Internacional
Política de migração da UE segue sendo uma tragédia
Na busca por uma política migratória sensata e justa, os Estados-membros da União Europeia são seus próprios piores inimigos. Entre incompetência, desinteresse e desumanidade, um vergonhoso fracasso, opina Bernd Riegert
O ministro alemão do Interior, Horst Seehofer, costuma encher a boca e prometer “soluções europeias” para a política de migração e asilo na União Europeia. Como presidente do Conselho Europeu, no semestre passado, ele manifestou a intenção de finalmente abordar a briga tóxica no bloco sobre distribuição de migrantes, processos de asilo e deportações. Nada aconteceu.
E, a julgar pelo encontro dos ministros do Interior da UE desta sexta-feira (12/03), continua não acontecendo nada. Só se dedicou um quarto de hora a discutir o novo pacto de migração e política de asilo, que a Comissão Europeia já propusera, mais uma vez, no terceiro trimestre de 2020. A atual presidência portuguesa do Conselho da União Europeia não tem disposição de abordar esse urgente tema.
Cabeça na areia
Três grupos de Estados-membros se defrontam, irreconciliáveis, na disputa de forte carga ideológica sobre refugiados e requerentes de asilo: há os refratários, como a Hungria, que se recusam a receber quem seja; há os países da frente avançada, como a Grécia, que não querem acolher todos que chegam; e há os países de destinação, como a Alemanha, que se lastimam de ser quem concede o maior número de asilos, apesar de não possuírem fronteiras extra-europeias dignas de nota.
No entanto não adianta esperar o problema passar: os migrantes continuam tentando chegar à Europa. As condições nos deploráveis campos de refugiados na Grécia, Bósnia-Herzegovina, Itália, Líbia, Espanha, Malta ou Chipre não são sustentáveis – como acabam de atestar o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) e o Conselho Europeu, o guardião dos direitos humanos no continente.
Porém o que fazem os ministros responsáveis? Eles simplesmente olham para o outro lado, torcem para que, com a pandemia, no momento a Europa tenha mais com que se preocupar do que com o destino de migrantes. A tática funciona: a opinião pública só desperta brevemente quando pegam fogo os acampamentos em Lesbos ou os bosques na Bósnia. Os políticos vão até lá para constatar a miséria. Mas nada muda.
Cinco anos do acordo com a Turquia
Na próxima semana, o assim chamado “acordo dos refugiados” com a Turquia completa cinco anos. Ele cuidou para reduzir em 75% o número dos que chegam à Grécia. Os que chegam mesmo assim ficam encalhados lá, pois Atenas não está apta a tramitar processos de asilo e implementar as decisões.
As deportações para a Turquia, previstas no acordo, quase nunca ocorrem: não porque Ancara não colabore, mas porque a Grécia parece incapaz de se organizar, apesar da volumosa ajuda financeira e logística por parte da UE.
A Itália reduziu substancialmente os resgates marítimos. Assim, os migrantes ficam presos na Líbia ou procuram novas rotas, mais uma vez afluindo em massa à Espanha, depois de passar pelos Bálcãs ocidentais ou por Chipre. A UE aposta ou na dissuasão ou na transferência da pressão migratória para outros Estados.
Cinicamente, a dissuasão se baseiq nas imagens de horror dos campos de refugiados, não em fazer os migrantes compreenderem que, em sua grande maioria, não terão qualquer chance de permanência regulamentar na UE. Pois o paradoxal da política migratória do bloco é que quem consegue chegar em solo europeu, geralmente acaba podendo ficar, de um jeito ou de outro.
Zero perspectivas
A repatriação de requerentes de asilo ou refugiados sírios, como previsto no acordo com a Turquia, só funciona em pequena medida. Isso se deve tanto à incapacidade das autoridades europeias quanto à má vontade dos países de origem em receber de volta os próprios cidadãos.
Os ministros do Interior da UE já empreenderam várias iniciativas para acelerar as deportações e repatriações. Até o momento, sem êxito, como a Comissão Europeia voltou a constatar no encontro de ministros. Agora se planeja ameaçar os países de origem com endurecimento na concessão de vistos e corte de ajuda econômica. Até agora, contudo, ameaças desse tipo se dissolveram no ar, sem qualquer efeito.
Uma “solução europeia”, com distribuição justa dos migrantes e processos agilizados, não está à vista. Não no ano corrente e provavelmente tampouco no seguinte, estima-se em Bruxelas. Um novo pacto de migração está muito longe de acontecer. E assim a lenta catástrofe nas fronteiras externas da UE simplesmente prossegue.