Internacional
Vietnã rejeita recurso de magnata condenada à morte
Truong My Lan foi condenada no maior caso de fraude financeira da história do país, acusada de desviar US$ 12 bilhões. Tribunal argumenta não haver base para redução da sentença
Um tribunal do Vietnã rejeitou nesta terça-feira (03/12) um recurso da defesa da magnata do ramo imobiliário Truong My Lan para revogar sua sentença de morte. A empresária foi condenada no maior caso de fraude financeira da história do país,acusada de desviar 12,5 bilhões de dólares (R$ 75,7 bilhões), um valor equivalente a quase 3% do PIB do Vietnã em 2022.
Lan, que presidia a empresa do setor imobiliário Van Thinh Phat Holdings Group, foi condenada à morte em abril. Nesta terça, os juízes da corte na cidade de Ho Chi Mihn decidiram que não havia nenhuma base para reduzir a sentença.
A magnata, no entanto, ainda pode reverter a pena, pois, de acordo com a legislação vietnamita, é possível comutar a sentença de morte para prisão perpétua se o condenado devolver 75% do dinheiro desviado. No caso de Lan, ela teria que devolver 9 bilhões de dólares. Esse não é o último recurso do caso. Ela ainda pode pedir anistia ao presidente.
“As consequências que Lan causou são sem precedentes na história do litígio, e a quantidade de dinheiro desviada é de dimensões sem precedentes e irrecuperável”, disseram os promotores, segundo o portal estatal de notícias VietnamNet. “As ações da ré afetaram muitos aspectos da sociedade, do mercado financeiro e da economia.”
Lan, de 68 anos, é provavelmente o alvo mais célebre da recente cruzada anticorrupção do governo comunista, que governa o país desde 1975. A campanha atingiu vários membros da elite empresarial do Vietnã.
A magnata foi presa juntamente com dezenas de outros acusados, incluindo altos funcionários do Banco Central do país. Além de Lan, outros 47 réus entraram com recurso para terem suas penas reduzidas.
Bilhões em prejuízos ao país
Ela foi acusada de usar testas de ferro e funcionários para assumir 91% do Saigon Commercial Bank (SCB), instituição onde ela, oficialmente, não ocupava qualquer cargo e detinha apenas 4% das ações. Entre 2012 e 2022, a empresária teria desviado grandes somas de dinheiro mediante empréstimos para empresas de fachada. As ações eram encobertas mediante pagamento de propina. Segundo o Ministério Público, Lan fez 2,5 mil empréstimos que geraram perdas de 27 bilhões de dólares ao banco.
As repercussões foram sentidas em todo o setor bancário e atingiram duramente a economia vietnamita como um todo. A dimensão da fraude afugentou investidores estrangeiros em um momento em que o Vietnã tentava se afastar da dependência da China e promover suas próprias oportunidades de negócios em nível nacional. Além disso, dezenas de milhares que investiram suas economias no SCB perderam dinheiro, causando um choque na nação comunista.
Ao apelarem contra a condenação, seus advogados argumentaram que havia circunstâncias atenuantes que poderiam resultar na anulação da pena de morte, o que foi negado pelos juízes da corte de Ho Chi Minh.
Na semana passada, a empresária lamentou ter causado um “desperdício de recursos nacionais”, e disse que se sentia “muito envergonhada por ser acusada deste crime”.
A defesa de Lan argumenta ainda que ela já pagou o necessário para se tornar elegível para a redução da pena. A corte reconhece que Lan entregou à Justiça mais de 600 propriedades familiares, mas o valor dos imóveis ainda não foi esclarecido.
Um advogado de Lan disse nesta terça-feira que, em qualquer caso, provavelmente levará anos até que Lan seja executada. As execuções no Vietnã são realizadas por injeção letal.
Quem é Truong My Lan?
Nascida na cidade de Ho Chi Minh em 1956, Lan aproveitou uma onda de mudanças nas políticas econômicas do Vietnã rumo ao livre mercado na década de 1990 para criar a Van Thinh Phat Holdings. Desde então, ela e sua família passaram a controlar imóveis em vastas áreas do país, incluindo residências, shopping centers, propriedades comerciais e hotéis.
Em 2011, ela organizou a fusão do SCB com outras duas instituições. De acordo com os promotores, ela usou o SCB para pagar empréstimos a empresas fantasmas como forma de encobrir o dinheiro que estava pagando em propinas.
Devido à grande escala dos crimes, ela foi ré em dois julgamentos separados. Em outubro, Lan foi condenada à prisão perpétua por pelo roubo 1,2 bilhão de dólares de cerca de 36.000 investidores ao emitir ilegalmente títulos de várias de suas empresas.
Já o veredito que a condenou à morte em abril foi raro. Ela é uma das poucas mulheres no país a ser condenada à morte por um crime do colarinho branco.
O julgamento de Lan foi amplamente coberto pela imprensa vietnamita, que é rigorosamente censurada pelas autoridades, indicando que pretendem divulgar o caso para servir de exemplo.
A magnitude da fraude impressionou observadores, que questionam se outros bancos e instituições podem ter cometido erros similares aos do Saigon Commercial Bank, e abalou o ramo imobiliário.