Judiciário
Os agentes de contratação da Lei 14.133/2021 e a realidade nos municípios brasileiros
Em municípios com poucos servidores, em que pese a exigência do art. 8º da NLLC, seria possível designar servidor comissionado para agente de contratação?
INTRODUÇÃO
Trataremos nesta resenha sobre a figura do Agente de Contratação, sobre especificamente a problemática decorrente das diversas interpretações dos artigos art. 6.º, LX, 7º e 8º da Lei nº 14.133/2021 – Nova lei de Licitações e Contratos – NLLC. A relevância do estudo se dá devido ao impacto das diversas interpretações nos Municípios com quadro reduzido de servidores.
Os Princípios a serem observados na aplicação da NLLC vieram enumerados no art. 5º, dentre eles destacamos os princípios da Moralidade, Eficiência, Eficácia, Segregação de Funções, Segurança Jurídica, Proporcionalidade e Economicidade. Por sua vez, as exigências e vedações contidas no art. 7º e 8º trazem a necessidade da implementação da gestão de pessoas por competências para a efetivação dos Princípios da Eficiência e da Moralidade, pois deixam claro que as ações desempenhadas no processo licitatório serão realizadas, preferencialmente, por profissionais de carreira, com conhecimento técnico sobre as licitações e contratações públicas.
Especialmente porque a NLLC consagra o Princípio da Segregação de Funções, nos deparamos com a necessidade de nomeação de servidores distintos que atuarão ao longo do processo licitatório; a implementação das exigências trouxe um impacto considerável para Municípios que não possuem quantitativo suficiente de servidores para desempenharem as funções de Agente de Contratação.
Para além de questões principiológicas, estas questões pragmáticas também resgataram o debate sobre o caráter geral ou específico da norma: À União foi atribuída a competência para legislar normas gerais acerca de licitações e contratos, capazes de vincular toda a Administração Pública nacional, assim como normas específicas que, por sua vez, vinculam apenas a organização administrativa da União federal; assim, pergunta-se: a regra posta no art. 8º da NLLC possui natureza de norma geral ou específica?
Em razão da relevância do papel desempenhado pelos Agentes de Contratação na condução dos processos licitatórios, é oportuno o estudo acerca das possibilidades interpretativas dos dispositivos da NLLC que fixam o regime jurídico dos referidos agentes. Por certo não esgotaremos o tema, mas pretendemos aqui dispor acerca das várias clivagens que o recorte temático apresenta, de modo a auxiliar o gestor na tomada de decisão diante das perspectivas juridicamente possíveis.
A REGRA DO ART. 8º POSSUI NATUREZA DE NORMA GERAL
Consoante o disposto no art. 22, XXVII da CF/88, à União foi a atribuída a competência para legislar normas gerais acerca de licitações e contratos, em todas as modalidades, capazes de vincular toda a Administração Pública nacional, obedecido o disposto no art. 37, XXI, assim como normas específicas que, por sua vez, vinculam apenas a organização administrativa da União federal. A previsão constitucional nos obriga a separação das normas gerais das normas específicas a fim de que sejam caracterizadas as possibilidades de normatização para os Estados, Distrito Federal e Municípios.
Estados e municípios precisam regulamentar dentro de seus espaços normativos os tópicos da NLLC que não sejam normas gerais; o texto legal previu necessidade de dezenas de regulamentos, dezenas de matérias a serem normatizadas.
O papel desempenhado pelos Agentes de Contratação na condução dos processos licitatórios tem extrema relevância, sendo oportuno o estudo acerca das possibilidades interpretativas dos dispositivos da NLLC que fixam o regime jurídico dos referidos agentes. A nova Lei de licitações dispõe que as licitações serão conduzidas por um órgão singular ou unipessoal, um agente público denominado, em regra, Agente de Contratação; este Agente contará com o auxílio de uma equipe de apoio. Em determinadas situações, que não serão tratadas aqui, o Agente de Contratação poderá ou deverá ser substituído por uma Comissão de Contratação, um órgão colegiado.
A NLLC dispõe no art. 7º que o Agente Público indicado para atuação nos processos de licitações e contratação públicas deve, preferencialmente, ser servidor efetivo ou empregado público do quadro permanente da Administração Pública. Ainda, o agente público deve exercer atribuições relacionadas a licitações e contratos ou possuir formação compatível ou qualificação atestada por certificação profissional emitida por escola de governo criada e mantida pelo poder público.
