Nacional
Brasil deixa de pagar € 5 milhões para entrar na OCDE
Governo Lula adia quitação de taxa, demonstrando esfriamento do processo para integrar organização de países desenvolvidos
O Brasil deixou de pagar fatura de € 5,1 milhões em 2023 para o processo de adesão à OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). O processo de entrada começou em outubro de 2022 durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). Esfriou no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O grupo de trabalho interministerial sobre a OCDE teve uma só reunião em 2023, em 2 de outubro. Só foi instalado em agosto. Mas há discussões na Esplanada dos Ministérios há duas décadas, em diferentes gestões, sobre a cooperação com a OCDE e a possível entrada na instituição.
“Não há interesse do atual governo em dar andamento a esse processo. A prioridade é o sul global, uma visão dos anos 1980”, disse Alberto Pfeifer, coordenador do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional do IRI-USP (Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo).
O MRE (Ministério das Relações Exteriores) afirmou que o Brasil já pagou neste ano € 1,3 milhão para integrar comitês da instituição e ter algumas de suas políticas públicas avaliadas por técnicos.
O ministério não respondeu sobre a existência da conta pendente de € 5,1 milhões. Foi apurado que a conta é reconhecida pelo governo e haveria a intenção de pagá-la neste ano, mas não há certeza de que isso será feito.
A taxa de € 5,1 milhões para a acessão (entrada) no órgão será cobrada a cada ano enquanto o país for candidato. Para deixar de receber a cobrança é preciso desistir de se candidatar a integrar a instituição.
PERU DEVE ENTRAR ANTES
O processo de acessão à OCDE é demorado. Não será concluído antes de 2026. Sem empenho por parte do governo, ficará para depois. Há outros 4 países candidatos, sendo 3 da Europa (Romênia, Croácia e Bulgária) e o Peru. É provável integrarem a instituição antes do Brasil. A Argentina também busca entrar na instituição, mas está com processo mais atrasado que esses 4 países e o Brasil.
Técnicos de diferentes áreas da administração federal disseram, sob a condição de não serem identificados, que haveria vantagens para o atual governo com a ampliação da cooperação com a OCDE. Em muitas situações, o aprimoramento de políticas públicas defendido pelo órgão coincide com o que o Planalto busca.
O ministro Fernando Haddad (Fazenda) defendeu em maio de 2023 mudanças nas decisões do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) com o argumento de ser uma adequação a regras da OCDE. O Congresso aprovou a alteração no Carf em agosto.
Em janeiro de 2023, Haddad havia afirmado em Davos, na Suíça, que o governo discutiria o processo de entrada na OCDE. Mas o assunto esfriou depois. Há dúvidas se será adiado ou suspenso pelo governo.
PESO GLOBAL
Pfeifer, do IRI-USP, disse que o Brasil “perde oportunidades” ao deixar de integrar a instituição. “A OCDE é a organização multilateral econômica com maior peso no cenário global hoje. A OMC [Organização Mundial do Comércio] está travada atualmente”, disse.
A OCDE tem sede em Paris. Foi implantada em 1961 a partir do esforço conjunto de países europeus e dos EUA na reconstrução da Europa depois da 2ª Guerra Mundial.
Foi conhecida como o “clube dos ricos”, por reunir países com alto grau de desenvolvimento. Mas depois passou a ter entre seus integrantes também países em desenvolvimento que buscam aprimorar suas políticas públicas. Chile, Colômbia, Costa Risca e México fazem parte da OCDE.
DEIXA DE TER INFLUÊNCIA
Pfeifer afirma que, ao integrar a OCDE, o Brasil poderia influenciar suas diretrizes. Isso permitiria, por exemplo, conseguir reconhecimento por ter, na comparação global, matriz energética das mais limpas e maior conservação de vegetação nativa. Haveria ganho nas relações comerciais com outros países.
Outra vantagem seria ter um selo de qualidade institucional quando à governança. “Integrar a OCDE poderia ajudar o Brasil recuperação do grau de investimento do Brasil”, disse Pfeifer. Isso permitiria ao governo e a empresas pagar menos juros. O Brasil perdeu o grau de investimento em 2015, no governo de Dilma Rousseff.