Educação & Cultura
Tecnologia na educação: desafios, vantagens e perspectivas
Com a expansão significativa da Covid-19 ao redor do mundo e as medidas de isolamento social para conter a doença, o ensino on-line passou a ser amplamente aplicado. Contudo, os caminhos para o uso da tecnologia da educação ainda continuam tortuosos no Brasil. Mais de um ano depois de sua adoção emergencial, restam oportunidades, perspectivas e problemas a serem analisados.
Desafios da educação a distância
A aplicação massiva e repentina do ensino on-line não considerou as dificuldades específicas de cada aluno(a). Além de poucas alternativas de equipamentos e acesso para crianças de diferentes realidades, havia pouca interação com colegas e professores(as) e pouca motivação para assistir às aulas. Essa situação apenas agravou abismos já existentes na educação brasileira.
Segundo o estudo TIC Educação 2020, realizado pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação, foram mencionados como problemas da educação ao longo da pandemia o apoio a estudantes em casa por familiares (93%), o aumento da carga de trabalho docente (73%), o atendimento a estudantes de áreas isoladas (70%) e a dificuldade de atividades para crianças em fase alfabetização (69%).
A falta de equipamentos também foi citada, mas de modo diferente por escolas públicas e particulares. Essa questão foi bastante expressiva em instituições estaduais e municipais (95% e 93% respectivamente), em áreas rurais (92%) e no Norte do país (90%). Também surgiu, com menos ênfase, em escolas particulares (58%), em regiões urbanas (83%) e no Sudeste (80%).
Por outro lado, 87% das instituições que participaram da pesquisa usaram tecnologia para transmitir o conteúdo. Entre os recursos adotados, estão a criação de grupos em redes sociais (91%), a disponibilização de aulas em vídeo (79%), a realização de aulas por videoconferência (65%), as parcerias com líderes comunitários para envio de materiais a famílias (62%), o envio de atividades e materiais por e-mail (60%) e o uso de plataformas virtuais de educação (58%).
Além das desigualdades regionais, é preciso dar atenção à familiarização dos professores e dos pais dos(as) estudantes com os recursos tecnológicos, para que eles possam ser usados na educação de maneira crítica.
De acordo como Maria Inês Fini, presidente da ANEBHI (Associação Nacional de Educação Básica Híbrida), que falou no evento Educação 360°, realizado em setembro de 2021, o primeiro passo para pensar educação a distância é garantir equipamentos tecnológicos para professores(as) e alunos(as). “A formação digital dos(as) professores(as) é fundamental e os pais também devem ser educados para usar a tecnologia, já que o ensino entrou nas casas de forma mais intensa”, mencionou ela.
Paulo Blikstein, professor da Universidade de Columbia (Estados Unidos) que também participou do evento, mostrou uma posição semelhante. Ele comentou que mover uma escola para um modelo totalmente remoto ou híbrido é um processo que exige muito cuidado, já que, além de esbarrar na questão da conectividade, amplia o abismo entre os(as) alunos(as). “No modelo on-line, os(as) melhores alunos(as) continuam com o mesmo desempenho, mas o impacto aumenta para os(as) alunos(as) com menos facilidade”, afirmou ele.
Vantagens e perspectivas da educação a distância
A pandemia mostrou que a conectividade é um elemento básico de cidadania, que, sem ela, as pessoas ficam à margem da sociedade e à margem da educação. O relatório Covid-19 e Desenvolvimento Sustentável: Avaliando a crise de olho na recuperação, divulgado pela ONU (Organização das Nações Unidas) em setembro de 2021, traz como recomendações para o mundo pós-pandemia a reabertura de escolas com segurança e a conexão de todas as crianças e adolescentes à internet até 2030.
Por sua vez, a adoção da tecnologia na educação deve levar em conta a realidade de cada local, de cada estudante, priorizando sempre o aprendizado e a experiência individual. Entretanto, os movimentos atuais nesse campo ainda são, majoritariamente, conservadores, apenas transpondo um modelo educacional antigo e em crise para uma nova plataforma.
Para Paulo Blikstein, a tecnologia já era uma ferramenta onipresente. Logo, o debate deve ser sobre a maneira com que será usada. “Ela (a tecnologia) pode ser usada apenas como um suporte diferente. A outra solução é usá-la para conectar alunos(as), levar soluções para a comunidade e enfrentar problemas reais. Nesse modelo, o(a) aluno(a) também pode levar seus conhecimentos de mundo e se emancipar. É a tecnologia educacional emancipatória”, afirmou.
Também no Educação 360°, Renata Capovilla, líder de projetos e formadora na Foreducation EdTech, comentou que a pandemia trouxe a tecnologia para a educação, que pode ser usada como uma ponte, não como uma finalidade, para atingir os objetivos educacionais. “O(A) estudante, apesar de ser nativo(a) digital, não sabe como fazer o melhor uso da tecnologia. O(A) professor(a) deve guiá-lo(a) para usar a tecnologia da melhor forma possível para aprender.”
Para Andreas Schleicher, diretor de educação da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que encerrou o evento, apesar de todos os desafios, a pandemia pode ser usada para fortalecer os sistemas educacionais. “Durante a pandemia, o mundo pôde se tornar mais interativo, mais dinâmico, e os sistemas educacionais se tornaram criativos, mas não houve uma preparação para essa mudança”, afirmou.
Logo, de acordo com Schleicher, abriu-se uma oportunidade para usar a tecnologia como potencializadora das capacidades de professores(as) e estudantes, para rever a formação dos(as) docentes e um sistema educacional ultrapassado que não prepara para o mercado de trabalho atual. “A criatividade (na educação) é muito importante para recuperar questões emocionais, sociais e de aprendizado. A educação envolve resolver problemas reais para pessoais reais e muitas soluções foram encontradas, mas foi necessário ocorrer uma pandemia para isso”, finalizou.