Já com relação ao Agente de Contratação, objeto do nosso estudo, no art. 6º, LX e art. 8º a NLLC estipula que a licitação será conduzida por Agente de Contratação que será indicado pela autoridade competente, entre servidores efetivos ou empregados públicos pertencentes aos quadros permanentes da Administração Pública, para tomar decisões, acompanhar o trâmite da licitação, dar impulso ao procedimento licitatório e executar quaisquer outras atividades necessárias ao bom andamento da licitação .
À União foi atribuída a competência para legislar normas gerais acerca de licitações e contratos, capazes de vincular toda a Administração Pública nacional, assim como normas específicas que, por sua vez, vinculam apenas a organização administrativa da União federal; assim, pergunta-se: a regra posta no art. 8º da NLLC possui natureza de norma geral ou específica?
Alguns juristas se posicionam com o entendimento de ser a norma posta no art. 8º uma norma geral. Para estes, embora o inciso I do art. 7º se refira à designação preferencial de servidor efetivo, tem-se que, em relação aos agentes de contratação, a escolha de servidor efetivo não é preferencial, mas obrigatória, tendo em vista a expressa previsão do art. 6º, LX, e do art. 8º, norma geral.
Juristas da Equipe de Consultores Zênite, ao comentar sobre a incompatibilidade do exercício da atividade de agente de contratação com o “cargo em comissão”, explicaram que as normas específicas, que compõem a competência constitucional dos demais entes federativos em matéria de licitações e contratos estão vinculadas, a rigor, aos meros detalhamentos do modo pelo qual as normas gerais deverão ser cumpridas; não se tratando de uma competência que autorizaria os Estados, os Municípios e o Distrito Federal a atuar quando houver omissões nas normas gerais, ou ajustá-las às suas realidades institucionais.
Alertaram os juristas que a edição de normas gerais compõe competência privativa da União e só por ela pode ser exercida, o que vincula os demais entes federativos a observar seus termos. Não lhes pareceu possível deixar de reconhecer que a regra, na parte em que estabelece os requisitos que devem ser observados para que determinado servidor seja atribuído da função de Agente de Contratação, possua outra natureza que não a de “norma geral”.
A Equipe apontou a doutrina de José Anacleto Abduch Santos:
O agente de contratação enfeixa as competências anteriormente atribuídas pela Lei nº 8.666/1993 à comissão de licitações. O agente de contratações passa a ser órgão unipessoal detentor de competência para processar e julgar licitações. Esta função não é compatível com o regime dos cargos de provimento em comissão, uma vez que a Lei expressamente determina que será designado entre servidores efetivos ou empregados públicos do quadro permanente da Administração Pública. Há uma evidente semelhança entre a figura jurídica do agente de contratação e a do pregoeiro, a ponto de a Lei fixar que o agente de contratação, tal qual o pregoeiro no regime da Lei nº 10.520/2002, será auxiliado por equipe de apoio (§ 1º). Compete ao agente de contratações: tomar decisões, acompanhar o trâmite da licitação, dar impulso ao procedimento licitatório e executar quaisquer outras atividades necessárias ao bom andamento do certame até a homologação(art. 6º, LV) no caso de licitações destinadas à contratação de bens, serviços, inclusive de engenharia, que não sejam processadas pela modalidade de pregão. A Lei nº 14.133/2021 preservou a figura do pregoeiro e preceitua que “em licitação na modalidade pregão, o agente responsável pela condução do certame será designado pregoeiro (art. 8º, § 5º).
Neste mesmo sentido se manifestando o entendimento de Edite Hupsel:
Muito bem-vinda é a criação da figura do ‘agente de contratação’, encarnada por servidores efetivos ou empregados públicos pertencentes ao quadro permanente da Administração – menos vulneráveis às pressões de agentes superiores e de agentes políticos em face à não precariedade de seus vínculos
– designados pela autoridade competente para tomar decisões e impulsionar o procedimento licitatório.
Concluíram os juristas consultores da Equipe Zenite que a regra do art. 8º, quando restringe o acesso à função de agente de contratação apenas aos sujeitos que integrem os quadros efetivos da Administração Pública, constitui uma norma geral e, nessa qualidade, não pode ser alterada por meio da edição de normas específicas acerca do tema, as quais poderiam ter sua constitucionalidade colocada em xeque.
