Saúde
Condição rara faz pacientes verem pessoas como demoníacas
Imagens geradas por computador das distorções de um rosto masculino (acima) e de um rosto feminino, conforme percebidas pelo paciente
Prosopometamorfopsia
Imagine ver o rosto das pessoas totalmente distorcido, com a aparência que os artistas normalmente reservam para representar os demônios.
Isto de fato acontece para quem tem uma condição muito rara, conhecida como prosopometamorfopsia (PMO), que faz com que as características faciais pareçam distorcidas.
“Prosopo” vem da palavra grega para rosto (prosopon), enquanto “metamorfopsia” se refere a distorções perceptivas. Os sintomas variam de caso para caso e podem afetar a forma, o tamanho, a cor e a posição das características faciais.
Há muito poucos casos dessa condição, mas ela não parece ser permanente: Já foram registrados casos de PMO com duração de dias, semanas e anos. Embora a origem da condição também não seja conhecida, ela parece envolver apenas uma parte do sistema visual.
O brasileiro Antônio Mello, formado pela Universidade Federal do Ceará, e atualmente trabalhando da Universidade Dartmouth (Reino Unido), conseguiu agora estudar um desses casos, publicando a primeira pesquisa científica a fornecer visualizações precisas e fotorrealísticas das distorções faciais experimentadas por um indivíduo com PMO.
Estudo da prosopometamorfopsia
O paciente, um homem de 58 anos, vê rostos sem quaisquer distorções quando olha para eles em uma tela e em uma fotografia impressa, mas vê os rostos distorcidos, que parecem “demoníacos”, quando os vê pessoalmente. A maioria dos casos de PMO, entretanto, vê distorções em todos os contextos, portanto seu caso é especialmente raro e apresentou uma oportunidade única de descrever com precisão as distorções percebidas.
A equipe então colocou o voluntário frente a uma pessoa e a uma foto dessa mesma pessoa, o que lhes permitiu obter um feedback em tempo real do paciente sobre como o rosto na tela e o rosto real à sua frente diferiam. Para isso, eles foram modificando a fotografia usando um software para gerar as distorções percebidas pelo paciente.
“Em outros estudos sobre a doença, os pacientes com PMO não conseguem avaliar com que precisão a visualização de suas distorções representa o que eles veem, porque a visualização em si também representa um rosto, então os pacientes também perceberão distorções nele,” justificou Antônio Mello. Isto não aconteceu agora porque o paciente só vê as distorções ao vivo, mas não na tela.
Dificuldade no diagnóstico
A equipe destaca que alguns dos participantes em experimentos sobre PMO consultaram profissionais de saúde que queriam ajudar, mas não souberam diagnosticar a prosopometamorfopsia.
“Ouvimos de várias pessoas com PMO que foram diagnosticadas por psiquiatras como tendo esquizofrenia e tomaram antipsicóticos, quando sua condição é um problema no sistema visual,” contou o professor Brad Duchaine.
“E não é incomum que as pessoas que têm PMO não contem aos outros sobre o seu problema com a percepção facial porque temem que os outros pensem que as distorções são um sinal de um distúrbio psiquiátrico. É um problema que muitas vezes as pessoas não entendem,” finalizou o pesquisador.