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AGRICULTURA & PECUÁRIA

Eficiência agrícola dependerá de uso de insumos e tecnologia

Recursos, acrescidos de prática agrícola, impactarão 85% a produtividade até 2029, segundo levantamento do Ipea

O Brasil é o maior produtor de soja do mundo, responsável por 39% da produção global, segundo o USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, na sigla em inglês). Porém, para especialistas, esse protagonismo só será mantido pelos próximos anos se o país investir em inovação, com tecnologias mais modernas para manejo da terra e combate a pragas que impactam a produtividade.

De acordo com publicação do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), até 2029, 85% do crescimento global da produção agrícola dependerá de incrementos na produtividade, resultado do uso mais intensivo de insumos, investimento em tecnologia e melhores práticas agrícolas. Outros 10% deverão ser consequência da intensificação do uso da terra. Apenas 5% estarão atrelados à expansão das áreas de cultivo.

O levantamento atesta uma tendência de escalada da colheita sem o aumento do espaço utilizado para plantio. Da safra de 1976/77 para 2023/24, a produção brasileira de grãos, por exemplo, cresceu 536%. Já a área plantada avançou 113% no mesmo período.

Leia mais sobre o impacto da inovação na agricultura no infográfico.

Para acompanhar essa tendência e se manter na liderança mundial de produção de alimentos, recursos voltados à inovação, ao desenvolvimento e à pesquisa são necessários. Além disso, é preciso que o sistema regulatório brasileiro tenha o mesmo rigor científico atual, mas que os processos não comprometam a inserção de novas tecnologias no campo.

Estas, explicam os especialistas, são fundamentais para controlar doenças, pragas e plantas daninhas que podem dizimar lavouras e trazer impactos econômicos tanto para o produtor quanto para o país.

O engenheiro agrônomo e pesquisador da Staphyt, Nédio Rodrigo Tormen, explica que esses investimentos são importantes para combater doenças causadas por micro-organismos mais adaptativos e em constante mutações. “Hoje, trabalhamos muito forte para mostrar a importância de trazer para o Brasil novos princípios ativos, mecanismos de ação distintos para que consigamos aumentar a eficiência e o controle de doenças e pragas, já considerando um cenário futuro”, disse.

É o caso da ferrugem asiática da soja, causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi. A doença provoca a desfolha precoce da lavoura e impede a formação do grão, impactando, consequentemente, a produtividade. Considerada uma das mais severas para a sojicultura brasileira, os danos às lavouras podem chegar a 90%, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento).

Informações do Consórcio Antiferrugem mostram que o Brasil registrou 324 ocorrências de ferrugem asiática na safra 2023/2024, um aumento de 52% na comparação com a safra de 2019/2020 –com 213 casos.

Tornar a incidência da doença cada vez menor é fundamental para fortalecer a produção de uma cultura que deve responder por 20,8% do PIB (Produto Interno Bruto) do agronegócio e 4,5% do PIB do país, o equivalente a R$ 521 bilhões, em 2024. Os dados são estimativas do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) com a Esalq/USP (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo) e a Abiove (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais).

A sojicultura brasileira também cumpre um papel importante na oferta mundial de alimentos, uma vez que o grão é a fonte de proteína com o melhor custo-benefício, segundo o presidente da Aprosoja (Associação Brasileira dos Produtores de Soja), Maurício Buffon. “A questão da alimentação sempre foi um fator caro na história. Parte dos conflitos mundiais acontece pela falta de alimento, e a agricultura brasileira contribui muito para garantir a segurança alimentar de muitas nações”, afirmou.

Leia mais sobre a participação da soja na economia brasileira no infográfico.

AMEAÇAS ÀS LAVOURAS

Apesar de ser uma doença considerada controlada no país, graças à inovação aplicada no campo nos últimos anos, as mudanças climáticas e o clima tropical do Brasil levam o fungo da ferrugem asiática da soja a mutações e a adaptações, tornando-o mais resistente a químicos disponíveis no mercado, explica Claudia Godoy,  pesquisadora da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) Soja.

Circular técnica de julho de 2024, assinada por Godoy e outros pesquisadores da Embrapa Soja, aborda a perda de eficiência dos defensivos agrícolas utilizados atualmente e a necessidade de inovação, diante das transformações do ciclo de vida do fungo. Segundo Godoy, a cada período de 7 a 10 dias nasce uma nova geração do fungo, ainda mais resistente.

No parecer técnico, os pesquisadores informam que todas as classes de químicos atualmente disponíveis no mercado (mesmo quando misturados) já não demonstram a mesma eficiência no tratamento da doença em decorrência das mutações no fungo.

Os especialistas analisaram 7 fungicidas registrados no Brasil e utilizados para o controle da ferrugem asiática da soja. Um químico, por exemplo, teve uma queda de eficiência de 40 pontos percentuais no combate à doença. Passou de 90% na safra 2003/2004 para 50%, na de 2023/2024.