O regime jurídico aplicável aos servidores públicos, sua organização a partir de cargos empregos e funções públicas de provimento efetivo e em comissão, foi definido pela Constituição Federal – CR/88 de modo a abranger toda a Administração Pública brasileira, ou seja, a Constituição Federal estabelece o regime segundo o qual os cargos empregos e funções públicas em geral poderão ser providos em regime efetivo ou em regime comissionado, sem qualquer espaço para que a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal o excepcionem e criem formas de provimento distinto no âmbito de suas respectivas esferas de influência.
Assim, cabe a cada unidade federativa criar e distribuir de forma específica cargos, atribuições, etc. que se revelarem necessários ao pleno atendimento das suas necessidades, observando-se que o provimento dos agentes públicos deverá se dar por uma das formas estabelecidas na Constituição. Cabe a unidade federativa também observar quais funções poderão ser atribuídas aos cargos de provimento efetivo e aos cargos de provimento em comissão, observando-se sempre os limites definidos para cada qual pela própria Constituição. A regra geral é que se criem cargos de provimento efetivo, limitando-se os cargos de provimento em comissão somente para as atribuições de direção, chefia e assessoramento (art. 37, V, da CR/88).
Eu entendo que a NLLC, ao estabelecer que a função de Agente de Contratação deve ser exercida por um agente que possua relação funcional permanente com a Administração, detentor de cargo de provimento efetivo ou de emprego permanente, apenas reconhece que as atribuições relativas ao processamento das licitações são incompatíveis com as funções de chefia, assessoramento e direção, que são típicas dos cargos de provimento em comissão.
Neste sentido, o jurista Rodrigo Vissotto Junkes aponta:
Haveria ofensa à liberdade administrativa de que gozam os Estados, os Municípios e o Distrito Federal, e consequentemente o extrapolamento da competência assegurada à União para legislar normas gerais sobre licitações e contratos, se a Lei nº 14.133/2021 impusesse que a atribuição de agente de contratação deveria ser dirigida a um agente público de provimento efetivo titular de um determinado cargo técnico ou administrativo. Uma coisa é partir do regime funcional estabelecido na Constituição, que vincula todas as esferas de poder, e afirmar que as atribuições dos agentes de contratação são incompatíveis com cargos em comissão, o que parece perfeitamente compatível com o regime constitucional de competências e de liberdade administrativa. Outra, muito distinta, é invadir a organização administrativa de cada ente federativo e dizer que, entre os cargos empregos e funções que integram o quadro funcional, esse ou aquele cargo poderá ser designado agente de contratação, hipótese que revelaria ofensa clara à autonomia administrativa que milita em seu favor.
Esclarece Junkes que o art. 8º da Lei nº 14.133/2021 não invadiu a competência específica das demais unidades federativas, nem ofendeu a autonomia administrativa dos demais entes federativos ao impor que a função de agente de contratação deve ser atribuída a agentes detentores de cargos de provimento efetivo ou detentores de empregos permanentes, porque o que ela fez foi afirmar que as competências a serem atribuídas ao agente de contratação são incompatíveis com aquelas que podem ser exercidas em comissão. Ainda, que a escolha de qual será o cargo de provimento efeito que será designado agente de contratação, é incumbência de cada ente federativo.
A REGRA DO ART. 8º NÃO POSSUI NATUREZA DE NORMA GERAL
Como contextualizado anteriormente, à União foi atribuída a competência para legislar normas gerais acerca de licitações e contratos, capazes de vincular toda a Administração Pública nacional, assim como normas específicas que, por sua vez, vinculam apenas a organização administrativa da União federal. À pergunta se a regra posta no art. 8º da NLLC possui natureza de norma geral ou específica, muitos juristas respondem que não.
Muitos juristas afirmam que a regra posta no art. 8° da NLLC possui natureza de norma específica, sendo aplicável apenas no âmbito da União Federal. Entendem que a aplicação do art. 8º às demais pessoas jurídicas de direito público interno resultaria em uma indevida intervenção da União liberdade de organização administrativa assegurado pela própria Constituição a cada uma das unidades federadas.
Se a regra do art. 8º da Lei nº 14.133/2021 não possui natureza de norma geral, ela seria aplicável apenas e tão somente no âmbito da União Federal. Quando a regra limita a designação do Agente de Contratação apenas aos detentores de cargos de provimento efetivo ou de empregos permanentes, ela não se aplica aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal, os quais poderiam, no seu específico âmbito legislarem normas específicas, disciplinando regra distinta acerca do tema.
