CIÊNCIA & TECNOLOGIA
O futuro brasileiro no mercado sustentável de data centers
O momento de decisão sobre o papel do país no futuro da IA
O ano de 2024 foi marcado por eventos climáticos extremos no mundo inteiro, causados por políticas econômicas que ignoraram os avisos da comunidade científica. No Brasil, enquanto as chuvas do primeiro semestre destruíram parte do Rio Grande do Sul, o segundo está sendo marcado pela pior seca já registrada na série histórica do país, que iniciou em 1950.
Nos últimos meses, outra discussão ganhou os holofotes internacionais: o alto consumo energético e a emissão de gases responsáveis por efeito estufa por data centers das gigantes de tecnologia, principalmente diante da necessidade de treinamento de algoritmos avançados de inteligência artificial.
Diante da deterioração do clima, as discussões ambientais estão focadas nos temas mais urgentes e de maior impacto, como desmatamento ilegal, táticas agressivas da agropecuária, emissão de gases poluentes pela indústria e a necessidade de mudança na matriz energética.
A grande aposta econômica da atualidade, a inteligência artificial apresenta grandes possibilidades positivas para a humanidade, mas, além da concentração de poder econômico e danos sociais reproduzindo discriminações, também apresenta um novo motor de aceleração na deterioração ambiental.
O presente artigo planeja demonstrar como um olhar ambiental sob o modelo de treinamentos de algoritmos e data centers precisa ser realizado junto aos demais temas de grande impacto ambiental que devem estar no centro da preocupação de regulações sobre meio ambiente e tecnologia no país. Diante desse cenário, defendemos que o Brasil pode ser um líder mundial em novos modelos de negócios para desenvolvimento de inteligência artificial com infraestruturas que utilizam matriz energética limpa e renovável, sendo um local atraente para investimentos internacionais que permitem uma maior participação no mercado tecnológico.
Novo vetor de deterioração climática: tecnologias digitais
A professora Kate Crawford da Universidade do Sul da Califórnia denuncia que inteligência artificial não é inteligente e tampouco artificial. Algumas situações envolvendo a infraestrutura física que suporta as tecnologias digitais demonstram que o impacto ambiental delas são reais.
O alto consumo de água para resfriamento de data centers tem gerado debates com a crescente demanda de novas estruturas por parte de gigantes do setor de tecnologia, com a notícia de estudos estimando que a demanda desse segmento tecnológico já estão as 10 maiores indústrias que demandam água dos Estados Unidos e já geraram limitações para sua construção em alguns países europeus e da Ásia.
Problemas como aumento excessivo no preço da água e da energia para moradores de cidades onde os grandes centros são construídos são algumas das principais consequências imediata. Problemas a longo prazo envolvendo a qualidade de vida e a perda de arrecadação por incentivos fiscais cedidos na expectativa de fomento na economia local também são debatidos.
Mais recentemente, além da questão energética, surgiram denuncias acerca das subnotificações de emissões de gases de efeito estufa por gigantes do setor em até 662% e de manipulações na formulação de regras para a notificação dessas emissões em alguns países .
No Brasil, o tema foi superficialmente abordado no art. 59 do último substitutivo ao PL 2338/23 apresentado em 4/7/2024 pelo relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), ao estabelecer competência do Ministério do Meio Ambiente em conjunto com o Conselho Permanente de Cooperação Regulatória de Inteligência Artificial o fomento de pesquisas e desenvolvimento para redução de impacto ambiental de sistemas de IA. Recentemente, o senador indicou que o Brasil não pode perder a oportunidade de olhar para o tema de forma mais aprofundada.
Entendemos que o Brasil pode se tornar um líder mundial no mercado de novas tecnologias se aproveitar o contexto atual para criar mecanismos regulatórios que desestimulem infraestruturas dependentes de água e com alta emissão de gases e, concomitantemente, fomente o uso da matriz energética limpa com novas abordagens para a diminuição de emissões.