“A queda de eficiência pode chegar a 30%, dependendo da frequência da mutação e da molécula. Foi uma queda quantitativa, porque os fungicidas não deixaram de funcionar, mas diminuiu a eficiência. Então, já temos uma população de fungo que se tornou resistente, indivíduos que são insensíveis ao material aplicado e vão ganhando mais resistência à medida que se aplica o produto. É um processo de seleção natural”, explicou Godoy .

Leia mais sobre a eficiência dos fungicidas no infográfico.

Os resultados mostram a necessidade de o país investir em inovação no campo. Para Godoy, ter novas moléculas de químicos, as quais o fungo nunca foi exposto, é estratégico para controlar pragas e doenças, como a ferrugem asiática da soja.

Tormen ressalta que o longo tempo do desenvolvimento até o lançamento no mercado de uma nova tecnologia também é um desafio. “Demoramos, desde o descobrimento de uma molécula promissora, lá dentro da indústria, até o lançamento comercial desse produto no campo, um período que dificilmente é menor que 15 anos. Isso custa algo em torno de US$ 350 milhões por molécula”, pontuou.

O tempo para registrar uma nova tecnologia de químico no Brasil é de 5 a 8 anos, conforme os especialistas. Por isso, segundo eles, os produtos não conseguem acompanhar o acelerado processo adaptativo e de geração de fungos como o da ferrugem asiática da soja.

O engenheiro agrônomo e pesquisador da Staphyt ressalta a importância desses novos produtos chegarem com um perfil toxicológico mais adequado, com baixo impacto ao meio ambiente e à saúde humana. “A Corteva, por exemplo, desenvolveu um produto que apresentou uma eficácia muito alta nos testes realizados nas últimas safras”, disse.

O ativo, mencionado por Tormen, é o Haviza, em processo de aprovação no Brasil. O fungicida tem um novo mecanismo de ação para controle da ferrugem asiática na soja e outras doenças fúngicas. A inovação, criada especialmente para a agricultura brasileira, também se diferencia por não ter resistência cruzada –quando uma planta desenvolve resistência a 2 ativos– com outras moléculas que já estão disponíveis no mercado.

CAMINHO PARA UMA NOVA TECNOLOGIA

No Brasil, para uma nova molécula receber o registro, o defensivo agrícola é submetido à avaliação de 3 órgãos do governo federal: Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária); Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, representado pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis); e Ministério da Saúde, representado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

O Mapa faz uma avaliação da eficácia agronômica do produto. Já o Ibama analisa a periculosidade ambiental da tecnologia, e a Anvisa, o risco da exposição da substância à saúde humana.

Em dezembro de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, com vetos, a Lei 14.785/2023 que diminui prazos e modifica regras para aprovação e comercialização de defensivos agrícolas.

O PL (projeto de lei) 1.459/2022, que deu origem à lei, ficou em análise na Câmara dos Deputados por 20 anos e recebeu atualizações no Senado Federal. Pela nova norma, o prazo máximo para inclusão e alteração de registro de produtos de controle ambiental e afins vai variar, conforme o caso, de 30 dias a 2 anos.

Segundo Buffon, a nova regra é um avanço, mas ainda há muito a ser feito para diminuir a burocracia de registro de novos produtos e torná-los mais acessíveis ao produtor. “A nova lei trouxe certa celeridade em relação ao registro de novos componentes químicos de pesticidas. Mas o processo ainda é muito burocrático no Brasil. Em relação aos bioinsumos, que também ajudam no controle da ferrugem asiática da soja e de pragas, ainda está sendo discutida uma nova regulamentação que viabilizará trazer ao Brasil, de forma mais rápida, novas tecnologias com custo menor para o produtor, mais sustentáveis e eficientes”, concluiu.

IMPACTO PARA OS PRODUTORES

Garantir o acesso de produtores a inovações, de produtos e técnicas, é o caminho para uma agricultura cada vez mais produtiva, explicam os especialistas.

Dentre as técnicas aplicadas à soja, Godoy cita:

vazio sanitário: ausência de semeadura da soja a partir da eliminação voluntária das plantas no período contínuo de 90 dias –entressafra. É uma medida fitossanitária para o controle da ferrugem asiática;

monitoramento da lavoura: ajuda a definir o melhor momento para a utilização de fungicidas agrícolas; calendário de semeadura;

implementada no PNCFS (Programa Nacional de Controle da Ferrugem Asiática da Soja), a ação visa à racionalização do número de aplicações de fungicidas e à redução dos riscos de desenvolvimento de resistência do fungo às moléculas químicas utilizadas no seu controle.

“A gente tem a ferrugem asiática no Brasil desde 2001 e, dentre as doenças que atingem a soja, é a que tem mais potencial de causar redução de produtividade. Mesmo que algumas estratégias, como o vazio sanitário, ajudem a reduzir a pressão da doença, isso ainda causa bastante preocupação para o produtor, principalmente porque o fungo se adaptou aos fungicidas que funcionavam tão bem antes”, disse Godoy.

Por isso, a necessidade de trabalhar a inovação como ferramenta contínua para o controle de doenças. Assim, o agricultor terá acesso a soluções cada vez mais inovadoras e sustentáveis para o manejo de doenças, pragas e plantas daninhas, reforçam os especialistas.

Fonte: Poder360

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