Internacional
Como o Talibã ameaça a imprensa
Após tomarem o poder, extremistas falaram em manter uma imprensa livre no Afeganistão e asseguraram que não haveria ameaças. Mas onda de violência e assassinatos já demonstram o vazio dessas promessas
Em agosto, pouco depois de o Talibã derrubar o governo afegão, um porta-voz do grupo radical islâmico fez uma série de promessas. O tom era de conciliação.
Não haveria ameaças contra jornalistas, assegurou o grupo, em 17 de agosto. Mas, em não mais do que dez dias, isso se tornaria mentira, enquanto os talibãs ainda atacam jornalistas e suas famílias.
O que o Talibã afirmou, exatamente?
Os islamistas fizeram, especificamente, três afirmações a respeito dos jornalistas. Nas palavras do porta-voz Zabihullah Mujahid:
1. “Jornalistas que trabalham para a imprensa estatal ou privada não são criminosos, nenhum deles será perseguido.”
2. “Não haverá ameaças contra eles. Se os jornalistas tiveram de ficar em casa em alguns lugares, foi por causa da situação de guerra. Eles logo poderão trabalhar novamente, assim como faziam antes.”
3. “Reafirmo que defendemos a imprensa dentro de nosso quadro cultural. A imprensa privada pode continuar a ser livre e independente, podem continuar seu trabalho – apenas com algumas exigências a essa imprensa.”
Essas declarações foram imediatamente recebidas com ceticismo, mesmo porque, até agora, jornalistas vêm sendo feridos, presos ou mortos pelo Talibã. Seus combatentes são suspeitos da morte do jornalista afegão Toofan Omar, ocorrida menos de duas semanas antes da citada conferência de imprensa.
O que ocorreu desde a conferência de imprensa?
A ONG Repórteres sem Fronteiras (RSF) afirmou à DW que registrou ao menos sete casos onde repórteres e fotógrafos afegãos foram agredidos fisicamente pelos talibãs. Entre estes, o jornalista Nahid Bashardost e o repórter da TOLOnews Ziar Khan Yaad.
Yaad e seu operador de câmera foram agredidos com armas na última quarta-feira. Os dois faziam uma reportagem sobre a pobreza em Cabul quando foram atacados, relatou o repórter à DW. Seus equipamentos foram confiscados, incluindo câmeras e telefones celulares.
O jornalista afirma que os talibãs continuaram a atender seu telefone quando amigos e familiares tentavam se comunicar com ele. Quiseram também seu endereço. “Minha família teve de se mudar para outra região”, contou. “Estão preocupados comigo, e eu com eles.”
Jornalistas sob perigo mortal
Além disso, doze jornalistas já foram temporariamente presos pelo Talibã. Segundo o Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ), pelo menos quatro profissionais de imprensa e funcionários de agências de notícias tiveram suas casas vasculhadas.
Combatentes do Talibã que procuravam um jornalista da Deutsche Welle, mataram a tiros um de seus parentes e deixaram outro gravemente ferido. Os islamistas fizeram buscas nas casas de três jornalistas da DW.
Colegas de outros grupos de mídia foram raptados ou assassinados. Organizações privadas de notícias relataram ameaças diárias a seus jornalistas.
Órgãos de imprensa exigem clareza
As organizações de imprensa e ativistas demandam que o Talibã defina o que significa o tal conceito de “livre e independente” para a mídia privada, e de que forma a imprensa deve funcionar dentro do “quadro cultural” do grupo extremista.
“Exigimos que o Talibã divulgue regras claras e escritas para a imprensa, de modo a evitar as situações arbitrárias que observamos nos últimos dias”, afirmou um porta-voz da RSF.
O secretário-geral, do CPJ, Christophe Deloire, pediu que o grupo “assegure as condições para um jornalismo que faça jus ao nome.”