Internacional
OMS pede mais dados sobre impacto da mudança climática em doenças tropicais
Análise de 42.693 artigos revelou que não existe ainda uma compreensão adequada sobre expansão de vetores de enfermidades e impactos em países mais pobres; agência da ONU aponta aumento de incidência de malária, dengue e da chikungunya, mas alerta que faltam estudos sobre mitigação dos riscos e adaptação
Nesta quarta-feira, a Organização Mundial da Saúde, OMS, revelou que ainda não existe uma compreensão adequada dos impactos reais e potenciais que a alterações climáticas induzidas pelos humanos podem ter na incidência de malária e Doenças Tropicais Negligenciadas, DTN.
Uma análise de 42.693 artigos indicou que é necessária uma “modelização mais abrangente, colaborativa e padronizada” para que seja possível compreender e prever melhor os efeitos das alterações no clima.
Expansão do alcance da malária, dengue e chikungunya
De acordo com o diretor do Programa Global de DTN da OMS, Ibrahima Socé Fall, que liderou o estudo, “é provável que a transmissão da malária se desloque tanto para os polos como para altitudes mais elevadas”.
Ele citou ainda previsões de que o mosquito vetor responsável pela transmissão da dengue e da chikungunya continue expandindo seu alcance. Para o especialista, esta revisão revela tendências alarmantes e é um “apelo à ação urgente”.
À medida que a gama geográfica de vetores de doenças, como os mosquitos, se expande, também aumenta o risco de introdução, ou reintrodução, destas doenças em áreas novas e não preparadas.
Para a OMS, as conclusões desta revisão realçam que estas mudanças na prevalência, incidência, alcance e intensidade da malária e de uma série de DTN podem ser sentidas com maior intensidade nas comunidades já desproporcionalmente afetadas por elas.
Um profissional de saúde fumiga uma casa em Guayaramerín, Bolívia, para protegê-la contra doenças transmitidas por mosquitos
Impacto desproporcional nos mais pobres
Apesar disso, o levantamento da agência destaca que muitas pesquisas publicadas se concentraram em países com baixa carga da doença e com amplo acesso a cuidados de saúde de qualidade.
O diretor do Programa Global da Malária da OMS, Daniel Madandi, apelou por uma resposta “mais equitativa, abrangente e sustentável” ao impacto das alterações climáticas, tendo em vista que ele será “suportado de forma desproporcional pelas pessoas mais pobres”.
Segundo ele, fenômenos meteorológicos extremos recentes tiveram consequências na malária e a previsão é que este tipo de evento ocorra com mais frequência.
O levantamento da OMS revela que apenas 34% dos estudos revisados abordam estratégias de mitigação e 5% abordam métodos de adaptação. Para a agência, este levantamento destaca ainda mais a falta de evidências necessárias para proteger os ganhos obtidos contra a malária e as DTN nas últimas décadas.
Doenças pouco estudadas
No total, foram analisados 42.693 artigos. Os investigadores correlacionaram o número de publicações com a carga nacional de doenças, o Índice de Acesso de Qualidade aos Cuidados de Saúde e as pontuações de vulnerabilidade climática.
Dos 511 artigos que atenderam aos critérios de inclusão, 185 abordaram a malária, 181 enfocaram dengue e chikungunya e 53 relataram resultados sobre leishmaniose. Outras DTN, no entanto, estavam significativamente sub-representadas, não tendo sido suficientemente estudadas.
A forma como o aumento das temperaturas e a mudança dos padrões climáticos estão alterando a propagação de doenças transmitidas por vetores é uma das preocupações da OMS, devido às implicações significativas para a saúde humana e à pressão adicional que pode ser colocada nos sistemas mais frágeis.
O estudo foi realizado pelo Grupo de Trabalho da OMS sobre Alterações Climáticas, Doenças Tropicais Negligenciadas e Malária, em parceria com Reaching the Last Mile, RLM, e foi publicado na revista científica Transactions of the Royal Society of Tropical Medicine e Higiene.