Rafael Carvalho Rezende Oliveira, jurista defensor deste posicionamento, esclarece:
É inerente à autonomia federativa a prerrogativa de cada Ente federado decidir sobre os regimes jurídicos dos servidores que exercerão as funções dos agentes de contratação. Nesse sentido, alguns Municípios já editaram regulamentações específicas que indicam a possibilidade de indicação de servidores comissionados para o exercício da função do agente de contratação, não obstante a preferência seja pela indicação de servidores efetivos. Aliás, a discussão sobre a possibilidade de indicação de servidores comissionados para a função de agente de contratação deve ficar restrita aos comissionados que são estranhos aos quadros da Administração Pública, uma vez que a indicação de servidores efetivos para cargos comissionados, com atribuições para o exercício das funções de agente de contratação, estaria em consonância com a literalidade do art. 8º da NLLC.
Pondera Oliveira que é verdade que o desempenho da função por servidores estatutários, ocupantes de cargo efetivos, garantiria maior independência ao agente de contratação e segurança jurídica aos participantes dos certames, sendo justificada a preferência na indicação desses servidores. Entretanto, em situações excepcionais, quando justificada a impossibilidade de indicação de servidores efetivos, os Entes federados poderiam estabelecer, em seus respectivos atos normativos, a possibilidade de indicação excepcional de servidores comissionados para atuarem como agentes de contratação. Oliveira exemplifica o seu entendimento colecionando aportes legais dos Municípios de São Paulo-SP e Niterói-RJ:
No Município de São Paulo, o art. 3.º, § 3.º, do Decreto 62.100/2022 do Município de São Paulo dispõe que “o agente de contratação, o pregoeiro e os membros da comissão de contratação serão selecionados preferencialmente dentre servidores públicos efetivos ou empregados públicos do quadro permanente.” De forma similar, o art. 4º, § 4º, do Decreto 14.730/2023 do Município de Niterói, prevê “Art. 4º As licitações e procedimentos auxiliares realizados no âmbito da Administração Municipal deverão ser conduzidos preferencialmente por servidor efetivo ou empregado público dos quadros permanentes da Administração Pública, designado agente de contratação. (…) § 3º Na ausência de servidor ocupante de cargo efetivo ou empregado público dos quadros permanentes da Administração Pública, a autoridade máxima do órgão poderá designar ocupante de cargo em comissão ou emprego de confiança, desde que devidamente justificada a escolha e comprovada sua formação compatível, qualificação atestada por certificação profissional emitida por escola de governo e mantida pelo poder público, ou notória experiência em licitações e contratações públicas. § 4º O exercício da faculdade prevista no §3º deste artigo deverá ser motivada e estar acompanhada da demonstração de medidas a serem adotadas para seu saneamento, o que deverá ser demonstrado de maneira progressiva a cada exercício. § 5º Para o atendimento do §4º deste artigo, em cada exercício deverá ser demonstrada a inviabilidade de se nomear servidor efetivo ou empregado de quadro permanente, bem como a evolução das medidas administrativas para adequação integral a este decreto.”
Muitas constituições estaduais e algumas leis orgânicas municipais trazem, em seus textos, comando no sentido de que o estado ou o Município legisle sobre licitações e contratações públicas, observadas as normas gerais estabelecidas pela União. Havendo espaço para esses legisladores estaduais, distrital e municipais disciplinarem a matéria, observando o quadro traçado pelas normas gerais editadas pela União, eles podem e devem fazê-lo, confirmando suas autonomias.
Cabe a eles, e aqui tratamos especificamente dos Municípios, repetir os dispositivos da Lei nacional que entendam que sejam pertinentes e convenientes que constem nas leis locais. Acréscimos podem ser feitos, considerando as peculiaridades locais e para introduzir inovações e matérias que não constaram na lei nacional. Também algumas lacunas podem vir a ser preenchidas, buscando trazer segurança e inovações em assuntos importantes.
SOLUÇÕES POSSÍVEIS
Segundo Edite Hupsel, é inconcebível aceitar-se que tudo que consta na nova lei, legislado e regulado inteiramente pela União, seja norma geral obrigatória para todas as entidades federadas:
Cada uma das pessoas jurídicas de Direito Público com capacidade política pode legislar sobre licitações e contratos. Não vemos como possível uma nova compreensão da expressão “normas gerais de licitação” que venha a amesquinhar o sistema federativo nacional e afastar a competência dos demais entes federados para legislar sobre a matéria. A ampliação do conceito de normas gerais não pode trazer essas consequências. Nenhum problema existe para que as diversas entidades exerçam suas competências assentadas na Constituição da República, mesmo porque a Lei no 14.133/2021 não é a solução para todos os problemas.
