CIÊNCIA & TECNOLOGIA
Aparelhos biônicos oferecem benefícios, mas trazem riscos e preocupações éticas
Qualquer implante gera risco – e nenhum aparelho atual consegue dar superpoderes reais a pessoas saudáveis.
Ética da biônica
Várias equipes ao redor do mundo estão trabalhando em dispositivos biônicos projetados para “otimizar” o sistema neural, a fim de melhorar nossa capacidade cognitiva, aprimorar nossa audição, nossa visão e outras capacidades.
Mas será que os benefícios na adoção desses dispositivos biônicos superam os riscos éticos e de saúde envolvidos?
Acontece que há uma desconexão entre o que as tecnologias biônicas podem realmente fornecer e as expectativas do público e dos pacientes.
“É muito importante dar à comunidade informações precisas sobre os riscos e benefícios de qualquer dispositivo médico e garantir que eles entendam o nível de terapia que um dispositivo biônico pode fornecer,” ressalta Rylie Green, professora de bioengenharia do Imperial College de Londres, que trabalha em biônica há mais de 20 anos.
Ela ressalta que, quando qualquer dispositivo é implantado no corpo, ele apresenta riscos significativos, além da própria cirurgia. Os danos ao corpo, mesmo com as melhores abordagens cirúrgicas, ainda fazem com que células morram, e não há garantia de que os tecidos em volta se recuperem totalmente.
“Embora possamos administrar terapias elétricas para ajudar um paciente, há impactos na fiação neural que ainda não entendemos,” ressalta Green. “É um grande risco intervir em qualquer sistema do corpo onde não haja nenhum problema, então a crescente conscientização do público sobre as novas tecnologias e a propaganda em torno do potencial para habilidades extraordinárias apresenta preocupações éticas”.Neurônios ciborgues prometem revolucionar a medicina bioeletrônica
Aparelhos médicos, não gerador de super-heróis
É muito simples, do ponto de vista da tecnologia, usar uma câmera infravermelha como um olho biônico para permitir que um usuário veja no escuro, exemplifica a pesquisadora.
Mas um dos menores problemas é que o nível de visão fornecido pelo dispositivo ainda é muito rudimentar. Os dispositivos de olho biônico atuais fornecem apenas cerca de 60 pontos de luz para renderizar uma imagem, onde o olho que vê normalmente usa mais de 90 milhões de células.
Portanto, a visão noturna seria igualmente rudimentar, nada parecido com um “superpoder” real.
Assim, o entusiasmo em torno do “trans-humanismo” e do “homem biônico” precisa ser moderado, levando-se em conta as falsas promessas, as promessas não totalmente compreendidas, os riscos e a compreensão do funcionamento dessas tecnologias como dispositivos médicos.
“Há muito potencial para o desenvolvimento de dispositivos que terão impactos significativos para os pacientes, permitindo-lhes superar as limitações de seus ferimentos ou doenças,” disse Green. “A próxima geração de biônicos dará aos pacientes melhores resultados, como visão de alta resolução, com milhares de pontos de luz em vez de menos de cem. E continuaremos a encontrar novas condições que podem ser tratadas por implantes biônicos, levando a novas terapias para pacientes.”
Também se espera que os implantes sejam melhor integrados ao corpo e se tornem mais seguros para uso.
Mas isto ainda são expectativas, e não realidades.
Assim, no futuro imediato, os dispositivos biônicos devem continuar sendo vistos como equipamentos de indicação médica para tratar condições específicas, e não como aparelhos para serem implantados em pessoas saudáveis em busca de habilidades extraordinárias, conclui a pesquisadora.