Nacional
União estratégica entre oposição e governistas na disputa por poder no Congresso
Por Roberto Tomé
À medida que as eleições para a presidência da Câmara dos Deputados e do Senado Federal se aproximam, o clima de aliança que nunca se imaginou brotar está se revelando – e é muito mais sobre conveniência do que ideologia. Essa é a cara do cenário político atual. O que se vê agora é uma dança ensaiada entre partidos que, em tese, deveriam estar em lados opostos, mas que, surpreendentemente, resolveram dividir o mesmo palco em prol de interesses convergentes.
E no centro desse novo arranjo, o deputado Hugo Motta (Republicanos) se destaca como a estrela apoiada por todos os lados. Com o apoio do PT, PSB, PL, PP e União Brasil, ele é o cara que conseguiu juntar a turma toda – esquerda e direita toda em sincronia. Já no Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil) também desfruta de um apoio plural. E no fim, o que fica é a velha máxima: política é uma questão de oportunidades.
É impossível não ver as digitais do Centrão nesse jogo todo. Conhecidos por sua flexibilidade política e habilidade de transitar entre governos, o Centrão sabe que a união é a chave para segurar as rédeas do poder. Alianças pragmáticas é o seu lema. E esse bloco é o maior interessado na escolha de líderes que sabem negociar e garantir que todos os “aliados” sejam bem recompensados.
Isso, no fundo, gera uma estabilidade artificial, que mais parece uma mesa de jogo de cartas marcadas. Um equilíbrio conveniente, que beneficia parlamentares de todos os lados, deixando para trás qualquer traço de disputa ideológica real. Essa máquina é alimentada pelo desejo de manter posições estratégicas, trocando favores e, é claro, distribuindo benefícios.
Quem se lembra de Severino Cavalcanti sabe o quanto esse jogo é arriscado. Em 2005, ele chegou à presidência da Câmara como um azarão, mas sua queda foi rápida e turbulenta, manchada por denúncias de corrupção. Seu exemplo é um lembrete: não basta ganhar, é preciso manter apoio. Já o caso de Eduardo Cunha, eleito em 2015, é outra prova disso. Conhecido por dominar o Centrão, ele foi um divisor de águas na Câmara – até cair também nas teias da corrupção da Lava Jato.
Esses exemplos são sombras para qualquer novo líder que queira dominar as Casas do Congresso: é preciso habilidade e uma rede de apoio bem costurada, mas o preço da queda é sempre alto. Liderar significa, antes de tudo, jogar o jogo e saber com quem contar – ou até, em quem pisar, quando necessário.
Arthur Lira (Câmara) e Rodrigo Pacheco (Senado) também estão nesse jogo e aprenderam rápido. Apoiando Hugo Motta, Lira consegue manter a paz entre as demandas diversas: o PT, por exemplo, espera uma vaga no TCU como recompensa, enquanto o PL mira em comissões estratégicas. Já o União Brasil, ao abdicar da candidatura de Elmar Nascimento, quer a presidência da CCJ, uma das comissões mais disputadas.
Pacheco, por sua vez, acena para Alcolumbre, garantindo sua influência e, quem sabe, pavimentando seu próprio caminho para uma vaga no STF. Nesse acordo, Lula e Bolsonaro – com toda a rivalidade que vendem ao público – também enxergam vantagens. No fim, manter a base sólida e reduzir os atritos é o que interessa para ambos.
Mas e quem vota? Quem acreditou em promessas de um Congresso mais independente? O eleitor, que ouve as promessas e espera ver compromisso, acaba sendo o maior espectador de um teatro bem montado. A formação desses blocos pragmáticos, a união de forças sem o menor pudor em trair discursos ideológicos, tudo isso demonstra que, para os políticos, há uma distância enorme entre o palanque e o plenário.
No entanto, a tal “estabilidade” que essa aliança promete pode ter um efeito colateral preocupante: uma base governista fortalecida demais é uma democracia frágil.