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Monarquia de volta ao Brasil? Senado avalia pedido de plebiscito para 2026

O Brasil pode voltar a ser uma monarquia. As chances são pequenas, mas existem. Tramita na Comissão de Direitos Humanos (CDH) no Senado uma sugestão legislativa para convocar um plebiscito em 2026 a fim de restaurar a monarquia parlamentarista no Brasil. A consulta pública seria realizada simultaneamente às eleições do ano que vem.
Caso o plebiscito seja aprovado e os brasileiros optem pela volta da monarquia, quem assumiria o comando do país seria Dom Bertrand de Orleans e Bragança, bisneto da princesa Isabel e trineto do último imperador do país, Dom Pedro II, deposto em 1889, quando a República foi proclamada. Mas há um longo caminho até isso acontecer.
O autor da sugestão (SUG 9/2024) justifica afirmando que a república presidencialista “não se mostrou efetiva, tendo que gastar orçamentos, que poderiam ser investidos no povo, para comprar apoio no Senado e Câmara”.
“Em países como Espanha, Inglaterra, Dinamarca, o parlamentarismo monárquico, tem se mostrado efetivo, os índices de corrupção são baixos e os investimentos públicos são altos, porque o partido eleito pelo povo tem mais autonomia para governar em um sistema parlamentarista”, disse o paulista identificado como Ilgner A.D.L. na ficha enviada ao Senado.
A Gazeta do Povo entrou em contato com ele, mas o jovem não quis dar entrevista. Sua sugestão sobre o plebiscito foi enviada para a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado pelo portal e-cidadania e recebeu mais de 30 mil assinaturas em menos de três meses.
Quando uma ideia legislativa passa de 20 mil assinaturas, dentro deste prazo, o pedido é encaminhado para a CDH na forma de sugestão legislativa. A comissão então decide se arquiva ou transforma a sugestão em projeto de lei (PL) ou proposta de emenda à Constituição (PEC).
“Nesse caso virou projeto de emenda porque é esta seria a única forma para mudar de governo”, explica Christiano Emery, Secretário da CDH.
Inicialmente, a sugestão foi enviada para relatoria do senador Romário Faria (PL-RJ), mas ele devolveu o texto, que no momento aguarda ser encaminhado para outro relator. Depois, a proposta ainda precisa passar pela aprovação da CDH, ter assinatura de 27 senadores, ir à plenário, ter o aval de outras comissões, ser votada por Câmara e Senado e, por fim, promulgada pelo presidente do Congresso.
“Uma iniciativa vinda da sociedade não pode ficar na gaveta. Nem que seja um ‘não’ bonito, tem que ser apreciado. Não é o presidente de uma comissão que decide o que deve ser discutido, é o plenário. Vamos pôr o assunto para debater. Por que não?”, afirmou a presidente da CDH, senadora Damares Alves (Republicanos-DF), ao jornal O Estado de S. Paulo.
Estátua da D. Pedro II em frete ao Museu Nacional. A Quinta da Boa Vista, no bairro de São Cristóvão, zona norte do Rio de Janeiro, era a residência da família imperial brasileira. (Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil)
Emery acredita que, mesmo que passe por todas estas etapas, dificilmente a emenda vai adiante porque Supremo Tribunal Federal (STF) a derrubaria ou porque algum partido político entraria na Justiça com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin).
“Na técnica constitucional é simples: a possibilidade de forma de governo (república) foi dada, houve plebiscito e acabou”, diz Emery, referindo-se à consulta popular realizada em 1993.
Naquele ano, os brasileiros foram às urnas para escolher a forma de governo (república ou monarquia) e o sistema de governo (presidencialismo ou parlamentarismo). A República presidencialista venceu com 66,28%. A monarquia recebeu 10,26% votos, menos que os brancos (10,29%) e os nulos (13,20%), segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TST).
Carlos Eduardo Guerra, professor de Direito do Ibmec Rio, não vê inconstitucionalidade no pedido de plebiscito para 2026.
“A república não é cláusula pétrea (imutável). Para mudar a forma de governo, no caso para a monarquia, teria que ser por plebiscito, que é uma consulta popular. A Constituição não deixa claro, mas o entendimento é que se o povo disse isso, o povo deve ser ouvido novamente”.
Outro ponto, diz Guerra, é que o modelo proposto é de monarquia parlamentarista, ou seja, com grande força do Senado e Câmara dos Deputados, a exemplo da Inglaterra, Espanha, Bélgica, Holanda.
Caso o plebiscito seja autorizado, aprovado e a população opte pela monarquia, o jurista aponta uma série de desafios práticos: “A antiga monarquia brasileira não era uma federação, como somos hoje. Como seria compatibilizar a figura de um rei com a existência de governadores e prefeitos? Como funcionaria o parlamentarismo nesse contexto?”, questiona. “São questões importantes, já que os países monárquicos atuais são, em geral, reinos unidos ou unitários”.
O que dizem os monarquistas
Os monarquistas apoiam o regime de governo, mas ficam com o pé atrás para o plebiscito em 2026. Dom Bertrand disse à Gazeta do Povo que a monarquia nunca foi tão discutida como recentemente, mas não quer repetir o que houve em 1993, quando não houve “igualdade de condições entre os interessados, nem ampla campanha de esclarecimentos à população”.
O Chefe da Casa Imperial do Brasil considera insuficiente o prazo até as eleições de 2026 para realizar uma campanha formal de nível nacional.
“Não haveria tempo nem meios para nos organizarmos devidamente a fim de enfrentar, no campo de ideias, os que hoje detêm o poder institucional”, diz Dom Bertrand.
O historiador e consultor político Alex Catharino corrobora a preocupação do representante da família imperial no Brasil. Para ele, não adianta fazer um plebiscito se não houver esclarecimento do que é o regime monárquico e suas propostas.
“Boa parcela da população não sabe como realmente é um império. Sabem por novelas, muitas de forma caricaturizada, ou por maus professores. Há necessidade de esclarecer”, diz.
Grande defensor da monarquia, Catharino argumenta ser esta a melhor forma de governar sob a premissa de que “o presidente está preocupado com próxima eleição, já o monarca precisa preservar a próxima geração”.
“A escolha do rei está acima dos interesses partidários, das disputas ideológicas, pois tem preocupação de longos prazos. Ele vai tomar medidas não pensando na posição do momento, mas em preservar o trono, com um projeto maior de nação”, diz o historiador e escritor.
“De acordo com a doutrina católica, há uma preferência do monarquismo, pois é uma extensão das relações da família”, acrescenta.
Apesar das possibilidades, ele também considera difícil a troca de modelo de governo neste momento. Não há registros da volta da monarquia em outros países após tanto tempo – o Brasil deixou sua era imperial há 136 anos.
Ao ser questionado sobre a corrupção também nas monarquias, ele diz que sempre há riscos: “Não existem sistemas perfeitos, mas o monarca está submetido a leis, e desde 1889 temos instabilidade no Brasil”.