Internacional
ONU alerta para crise agrícola e insegurança alimentar grave na Faixa de Gaza
Dados apontam que metade das terras agrícolas foram danificadas; produção local de alimentos está quase interrompida, agravando situação humanitária; restrições de acesso dificultam a entrega de ajuda
Com 96% da população da Faixa de Gaza em insegurança alimentar aguda e quase meio milhão de pessoas em condições catastróficas, a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, FAO, aponta um aumento contínuo de terras agrícolas danificadas.
Uma análise de dados de satélite, publicada nesta quarta-feira, revela que mais da metade das terras de Gaza foram atingidas, ou mais de 57%, em maio de 2024.
Operação militar e o ataque de Israel em Gaza ficam registrados como “os mais longos, maiores e mais sangrentos desde 1948”
Produção local de alimentos em risco
Segundo a FAO, a agricultura na Faixa de Gaza representa mais de 40% da área de superfície e contribui com até 30% do consumo diário. Os danos causados ao setor agrícola levam a produção local de alimentos a uma interrupção quase total, diminuindo o acesso da população a itens alimentares essenciais.
Dessas terras danificadas, aproximadamente 61% são pomares, 19% são hortaliças e 20% são cereais. Esse nível de danos às terras agrícolas é altamente preocupante, com um aumento de 33% nas terras danificadas desde janeiro de 2024.
Os meios de subsistência de agricultores, pastores e pescadores vulneráveis sofreram um impacto significativo, o que representa sérios problemas para a recuperação futura.
As famílias com alta dependência da agricultura sofreram perdas de renda de até 72%. O porto da Cidade de Gaza foi gravemente danificado, com a maioria dos barcos de pesca destruídos.
Os estoques de animais estão sofrendo um declínio acentuado. Uma grande parte dos animais de produção de carne e laticínios em Gaza foi abatida, consumida ou perdida devido ao conflito.
Questão humanitária
A Unrwa aponta que o alto risco de fome permanece enquanto o conflito continuar e o acesso humanitário for restrito. A agência da ONU continua sendo uma das maiores fornecedoras de alimentos na Faixa de Gaza, com quase 1,9 milhão de pessoas beneficiadas com farinha ou pacotes de alimentos.
As restrições de acesso continuam a prejudicar seriamente a entrega de assistência e serviços humanitários essenciais em Gaza. Entre 1º e 23 de junho, outras missões não aconteceram ou não foram realizadas conforme o planejado.
Das 86 operações coordenadas de assistência humanitária planejadas para o norte de Gaza, 49% foram facilitadas pelas autoridades israelenses. As restantes tiveram o acesso negado, foram impedidas ou canceladas por motivos logísticos, operacionais ou de segurança.
Em Gaza, cerca de 80% das mulheres dependem de assistência alimentar
Violência contínua
A Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos, Unrwa, afirmou que os ataques das forças israelenses continuam, com bombardeios aéreos, terrestres e marítimos em toda a Faixa de Gaza.
Segundo a entidade, a violência resulta em mais vítimas civis, deslocamento e destruição de estruturas residenciais e infraestrutura civil. Os ataques aéreos têm sido especialmente intensos na região central de Gaza, na área central do enclave.
A ofensiva terrestre das forças israelenses continua a se expandir, principalmente nas regiões sul da Cidade de Gaza e leste de Rafah, aprofundando a crise humanitária e desestabilizando significativamente os fluxos de ajuda humanitária.
A operação militar israelense em andamento em Rafah está afetando diretamente a capacidade das agências de ajuda de levar suprimentos humanitários essenciais para Gaza.
De acordo com o Escritório da ONU de Assuntos Humanitários, Ocha, entre 18 e 23 de junho, três missões coordenadas programadas para retirar suprimentos de ajuda do lado palestino da passagem de Kerem Shalom foram canceladas devido a preocupações com a segurança.
Combustível
Além disso, a operação em Rafah e os desafios na recuperação de combustível em Kerem Shalom estão levando a uma grande escassez de combustível, afetando as operações de ajuda e o funcionamento de instalações essenciais de água, saneamento, saúde e outras na Faixa de Gaza.
De acordo com a Ocha, desde o início de 2024, apenas 14% do combustível que costumava entrar em Gaza mensalmente antes de outubro de 2023 foi autorizado a entrar.
O Ministério da Saúde de Gaza revelou que, até 24 de junho, pelo menos 37.626 palestinos foram mortos na Faixa de Gaza desde 7 de outubro. Outros 86.098 palestinos foram registrados como feridos.
Crianças
Em sessão do Conselho de Segurança nesta quarta-feira, o vice-diretor executivo do Unicef afirmou que as crianças em Israel e no Estado da Palestina continuam a passar por um sofrimento incompreensível, especialmente na Faixa de Gaza.
Citando dados do último relatório sobre o efeito dos conflitos nas crianças, ele afirmou que em 2023, foi verificado que 4.312 crianças palestinas e 70 israelenses foram mortas ou mutiladas, representando 37% de todos os casos verificados de mortes e mutilações incluídos no relatório. A maioria das vítimas foi causada por armas explosivas em áreas populosas.
Segundo ele, mais de 23 mil casos relatados de crianças mortas e mutiladas durante 2023 ainda não foram verificados devido à insegurança, restrições de movimento e riscos significativos para o pessoal humanitário que opera em Gaza.
Além disso, os corpos de milhares de crianças desaparecidas continuam enterrados sob os escombros e os números não incluem as milhares de violações relatadas até agora em 2024.
Assim, ele afirma que o Unicef insta as partes envolvidas no conflito a cumprirem suas obrigações de proteger as crianças e a entrarem imediatamente em um cessar-fogo completo.