Segurança Pública
Exército freia e dá meia volta radical após duas denúncias na imprensa: força estaria internando militares como punição pela dispensa de serviço
Em episódios recentes pressão da mídia faz Exército recuar após determinação de internação compulsória para militares dispensados por atestado médico
Duas reportagens recentes em veículos de comunicação da grande mídia levaram o Exército Brasileiro a reavaliar práticas que vinham sendo implementadas em algumas unidades. Os casos envolviam decisões relacionadas ao tratamento de militares afastados das escalas de serviço por conta de dispensas com atestado médico.
A internação compulsória de militares durante as festas de fim de ano causa polêmica no Exército Brasileiro
No Hospital Militar de Área de Brasília (HMAB), a determinação de internar compulsoriamente militares que apresentassem atestados médicos para se ausentar do trabalho durante o período natalino, revelada inicialmente pela Folha de São Paulo, causou indignação. A ordem foi emitida em 20 de dezembro e previa que todos os militares afastados por problemas de saúde fossem internados no hospital durante os dias de ausência.
O documento, assinado pela direção do HMAB, indicava que os servidores deveriam ser encaminhados para internação, sem considerar a gravidade ou natureza do problema de saúde. A medida foi interpretada como uma tentativa de coação por parte de militares da ativa, que denunciaram a prática como uma violação de direitos fundamentais.
Após a reportagem publicada pela Folha, o Comando Militar do Planalto revisou a determinação. Em nota, o Comando declarou que a medida foi suspensa e que os casos seriam tratados de maneira personalizada, respeitando os regulamentos vigentes.
Denúncias no Paraná: militares “convalescendo” no quartel
Outro episódio que ganhou destaque, após reportagem da Revista Sociedade Militar, ocorreu no 34º Batalhão de Infantaria Mecanizado, em Foz do Iguaçu (PR). Documentos internos revelaram que militares afastados por problemas de saúde deveriam permanecer no quartel até a recuperação, sem possibilidade de retornar para casa. A medida foi denunciada como “cárcere privado” por militares que a consideraram punitiva.
O Exército, por sua vez, negou que a prática tivesse sido implementada, argumentando que a orientação visava apenas “conscientizar” os militares do quartel sobre os procedimentos que já são previstos no Regulamento Interno e dos Serviços Gerais (R-1). Segundo a força terrestre, o regulamento permite que o período de convalescença seja cumprido tanto na unidade quanto na residência do militar, desde que o prazo não ultrapasse oito dias.
Denúncia recebida pela Revista Sociedade Militar sobre militares em convalescença
“Esse capitão XXXX que comanda a companhia de comando e apoio no quartel do 34º batalhão de infantaria mecanizado de Foz do Iguaçu, vem cometendo crime de ameaça e cárcere privado contra os cabos e soldados que são seus subordinados, que por algum motivo adoeçam e forem no médico militar do quartel e esse médico achar que o militar doente não pode tirar serviço devido ao seu problema de saúde, com isso o capitão G. T. M. (Capitão M.) executa a prisão do militar doente no alojamento da companhia, usando a desculpa de que esse militar doente irá convalescer no alojamento da companhia, impedindo-os de irem para casa, sendo que esses militares são tratados como presos de fato, pois, o capitão G. T. M. (Capitão M.) manda esses militares se apresentarem para o sargento de serviço na companhia e ficam proibidos de saírem da companhia sempre sendo vigiados.”
Em resposta à Revista Sociedade Militar o comando do Exército explicou que há prescrição regulamentar para a situação. Mas que a prática nunca foi executada:
“… … § 1º A convalescença, a critério do Comandante da Unidade (Cmt U) e mediante parecer do médico, pode ser gozada no interior do quartel ou na residência do interessado, não devendo, neste caso, ultrapassar o prazo máximo de oito dias… Por fim, cumpre esclarecer que as práticas denunciadas no documento nunca foram executadas no âmbito do 34º Batalhão de Infantaria Motorizado, sendo a orientação do aditamento destinada unicamente a informar os militares escalados de serviço. Assim, não procede qualquer alegação de prática criminosa no caso em questão.””
Reações e impacto no Exército e redes sociais de militares
Especialistas em segurança pública e militares da reserva ouvidos pela RSM destacaram que medidas desse tipo, consideradas como arbitrárias, podem ter efeitos negativos sobre a saúde dos militares e sobre a própria segurança das instalações. Segundo eles, o temor de represálias pode levar à omissão de problemas de saúde, colocando em risco tanto os militares quanto a segurança das unidades no caso de militares escalados para guarnecer instalações.
“imagine um soldado muito gripado, ou com covid, que esteja escalado para um dia de serviço… o recruta vai logicamente preferir ficar quieto e dar o serviço, mesmo estando ferrado, do que pegar uma dispensa de 7 dias e ficar internado por ordem no hospital, perdendo todo o final de semana, festas etc.”
As denúncias também foram criticadas como tentativas de desestimular o afastamento médico, especialmente em períodos de alta demanda operacional, como as festas de fim de ano. Para especialistas, essas práticas podem comprometer a integridade física e mental dos militares.
O papel da mídia, que atua como uma espécie de corregedoria informal
A atuação da imprensa tem sido fundamental para a reversão de medidas arbitrárias e ilícitas de comandos militares. A ampla divulgação dos casos em redes sociais, quase sempre monitoradas por canais de mídia e os questionamentos enviados aos comandos do Exército dão luz às situações os coloca diante da avaliação pública, levando à revisão das práticas, ao reforço do compromisso com os regulamentos e direitos dos militares e – em certos casos – à punição e até exoneração dos militares responsáveis por cometer arbitrariedades.