ENTRETENIMENTO
Significado da Música: Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores – Geraldo Vandré

Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores – Memorável 1968, aquele foi um ano de grandes manifestações e marcos para a história, não só no Brasil, mas também na Europa, nos Estados Unidos, Tchecoslováquia e México. Tudo acontecia quase que ao mesmo tempo: a Guerra no Vietnã, a Primavera de Praga, o assassinato de Martin Luther King e Robert Kennedy, o decreto do AI-5, a Tropicália, o Festival de Cinema de Cannes, etc.
No meio de tantos espinhos de 1968, eis que surge Geraldo Vandré, e nos presenteia com a mais linda flor daquela primavera.
Vamos a análise da obra:
Caminhando e cantando e seguindo a canção / Somos todos iguais braços dados ou não:
Representa as passeatas que reuniam, em sua maioria, jovens que tinham consigo um desejo de mudança, ambições e sonhos, eram movidas a cartazes de protestos, a vozes gritantes que entoavam hinos e músicas. Essa frase também nos mostra que independente de crenças e idéias, as pessoas são iguais, estando elas do mesmo lado ou não.
Nas escolas nas ruas, campos, construções:
As manifestações eram compostas de pessoas de diversos ambientes, mas que possuíam o desejo de mudança em comum: agricultores, operários, camponeses, mulheres, jovens, professores, jornalistas, intelectuais, padres e bispos.
No caso de professores, jornalistas e intelectuais eles eram censurados e vigiados, o que depois de AI-5 ocorreu com maior intensidade, os professores não podiam lecionar e mencionar nada referente ao golpe, os jornalistas tinham seus artigos e matérias cortadas pela censura e os intelectuais eram proibidos de disseminar suas ideias e também de publicá-las.
Nas universidades não havia vagas e muitos jovens não conseguiam estudar, mulheres eram descriminadas e impedidas de trabalhar, os operários sofriam com os baixos salários, agricultores e camponeses tinham suas terras ocupadas e os padres e bispos eram ameaçados, presos e muitas vezes expulsos do país. Então a maneira encontrada para protestarem pelos seus direitos, era juntarem-se aqueles que também possuíam ideias de mudança e desejo por um país melhor.
Vem, vamos embora, que esperar não é saber:
Esse trecho contesta sobre aqueles que sofriam o momento na pele e não faziam nada, afinal não se muda um país, ficando parado. Quem sabe faz a hora, não espera acontecer: refere-se também a essas pessoas que preferiam ficar em silêncio em vez de tentar alcançar a mudança junto aos estudantes e aos demais.
Pelos campos há fome em grandes plantações:
As pessoas que trabalhavam nos campos, ou que eram agricultores, também sofriam com a ditadura, os poucos que possuíam um pedaço de terra a mesma lhe era tomada, os camponeses muitas vezes eram despejados e acabavam por passar fome.
Pelas ruas marchando indecisos cordões:
Cordões é como ficou conhecido os grupos de foliões que tomavam as ruas durante o carnaval, o nome refere-se à característica dos grupos serem formados de forma que as pessoas se sucedem. Assim eram compostas algumas das manifestações, como foi o caso da Passeata dos Cem Mil, que parecia ser dividida em blocos: artistas, mães, padres, intelectuais e entre outros, que em muitos casos, caminhavam indecisos ou com medo dos militares.
Ainda fazem da flor seu mais forte refrão / E acreditam nas flores vencendo o canhão:
Enquanto os militares reprimiam os protestantes com canhões, bombas de gás, e armas, a população saia nas ruas com cartazes e com a força de suas vozes, muitos atirando pedras e tudo o que se estivesse ao alcance, mas nada parecia ser tão forte e provocante quanto os gritos, as palavras de ordem dos movimentos estudantis, frases e músicas daquele ano, essas sim eram suas verdadeiras flores. Mas começaram a surgir grupos que não acreditavam mais em democracia sem a violência, alguns grupos de radicais se formavam e gritavam em coro: “Só o povo armado derruba a ditadura”, enquanto do outro lado um grupo militante gritava: “Só o povo organizado conquista o poder”.
Há soldados armados, amados ou não / Quase todos perdidos de armas na mão:
Os soldados estavam sempre armados e dispostos a prender os manifestantes e levá-los para as salas do DOPS, porém, muitos pareciam alienados, não sabiam direito o que acontecia ou fingiam não saber, para quem sabe assim se redimir da culpa de tantas mortes e “desaparecimentos” da época. Mas tinham famílias, namoradas, mãe, irmãos podiam sim ser amados por alguém ou então odiados por todos. Muitas manifestações foram, sobretudo contra a violência dos policiais.
