Educação & Cultura
Rotação por estações: como dinamizar as formações usando essa metodologia ativa
Para incentivar os educadores a replicá-la com a turma, dê oportunidade para que conheçam na prática a potência desse trabalho
“Os educadores sempre demonstravam interesse em usar metodologias ativas com seus estudantes, mas tinham muita dificuldade em transformar a teoria em prática”, conta Ana Claudia Cossini Martins, formadora de professores na Secretaria Estadual de Educação de São Paulo em José Bonifácio, sobre o motivo que a levou a formar os docentes usando a mesma abordagem que eles vão desenvolver com suas turmas.
Essa é a homologia de processos, que permite aos professores experimentar na prática as potências e os possíveis percalços de uma forma de trabalho que posteriormente vão desenvolver com os estudantes. “A formação é mais bem sucedida se o que os docentes estão aprendendo dialoga diretamente com a realidade, com a prática e as dificuldades que estão vivendo”, explica Sônia Guaraldo, doutora em Educação e coordenadora de implementação do Instituto Gesto.
Proporcionar essa vivência é especialmente importante em relação às metodologias ativas, já que muitos professores não tiveram a oportunidade de experimentá-las na escola ou na graduação. Elas vêm ganhando cada vez mais espaço nas escolas dado o engajamento e a qualidade da aprendizagem que proporcionam. “As metodologias ativas promovem o envolvimento genuíno. Mobilizam o corpo, o intelecto, as emoções, a relação com o outro, os saberes anteriores, o interesse em aprender e trazem o sentido de tudo isso na vida real”, diz Sônia.
A rotação por estações é um modelo de ensino híbrido bastante dinâmico, inspirado nos cantos diversificados da Educação Infantil. Ela consiste em preparar diferentes estações de aprendizagem, ao menos uma delas com algum recurso tecnológico. Os estudantes, ou, no caso de uma formação, os professores, rotacionam pelas estações, realizando em cada uma delas alguma tarefa diferente. No todo, as atividades se complementam. Podem ser jogos, debates, resenhas, estudos de caso ou pequenas construções, por exemplo. Além de favorecer que se aprenda de modos diversos sobre um mesmo tema, essa prática também permite abordar vários assuntos em um mesmo encontro, de forma coletiva e colaborativa.
Na formação de professores, a rotação por estações em si pode ser objeto de estudo direto ou uma oportunidade formativa sobre outro tema. Os educadores podem, por exemplo, estudar e desenvolver diferentes instrumentos de avaliação ou planos de aula em cada estação. Os grupos, ao circularem, desenvolvem a atividade proposta e podem (ou não) acrescentar novas reflexões e contribuições às produções dos colegas. No final, terão aprendido como funciona a metodologia, os diferentes tipos de avaliação ou contribuído com os planos dos colegas e ainda podem utilizar os materiais que criaram com as turmas.
Para garantir a qualidade do trabalho, é necessário uma etapa anterior, de muito planejamento, e uma sistematização ao final. “Não o formador, mas os professores precisam dizer o que e como aprenderam, como se sentiram fazendo a atividade, por que foi importante e o que poderia ser melhor. Isso vai ajudá-los a abstrair e depois recontextualizar a prática com consciência ao aplicar com os estudantes”, afirma Sônia.
Adaptações para contextos com baixa conectividade
A rotação por estações pressupõe o uso de pelo menos um recurso tecnológico integrado à internet, o que apoia no letramento digital e na coleta de evidências de aprendizagem que serão divididas com o grupo e analisadas pelo formador. Também facilita compartilhar os materiais de estudo com o grupo, para que possam revisitá-los sempre que necessário. Mas é possível fazer adaptações simples em casos de pouca disponibilidade de tais recursos e ainda obter excelentes resultados.
- – Com computador, tablet ou celular, mas internet lenta: Reserve um tempo antes da atividade iniciar para deixar vídeos e outras páginas carregando. No lugar de plataformas de construção de infográfico ou mapas mentais, que podem exigir mais dados, aposte nos documentos colaborativos, que requerem pouca internet mas também permitem o compartilhamento de ideias e a construção conjunta.
- – Com computador, tablet ou celular, mas sem acesso à internet: Se for possível, em outro ponto com acesso melhor à internet, baixe os vídeos, fotos, dados, textos e outros materiais e transfira para o aparelho por USB ou bluetooth. Use recursos do próprio aparelho já instalados, como o Word, PowerPoint ou Excel.
– Sem dispositivos tecnológicos: É possível transcrever trechos dos vídeos, imprimir os materiais, usar livros e fornecer cartolinas, canetinhas e outros materiais de papelaria para as construções coletivas do grupo.
