Judiciário
STF discute obrigatoriedade de aviso do direito ao silêncio em abordagem policial
Confissões informais sem o prévio aviso ao silêncio por parte do agente de segurança pública tem sido alvo de controvérsia jurisprudencial no Judiciário
A questão será disciplinada pelo Supremo Tribunal Federal, que julgará o Recurso Extraordinário 1.177.984, e teve repercussão geral reconhecida (Tema 1.185), em votação unânime realizada pelo Plenário Virtual.
No caso concreto, um casal preso em flagrante por policiais militares que encontraram na casa deles uma pistola, uma espingarda e munições com registros vencidos, há nulidade no procedimento policial. Na ocasião, a mulher admitiu de maneira informal a posse da pistola encontrada em seu quarto, o que poderia configurar a confissão da prática do delito.
Ao analisar o caso, o TJ-SP entendeu que os policiais não são obrigados a avisar os acusados do direito ao silêncio. O relator da matéria no Supremo, ministro Edson Fachin, entendeu que a relevância social e jurídica do tema transcende os limites subjetivos da causa.
No recurso impetrado no STF, os advogados do casal, Alberto Toron e Renato Martins, sustentam que a confissão extrajudicial durante abordagem policial sem o aviso do direito ao silêncio contraria o disposto no artigo 5°, inciso LXIII, da Constituição Federal.
Toron apontou o avanço civilizatório que o STF pode promover ao interpretar a problemática sob à ótica da Constituição. “Não apenas na fase do interrogatório formal, mas desde o momento em que a pessoa, seja ela presa ou averiguada, é abordada pela polícia. Assim os policiais têm o dever de, desde o primeiro momento, advertir a pessoa do direito ao silêncio. Isso é muito importante porque alguns juízes se utilizam dessas confissões informais e, ao lado de outras provas, acabam utilizando isso para condenar. Com a proibição do interrogatório sem a prévia advertência, se garante um procedimento mais honesto, leal e condizente com a nossa Constituição”, afirma.
Aviso de Miranda
O direito que o cidadão preso ou apenas conduzido para averiguação tem de permanecer em silêncio, apesar de ainda suscitar debate jurisprudencial no Brasil, já está plenamente disciplinado nos Estados Unidos.
Conhecido no Brasil como Aviso de Miranda, o instituto originou-se no caso Miranda versus Arizona, em 1966, no qual a Suprema Corte dos Estados Unidos fixou tese sobre o direito constitucional ao silêncio.
O procurador de Justiça, mestre e doutor em Direito e presidente do Procon-SP, Fernando Capez, lembra que o direito do preso ao silêncio e à não autoincriminação decorre de nossa Constituição (artigo 5º, LXIII) e alcança não só o preso, mas toda pessoa submetida a interrogatório.
O STJ e o STF, em muitos casos, têm tratado essas confissões informais como causa de nulidade relativa em que é preciso comprovar prejuízo aos acusados.
Julgado recente da 2ª Turma do STF, todavia, interpreta a ausência do Aviso de Miranda no procedimento policial como causa de nulidade, nos termos do artigo 157 do Código de Processo Penal, com consequente destranhamento de todas as provas.
O relator da matéria na 2ª Turma, ministro Gilmar Mendes, apontou que um “interrogatório travestido de entrevista” viola o direito ao silêncio e o direito à não autoincriminação.
No caso concreto, um homem ajuizou reclamação no STF sob o argumento de que foi interrogado pelo delegado de polícia sem ter sido informado sobre o seu direito a permanecer em silêncio. Ele ainda teria sido coagido a passar a autoridade policial a senha do seu telefone celular.
Gilmar viu no procedimento policial clara afronta a determinação do STF no julgamento das ADPFs 395 e 444, em que a Corte decidiu pela impossibilidade de se conduzir coercitivamente os suspeitos de prática de crimes para interrogatório.
Para o ministro, a lógica adotada pelos agentes de segurança é muito simples e evidente: com a proibição da condução coercitiva, passa-se a fazer a colheita dos depoimentos na própria residência dos investigados, porém com os mesmos objetivos da medida proibida.
RE 1.177.984
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Rcl 33.711