Assim, nesse diapasão, podem essas pessoas políticas, em suas leis locais, repetir artigos da lei nacional; introduzir novidades e especificidades locais e suprir falhas encontradas no diploma de âmbito nacional.
Somos um país continental com 5570 Municípios e aproximadamente 2/3 deles (3520) são Municípios que têm população abaixo de 20.000 habitantes. Tais Municípios estão obrigados a licitar, da mesma forma que os grandes Municípios, Estados e União, todavia apresentam condições e recursos por vezes limitados. Para o aperfeiçoamento de suas contratações e a correta implementação da NLLC os Municípios menores precisam rever seus recursos e se organizar. Uma das necessidades imediatas que se mostram é a implantação de uma gestão por competências e, principalmente, a adequada profissionalização do Agente Público e do Agente de Contratação.
A problemática que se colocou nesta Resenha , a situação das pequenas unidades administrativas, com estrutura enxuta, sem número suficiente de servidores, em que pese a exigência do art. 8º da NLLC, seria possível designar servidor comissionado para agente de contratação?
Entendo que a Lei nº 14.133/2021 impõe que a Administração observe critérios de boa governança, promova a gestão por competências, e observe tanto quanto possível a Segregação de Funções. Para cumprir tais encargos, observando os Princípios enumerados no art. 5º, a Administração deve avaliar em termos concretos e realísticos a força de trabalho que dispõe para atuar em contratação pública, designando para atuar em cada especial função os agentes que demonstrarem maior aptidão para o seu desempenho e, caso não os tenha em número suficiente, providenciar as capacitações e qualificações necessárias.
Não penso ser o caso de afastar a obrigatoriedade ínsita na regra do art. 8° da NLLC, pois isso seria desvirtuar a finalidade da Lei. Para Junkes, aceitar a tese de que a norma do art. 8º não obriga Estados, Municípios e o Distrito Federal é
um grande convite a manter as coisas do jeito que sempre foram, de forma a impedir que o propósito rejuvenescedor da nova Lei, no que toca à profissionalização das suas estruturas de contratação, efetivamente ocorra. Em último caso, a Administração permaneceria praticando os mesmos atos e a mesma cultura burocrática, substituindo os velhos nomes do passado por designações mais “modernas”.
Entretanto, o autor não é insensível aos ditames da realidade da maioria dos Municípios brasileiros, ele pondera:
Devo dizer, ao final, que não sou insensível à realidade da imensa maioria dos ambientes administrativos que sequer possuem meios de, atualmente, dar cumprimento à regra legal. Mas a pior forma de resolver o problema é contrapondo-se à mudança, buscando a manutenção do estado atual das coisas. Isso sim, na minha opinião, faria com que os velhos problemas do passado permanecessem no futuro, cambiando, quando muito, seus nomes. A solução para o problema criado pela realidade deve ser gerido dentro de rigorosos padrões de bom senso e razoabilidade. A Administração deverá mapear o pessoal que pode aplicar na condição de contratações públicas e, a partir disso, definir limites reais da intensidade na qual a regra do art. 8ºpode ser cumprida na atualidade, aplicando ao caso a conhecida noção de reserva do possível. Mas essa impossibilidade atual de cumprir a lei, por sua vez, não poderá ser eternizada. Caberá à Administração discutir e estabelecer um plano de metas para, a médio prazo, solucionar o impasse.
A norma prevista no art. 11, parágrafo único da NLLC estabelece que a alta administração do órgão ou entidade é responsável pela governança das contratações e deve implementar processos e estruturas, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos estabelecidos e promover um ambiente íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações. Por “Alta Administração” entende-se os gestores que integram o nível executivo do órgão ou da entidade, com poderes para estabelecer as políticas, os objetivos e conduzir a implementação da estratégia para cumprir a missão da organização, ou seja, aqueles a quem incumbe a prática de atos de gestão administrativa no plano da alta hierarquia administrativa.
um grande convite a manter as coisas do jeito que sempre foram, de forma a impedir que o propósito rejuvenescedor da nova Lei, no que toca à profissionalização das suas estruturas de contratação, efetivamente ocorra. Em último caso, a Administração permaneceria praticando os mesmos atos e a mesma cultura burocrática, substituindo os velhos nomes do passado por designações mais “modernas”.
