença de incapacidade”, afirma Nathália. Para a professora, é necessário “desconstruir as crenças pedagógicas capacitistas dos professores”, que, conscientes delas, devem mudar suas atitudes e garantir a inclusão de todos.
Adriano afirma que isso passa por criar um ambiente acolhedor e promover o engajamento de todos os estudantes. “A inclusão não se limita à adaptação de materiais, mas envolve um olhar atento para a promoção da equidade e o fortalecimento da autonomia dos estudantes no processo educativo. A prática pedagógica deve ser constantemente revisada e ajustada com base no acompanhamento do progresso da turma, garantindo que cada estudante encontre, na escola, um espaço de aprendizagem significativo e acessível”, comenta o professor.
“ A verdadeira inclusão ocorre quando são respeitadas as singularidades de cada estudante, garantindo que todos tenham a oportunidade de aprender e se desenvolver plenamente. ”
— Adriano Teixeira, doutor em Informática na Educação, professor universitário e secretário de Educação de Passo Fundo (RS)
Rosimar acrescenta que os docentes devem assumir o papel de “adulto da relação” e garantir que os estudantes não fomentem práticas discriminatórias. Além disso, é essencial que eles garantam que as ferramentas tecnológicas inclusivas selecionadas no planejamento sejam usadas de forma ética.
Nathália reforça que é essencial que a educação inclusiva garanta uma vivência e aprendizagem comunitárias. “Aprender é uma experiência relacional. Todo recurso, estratégia e serviço inseridos na cena escolar devem servir tanto para atender às especificidades dos estudantes quanto para promover seu acesso ao comum na escola: ao currículo comum, aos espaços comuns, às experiências de encontro com os seus pares, e à experiência de usufruir do lugar social de estudante, sem precisar diluir sua singularidade”.
Fonte: Nova Escola