Rotação por estações: experiências práticas
Para estudar diferentes tipos de avaliação, a formadora de educadores Ana Claudia, de José Bonifácio, promoveu uma rotação por estações com professores e coordenadores pedagógicos de várias áreas. Seu objetivo era que conhecessem as diferentes formas de observar o desenvolvimento dos estudantes e pudessem diversificar as avaliações que faziam com suas turmas.
A partir deste norte, ela planejou três estações. Uma com um texto na internet sobre avaliação processual e perguntas norteadoras para discussão do grupo. Outra com um texto e um vídeo sobre avaliação diagnóstica e propostas de reflexão sobre os conteúdos. E uma com texto e vídeo sobre avaliação somativa e questões para o grupo debater.
Ao final, refletiram sobre cada uma das estações e como diferentes avaliações poderiam contribuir para melhorar a qualidade da educação. “Os professores disseram que foi muito melhor e mais dinâmico do que se eu tivesse dado uma aula expositiva, porque eles puderam acessar os conteúdos de diferentes formas e trocar com os colegas”, relata Ana Claudia.
Em outra ocasião, a formadora desejava que os professores aprendessem sobre a metodologia de resolução de problemas em todas as áreas, não só em Ciências da Natureza e Matemática. Por isso, desmembrou esse grande objetivo em três estações. Em uma delas, os professores tinham que resolver um problema da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP) de nível 1 e pensar como ele poderia ser introduzido em sala de aula. Na outra, havia um estudo de caso: era preciso analisar a resolução de problemas de dois estudantes para entender onde estava o erro e pensar em intervenções que poderiam ser feitas. Por fim, havia um texto e um vídeo sobre metodologia de resolução de problemas e uma proposta de discussão.
Na hora de sistematizar, Ana Claudia convidou educadores que não eram da área de Ciências da Natureza e Matemática para resolver alguns problemas no quadro. Foi uma oportunidade de discutir sobre os diferentes caminhos para se chegar a um mesmo resultado e que aceitar o erro como parte do processo favorece que os estudantes mostrem como estão pensando e aprendendo. “Os professores disseram que gostaram, porque ficaram curiosos para saber o que tinha para fazer na próxima estação. Também já soube de educadores que passaram a desenvolver a rotação com suas turmas e tem dado bem certo”, conta a formadora.
Na EEEFM Alto Jatibocas, em Itarana, zona rural do Espírito Santo, a diretora e pedagoga Luzineti Marquez Coan criou uma rotação por estações para ensinar os professores a usar recursos digitais básicos. “Sem metodologias diferentes, nem mesmo o professor tem vontade de aprender”, afirma. Uma estação consistia em ler um texto e fazer um resumo no formato de infográfico sobre o que precisavam entender para dominar as plataformas. Na outra, após assistir a vídeos explicativos sobre as ferramentas, os professores gravavam pequenos tutoriais, úteis para formação entre os pares. A estação seguinte pedia o uso de comandos gerais, como copiar e colar, salvar o arquivo em PDF e inserir imagens no texto. A quarta demandava pesquisar e listar plataformas úteis, como as usadas para criar mapas mentais ou disponibilizar livros gratuitos.
“Na culminância, cada um falou sobre como foram as etapas para eles e contaram que descobriram por que os estudantes preferem fazer tudo no computador ao invés de usar o caderno – é muito mais fácil”, relata Luzineti.
Como planejar uma formação utilizando a rotação por estações
Desenvolver uma formação usando rotação por estações demanda bastante planejamento. Para começar, é preciso estabelecer os objetivos da formação, isto é, o que se deseja que o grupo saiba ou faça ao final do circuito. É possível tratar de temas diferentes em cada estação ou partir do princípio da tematização, em que os professores estudam uma mesma temática com vieses diferentes. Depois, cada estação precisa ser pensada cuidadosamente, começando pela seleção do material que vai servir para estudo, a atividade que os educadores vão realizar a partir disso, as ferramentas que serão disponibilizadas e o que os professores precisam demonstrar ao final para o formador saber que houve aprendizado.
“Além de planejar, o formador precisa estudar muito sobre o que são as metodologias ativas, o ensino híbrido e a rotação por estações para poder desenvolver o trabalho com qualidade”, destaca Luzineti. É importante que ao menos uma das estações conte com recursos tecnológicos e que cada estação seja independente da outra. Enquanto a rotação acontece, o papel do formador é circular pelas estações para observar as discussões e mediar as aprendizagens. Por fim, é necessário planejar como se dará a discussão final, que deve abordar as aprendizagens, dificuldades e dúvidas dos professores sobre o tema da formação, bem como uma avaliação da proposta de rotação por estações.
Confira um roteiro formativo com foco na utilização da rotação por estações com um grupo de professores:
BAIXE GRATUITAMENTE ROTEIRO FORMATIVO
Consultoria pedagógica: Aline Soares, educadora e formadora de professores.