Judiciário
Plenário começa a analisar responsabilidade do Estado no caso de repórter fotográfico ferido pela polícia
Até o momento, três ministros consideraram que o Estado é responsável pelo resultado da ação policial, ao reprimir manifestação
O Supremo Tribunal Federal (STF) prossegue, nesta quinta-feira (10), o julgamento em que se discute a responsabilidade do Estado pela indenização a um repórter fotográfico ferido durante tumulto envolvendo manifestantes e policiais. Até o momento, os ministros Marco Aurélio (relator), Alexandre de Moraes e Edson Fachin votaram no sentido de que o Estado é responsável pelo resultado da ação policial.
A questão está sendo analisada no Recurso Extraordinário (RE) 1209429, com repercussão geral (Tema 1055). O julgamento, suspenso por pedido de vista do ministro Nunes Marques, deve ser retomado nesta quinta-feira (10).
Negativa de indenização
O recurso foi interposto por um repórter fotográfico atingido no olho esquerdo por uma bala de borracha, disparada pela Polícia Militar de São Paulo, enquanto cobria um protesto de professores na capital paulista em maio de 2000. Ele questiona decisão do Tribunal de Justiça estadual (TJ-SP) que, mesmo admitindo que a bala da corporação militar foi a causa do ferimento no olho do repórter, que perdeu 90% da visão, reformou sentença de primeira instância e assentou a culpa exclusiva da vítima e negou o pedido de indenização por danos materiais e morais contra o Estado.
Inibição de cobertura jornalística
Em voto lançado no Plenário Virtual em agosto de 2020, o ministro Marco Aurélio afastou a tese de culpa exclusiva da vítima e declarou a responsabilidade do Estado pelo dano causado ao repórter. Segundo o ministro, o entendimento do tribunal local inibe a cobertura jornalística e o direito-dever de informar, previsto na Constituição Federal (artigo 5º, incisos IX, XIII e XV e artigo 220).
Uso desproporcional da força
Para o ministro, ao atribuir culpa ao repórter, o TJ-SP endossou a ação desproporcional das forças de segurança durante eventos populares. Ele ressaltou que, nesses casos, é necessário agir com cautela para garantir aos cidadãos segurança e proteção à sua integridade física e moral, especialmente em relação a balas de borracha, cuja utilização deve observar padrões internacionais.
Segundo o relator, a PM-SP não levou em conta diretrizes básicas de conduta em eventos públicos, pois o jornalista, que apenas cumpria o dever de informar, não adotou comportamento violento ou ameaçador. “A quadra atual, marcada por manifestações populares, revela a necessidade de garantir o pleno exercício profissional da imprensa, a qual deve gozar não só de ambiente livre de agressão, mas também de proteção, por parte das forças de segurança, em eventual tumulto”, afirmou.
Legítimo exercício da profissão
Na retomada do julgamento, nesta quarta-feira (9), o ministro Alexandre de Moraes apresentou voto-vista no mesmo sentido. Segundo o ministro, não há nada nos autos que aponte a culpa exclusiva da vítima, que estava no legítimo exercício de sua profissão e em local permitido pela PM quando foi atingido.
No seu entendimento, embora haja risco para os profissionais na cobertura desse tipo de evento, há risco maior ao direito de informação, se a imprensa for impedida de noticiar os fatos. “Não é razoável exigir do profissional de imprensa que abandone o local de um evento se houver conflito entre a polícia e manifestantes”, disse.
Descumprimento do dever de proteger
Para o ministro Edson Fachin, o Estado descumpriu o dever de atuar na proteção do profissional de imprensa, o que o obriga ao pagamento pelo dano causado. Para Fachin, a atividade jornalística deve ser estimulada e protegida pelo Estado. “Soa anacrônica e autoritária a suscitação da culpa exclusiva da vítima, violando os preceitos da Constituição de 1988 e os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro em favor de uma imprensa livre”, concluiu.
- Processo relacionado: RE 1209429