Entretanto, o autor não é insensível aos ditames da realidade da maioria dos Municípios brasileiros, ele pondera:
Devo dizer, ao final, que não sou insensível à realidade da imensa maioria dos ambientes administrativos que sequer possuem meios de, atualmente, dar cumprimento à regra legal. Mas a pior forma de resolver o problema é contrapondo-se à mudança, buscando a manutenção do estado atual das coisas. Isso sim, na minha opinião, faria com que os velhos problemas do passado permanecessem no futuro, cambiando, quando muito, seus nomes. A solução para o problema criado pela realidade deve ser gerido dentro de rigorosos padrões de bom senso e razoabilidade. A Administração deverá mapear o pessoal que pode aplicar na condição de contratações públicas e, a partir disso, definir limites reais da intensidade na qual a regra do art. 8ºpode ser cumprida na atualidade, aplicando ao caso a conhecida noção de reserva do possível. Mas essa impossibilidade atual de cumprir a lei, por sua vez, não poderá ser eternizada. Caberá à Administração discutir e estabelecer um plano de metas para, a médio prazo, solucionar o impasse.
A norma prevista no art. 11, parágrafo único da NLLC estabelece que a alta administração do órgão ou entidade é responsável pela governança das contratações e deve implementar processos e estruturas, para avaliar, direcionar e monitorar os processos licitatórios e os respectivos contratos, com o intuito de alcançar os objetivos estabelecidos e promover um ambiente íntegro e confiável, assegurar o alinhamento das contratações ao planejamento estratégico e às leis orçamentárias e promover eficiência, efetividade e eficácia em suas contratações. Por “Alta Administração” entende-se os gestores que integram o nível executivo do órgão ou da entidade, com poderes para estabelecer as políticas, os objetivos e conduzir a implementação da estratégia para cumprir a missão da organização, ou seja, aqueles a quem incumbe a prática de atos de gestão administrativa no plano da alta hierarquia administrativa.
No plano da responsabilidade, a Lei fixou para a alta administração o dever jurídico de adotar todas as providências necessárias para a implementação e aplicação da nova Lei na organização pública. Segundo José Anacleto Abduch Santos, o descumprimento deste dever jurídico caracterizará conduta de omissão própria. A omissão própria é caracterizada quando existe uma conduta determinada pela norma e esta conduta não é cumprida quando poderia ter sido; aa omissão própria é responsabilizável.
Ressalta o Autor que as providências adotadas deverão atender os princípios da eficiência, da eficácia, da celeridade, da proporcionalidade e da economicidade. Ele conclui que:
este dever jurídico de adotar providências administrativas para a aplicação da nova Lei de Licitações não será cumprido se tais ditas providências não forem adotadas com o cumprimento do dever objetivo de cuidado. A falta de cumprimento do dever objetivo de cuidado se materializa pela prática de condutas negligentes, imprudentes ou imperitas – elementos da conduta culposa. Em outros termos, não basta a adoção de providências insuficientes e destituídas de rigor técnico para afastar a culpa, e, por decorrência, a responsabilidade. Assim, pode-se deduzir da Lei que (i) deixar de adotar imediatamente as providências necessárias para a aplicação da nova Lei, ou, (ii) adotar providências insuficientes ou inadequadas, caracterizará o famigerado erro grosseiro (conduta maculada por grave negligência, grave imprudência ou grave imperícia) que atrai a responsabilização pessoal do gestor, nos termos do disposto no art. 28 do Decreto-Lei nº 4.657/1942 e do art. 5º da Lei nº 14.133/2021.
Santos informa que a responsabilização pode ser evitada, ele recomenda adotar imediatamente as providências necessárias para a aplicação da nova Lei de Licitações.
Situações como essa nos permitem observar as diretrizes indicadas nos artigos 20 e 22 da Lei nº 13.655/2018, que alterou a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro:
Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.
Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.
(…)
Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.
§ 1º Em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente”.
Com relação a regra posta no art. 8º da NLLC, não pode ser descartada eventual necessidade de flexibilizar entendimento mais restritivo, haja vista a realidade de quadros administrativos extremamente enxutos, quando inviável adotar solução diferente.