Nos quartéis lhes ensinam antigas lições / De morrer pela pátria e viver sem razão:
Os soldados aprendiam lições e como se houvesse uma lavagem cerebral aceitavam cumprir as ordens do governo, mas acredito que em sua maioria muitos sabiam exatamente o que faziam e concordavam com os planos e métodos. Como diz a frase eles aceitavam morrer pelo seu país, mesmo que para isso eles fossem recriminados pela população e tivessem que viver sem anseios e sem razão, afinal de contas eles só serviam para fazer o trabalho pesado para os governantes. Somos todos soldados, armados ou não: na contradição de ser ou não soldados, todos eram, a diferença esta nas armas e na motivação.
Os amores na mente, as flores no chão / A certeza na frente, a história na mão:
A maioria, se não todas as pessoas que participavam ativamente dos manifestos eram motivados pelas perdas que sofriam, pelas mortes de amigos, parentes, conhecidos, pela dúvida do que aconteciam com as pessoas que eram levadas. Alguns dos jovens quando crianças viram seus pais serem levadas por policiais e nunca mais tiveram noticias, muitos viram seus amigos morrerem e o corpo simplesmente desaparecer e acabavam por não ter direito ao enterro, alguns poucos voltavam e de outros nunca mais se ouvira, eram guiados pela certeza de que poderiam mudar o mundo e pela história que cada um deles possuía.
Aprendendo e ensinando uma nova lição:
Grande parcela dos jovens brasileiros de hoje, desconhecem o período de 20 anos desde o golpe militar até o fim da ditadura, o desejo de mudança, a fome por liberdade e a coragem de lutar não está entre as principais prioridades do jovem do século XXI. O conformismo, a tecnologia, e várias outras novidades que surgiram após 1968, impedem que estudantes despertem em si os mesmos desejos de mudança. Muitos jovens não conseguem imaginar que existiu um tempo em que não havia internet, raves, DVD, CD, TV em cores e muito menos TV a cabo, shopping centers, big brother, WhatsApp, Facebook, entre outras coisas.
Os jovens são movidos a saciar seus desejos e vontades muitas vezes supérfluas, e estão mais preocupados com o próprio bem-estar. Muitos desperdiçam o direito de voto, que infelizmente, só foi conquistado após ditadura, direito esse, que tanto foi motivo de luta dos jovens que almejavam garantir sua opinião e participar da história do próprio país.
Insatisfação contra a corrupção, violência, injustiça, leis, governos, escolas, mas não passam de apenas reclamações. A música de Geraldo Vandré é clara, nos conscientiza e informa sobre o ano de 1968 e os demais que se seguiram de ditadura militar, nos faz repensar sobre atitudes e ideais, sobre o velho e o novo, e de como o ditado “um por todos, e todos contra um” foi tão intenso durante aqueles anos. Os estudantes de outrora podem não ter derrubado a ditadura, mas foram vistos e foi parte importante e indispensável da história.
É decepcionante saber de que nos tempos atuais, aceitamos o que nos é imposto, fazemos parte de uma massa que cada vez mais parece alienada e movida às tecnologias. Não conseguimos nos separar de bens materiais e tampouco lutar contra isso, nos conformamos e ficamos aprisionados.
O ano de 1968 ficou apenas como exemplo de uma geração de jovens com ideais, alguns alienados sim, mas a maioria com esperança de um país melhor e capaz de lutar pela liberdade e contra aquilo que lhes era imposto. Mesmo depois de 40 anos essa composição ainda pode nos expor a importância da luta pelos nossos objetivos, desejos e ideais, mas principalmente de como o conhecimento dos próprios direitos e deveres é imprescindível para que se construa uma sociedade melhor e democrática, além de ser o nosso principal dever como cidadão.
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Caminhando e cantando
E seguindo a canção…
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer… (2x)
Pelos campos há fome
Em grandes plantações
Pelas ruas marchando
Indecisos cordões
Ainda fazem da flor
Seu mais forte refrão
E acreditam nas flores
Vencendo o canhão…
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer… (2x)
Há soldados armados
Amados ou não
Quase todos perdidos
De armas na mão
Nos quartéis lhes ensinam
Uma antiga lição:
De morrer pela pátria
E viver sem razão…
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer… (2x)
Nas escolas, nas ruas
Campos, construções
Somos todos soldados
Armados ou não
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Somos todos iguais
Braços dados ou não…
Os amores na mente
As flores no chão
A certeza na frente
A história na mão
Caminhando e cantando
E seguindo a canção
Aprendendo e ensinando
Uma nova lição…
Vem, vamos embora
Que esperar não é saber
Quem sabe faz a hora
Não espera acontecer… (4x)
A nossa análise é encaminhada aos senhores leitores e leitoras no sentido de alerta para a época destes ocorridos expostos para todos e trazer estes momentos para os dias atuais que passamos em nosso sofrido Brasil. Será que o cantor e compositor Geraldo Vandré nos ofertaria com a sua capacidade e inteligência essa grande obra para podermos retratar os dias atuias do nosso país?
Caminhando e cantando e seguindo a canção, somos todos iguais braços dados ou não!?
