Internacional
Cartas inéditas revelam influência do pai sobre Hitler
Um homem presunçoso, que não respeitava autoridade e se superestimava grosseiramente: livro traça retrato raro de Alois Hitler e mostra como ele ajudou a moldar a personalidade do ditador nazista
Uma série de cartas até então desconhecidas escritas por Alois Hitler, pai de Adolf Hitler, lança um olhar mais profundo sobre as origens familiares do ditador nazista. A correspondência serviu como base para um livro lançado nesta segunda-feira (22/02) na Áustria.
O livro, lançado apenas em alemão, tem o título de Hitlers Vater – Wie der Sohn zum Diktaror wurde (O pai de Hitler – como o filho virou ditador, em tradução literal). Nele, o historiador austríaco Roman Sandgruber argumenta que Alois desempenhou um papel-chave na formação psicológica do filho.
Alois Hitler, que morreu em 1903, era um agente da alfândega austríaca, e seu trabalho exigia mudanças constantes de residência – a família Hitler teve 18 endereços diferentes.
O livro se baseia em 31 cartas que Alois Hitler escreveu ao construtor de estradas Josef Radlegger após comprar sua fazenda em Hafeld, no norte da Áustria.
Embora Alois Hitler não tivesse nenhuma experiência prática na agricultura, afirma o livro, ele “sempre quis ser um agricultor profissional (…) melhor do que os outros”.
O autor descreve Alois Hitler como um misto de autodidata, presunçoso e uma pessoa que se superestimava grosseiramente.
A mesma letra de Adolf Hitler
O trabalho de Sandgruber usa como base correspondências inéditas entregues a ele há cinco anos pela neta de Radlegger. As cartas ficaram por décadas perdidas num sótão, até que fossem encontradas por ela.
As cartas revelam que Alois usava a mesma caligrafia que o filho: a chamada Kurrentschrift, antiga forma manuscrita da língua alemã, com ângulos afiados e mudanças de direção.
O livro revela que o antissemita e genocida Adolf Hitler – nascido em Braunau am Inn, na Áustria, em 1889 – provavelmente mais tarde buscou esconder o fato de que a família já havia vivido em uma propriedade judaica em Urfahr, perto da cidade de Linz, às margens do rio Danúbio.
As cartas também mostram que a mãe de Hitler, Klara, perto da morte em 1907, foi tratada por um médico judeu que mais tarde fugiu para os Estados Unidos.
Hitler era antissemita desde jovem
Adolf Hitler já era um antissemita na juventude, conclui Sandgruber no livro, numa afirmação que contesta as alegações de que o ódio de Hitler aos judeus surgiu depois que ele se mudou para Viena.
Quando jovem, Hitler se mudou para a cidade por volta de 1908, com o objetivo de se tornar um artista, apesar de ter sido recusado na escola que pretendia frequentar.
As últimas descobertas vão de encontro aos relatos de August Kubizek, amigo de Hitler na adolescência frequentemente citado por outros historiadores.
Como líder do partido nazista, Hitler emergiu como chanceler alemão em 1933, desencadeou a Segunda Guerra Mundial e promoveu o assassinato em massa de judeus e outras minorias.
O mesmo desprezo pela autoridade
A única revolta significativa de Adolf Hitler contra seu pai, observa Sandgruber, foi a de rejeitar o desejo de Alois de que ele também seguisse uma carreira no serviço público.
“Ele queria ser um artista livre e não seguir os passos de seu pai”, escreve Sandgruber.
Entretanto, afirma o autor, tanto pai quanto filho também compartilhavam o desprezo pela autoridade e eram anticlericais, ainda que Hitler não tenha abandonado a Igreja Católica.
Alexandra Föderl-Schmid, em crítica para jornal alemão Süddeutsche Zeitung, observa que o livro é importante porque até agora não havia “quase nenhuma fonte” sobre Alois.
Há um “grande número de livros e filmes sobre o motorista de Hitler, médico pessoal, chefe de imprensa, fotógrafo, secretário”, afirma ela. Mas nada sobre seu pai. Isso mudou agora com o livro de Sandgruber.