O Legislador ressaltou as disposições constantes na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB que integram, para todos os fins, o regramento principiológico da nova Lei de licitações e contratações. Há a preocupação com que as decisões levem em consideração as dificuldades reais nas circunstâncias práticas no caso de alguma regra de gestão pública for descumprida.
Do exposto, eu concluo que, com o permissivo e as considerações postas na LINDB, diante da realidade de sua estrutura funcional, não havendo servidores efetivos capacitados e qualificados para o exercício das atribuições de Agentes de Contratação, a Administração pode justificar, em caráter excepcional, pontual e temporário, a designação de servidores ocupantes exclusivamente de cargos em comissão. Todavia, as demais ações que podem englobar a realização de concursos públicos, plano de capacitação e qualificação de servidores e todos as regulamentações normativas exigidas pela NLLC devem estar sendo concomitantemente providenciadas.
REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO
HUPSEL, Edite. Lei nº 14.133 de 2021 – A nova Lei de licitações – Inovações e desafios, Zênite Fácil, categoria Doutrina, 20 abr. 2021. Disponível em: https://zenite.blog.br/lei-no-14-133-de-2021-a-nova-lei-de-licitacoes-%e2%88%92-inovacoes-e-desafios/. Acesso em: 19.04.2023.
HUPSEL, Edite. Normas gerais na Lei nº 14.133/2021 e as competências dos Estados, Municípios e Distrito Federal, Zênite Fácil, categoria Doutrina, 25 mai. 2021. Disponível em: https://zenite.blog.br/normas-gerais-na-lei-no-14-133-2021-e-as-competencias-dos-estados-municipios-e-distrito-federal/ . Acesso em: 19.04.2023.
JUNKES, Rodrigo Vissotto. Afinal, quem pode ser designado agente de contratação na Lei nº 14.133/2021? Zênite Fácil, categoria Doutrina, 10 mar. 2023 Disponível em: https://zenite.blog.br/afinal-quem-pode-ser-designado-agente-de-contratacao-na-lei-no-14-133-2021/ . Acesso em: 19.04.2023
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Agentes de contratação na nova lei de licitações. https://www.migalhas.com.br/depeso/385526/agentes-de-contratacao-na-nova-lei-de-licitacoes. quinta-feira, 27 de abril de 2023.
SANTOS. José Anacleto Abduch “Virada de chave” para a nova Lei de Licitações: qual a responsabilidade do gestor público? Disponível em https://zenite.blog.br/virada-de-chave-para-a-nova-lei-de-licitacoes-qual-a-responsabilidade-do-gestor-publico/. Acesso em 19.04.2023.
Nova Lei de Licitações: designação do agente de contratação. Zênite Fácil, categoria Orientação Prática, 18 fev. 2023. Disponível em:http://www.zenitefacil.com.br. Acesso em: 19.04.2023
Sobre a autora
Possui graduação em Direito pela Universidade Paranaense (1999), UNIPAR – CEUT, Toledo/PR. Possui pós-graduação lato sensu em Filosofia do Direito pela (2003-2004), UNIOESTE, Toledo/PR; Mestrado em Educação (2006-2008), UFMT – IE, Cuiabá/MT. Atua no magistério superior nas áreas de ciências humanas e sociais (Direito, Letras, Administração e Ciências Contábeis), engenharias (engenharia de produção); especificamente nas disciplinas afetas ao Curso de Direito como Filosofia do Direito, Hermenêutica Jurídica, Sociologia Jurídica, Antropologia Jurídica, Ética, Metodologia científica, Metodologia da Pesquisa e orienta Trabalhos de Conclusão de Curso. Fez parte, como professor consultor, do Núcleo Docente Estruturante dos Cursos de Direito, Ciencias Contábeis e Administração da Faculdade Arnaldo Horácio Ferreira, Luis Eduardo Magalhães- BA. Faz parte, como professor consultor, do Núcleo Docente Estruturante do Curso de Direito da Faculdade UNYAHNA – Barreiras-BA. Foi Coordenadora do Curso de Direito na Faculdade UNYAHNA – Barreiras-BA, foi Coordenadora do Programa de Iniciação Científica Unyahna – IESUB. Foi Coordenadora do Curso de Direito na UNIRB – Faculdade Regional da Bahia, em Salvador. Atualmente trabalha nas áreas de Licitações, Controle Interno e Serviços Públicos como Oficial Legislativo na Câmara Municipal de Maripá – Paraná.
Fonte: JUS