Judiciário
STF fixa parâmetros para intervenção do Judiciário em políticas públicas
Decisões judicias devem apontar finalidades e respeitar espaço de discricionariedade do administrador
O Supremo Tribunal Federal (STF) fixou parâmetros para a intervenção do Judiciário em políticas públicas voltadas à realização de direitos fundamentais. Por maioria, os ministros julgaram que decisões judicias devem apontar finalidades e determinar que a administração pública apresente um plano para se chegar ao resultado. A posição foi firmada no RE 684.612, apreciado no plenário virtual entre 23 e 30 de junho.
O recurso foi interposto pelo município do Rio de Janeiro contra uma decisão do Tribunal de Justiça fluminense que havia determinado a realização de concurso público para médicos e funcionários técnicos do Hospital Municipal Salgado Filho e a correção de irregularidades apontadas em relatório do Conselho Regional de Medicina (CRM), com a fixação de prazo e multa pelo descumprimento. O relator foi Luis Felipe Salomão, então desembargador e hoje ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O recurso tem origem em uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) em que se apontou irregularidades de diversas naturezas no hospital destinado ao atendimento de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), como a ausência de vedação dos recipientes coletores de lixo, o cruzamento de material estéril com contaminado e a falta de manutenção e substituição de equipamentos.
O ministro Luís Roberto Barroso, seguido pela maioria, entendeu que diante da inércia administrativa não há como negar à Justiça algum grau de interferência. “Negar a possibilidade de atuação jurisdicional nessa matéria equivaleria a negar a própria efetividade do direito social constitucionalmente assegurado, retornando à ultrapassada ideia de que tais direitos seriam normas meramente programáticas ou principiológicas,” afirmou.
Para ele, contudo, decisões que determinam a implantação de melhorias em algum hospital específico e se distanciam de uma visão sistêmica contribuem para a desorganização da administração pública, comprometem a eficiência no atendimento ao cidadão e impedem a otimização das possibilidades estatais. Segundo Barroso, a atuação judicial deve respeitar o espaço de discricionariedade do administrador.
O ministro propôs, então, a fixação da seguinte tese:
- “A intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas voltadas à realização de direitos fundamentais, em caso de ausência ou deficiência grave do serviço, não viola o princípio da separação dos poderes.
- A decisão judicial, como regra, em lugar de determinar medidas pontuais, deve apontar as finalidades a serem alcançadas e determinar à administração pública que apresente um plano e/ou os meios adequados para alcançar o resultado.
- No caso de serviços de saúde, o déficit de profissionais pode ser suprido por concurso público ou, por exemplo, pelo remanejamento de recursos humanos e pela contratação de organizações sociais (OS) e organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP).”
Barroso também votou para anular o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) e determinar o retorno do processo à origem para um novo exame da matéria, conforme a situação atual do hospital e os parâmetros fixados pelo STF.
Votaram com ele os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Luiz Fux, Nunes Marques, Cármen Lúcia e Rosa Weber.
Ficaram vencidos o relator, ministro aposentado Ricardo Lewandowski, e o ministro Edson Fachin, que votaram pelo desprovimento do recurso do município, e os ministros Alexandre de Moraes e André Mendonça, que votaram para restabelecer a sentença de improcedência da ação civil pública.