CIÊNCIA & TECNOLOGIA
Abraços virtuais funcionam mesmo?
Você sabia que as pessoas têm uma preferência no lado que gostam de beijar e abraçar?
Abraço virtual
À primeira vista, o termo “abraço digital”, ou “abraço virtual”, pode parecer paradoxal: Afinal, como o ato físico de nos abraçarmos tem a ver com o mundo digital, no qual estamos fisicamente distantes, eventualmente até mesmo um de cada lado do mundo?
Mas a “abraçalidade” que associamos ao abraço talvez não seja redutível apenas às suas características físicas, defendem os professores Mark James (Instituto de Ciência e Tecnologia de Okinawa, no Japão) e John Leader (Faculdade Universitária de Dublin, na Irlanda).
Segundo os dois pesquisadores, a experiência e os sentimentos resultantes de conforto e cuidado, consolo e firmeza que caracterizam um abraço surgem de uma interação complexa de uma infinidade de componentes diferentes, muitos dos quais sobrevivem e podem de fato ser “projetados” em nossos espaços digitais – em psicologia, a projeção envolve atribuir a algo externo algo que está dentro de você.
Os dados foram coletados em sociedades tão diferentes quanto Japão, Reino Unido e México durante a onda mais forte da epidemia de covid-19, quando as pessoas estavam confinadas em suas casas e mais do que nunca usando a internet para se relacionarem.
“Em nossos dados, encontramos muitas histórias. Algumas pessoas pareciam estar lidando bem, celebrando a tecnologia e sua capacidade de facilitar relações sociais saudáveis durante um período desafiador,” disse James. “Por outro lado, havia um grupo de pessoas que estava evidentemente chateado com a situação. Tendo isto como ponto de partida da nossa pesquisa, percebemos que não foi apenas a tecnologia que definiu a interação. O que você fazia antes, durante e mesmo depois da interação – tal como a forma como você refletia sobre a interação em si – tornou-se relevante na formação de sua experiência social online.”
Elemento de uma experiência emocional
Os pesquisadores usaram uma estrutura chamada Matriz de Interação de Realidade Mista, uma grade três por três que serve como um meio de examinar a experiência do abraço (ou qualquer outra experiência), dividindo-a em seus elementos fundamentais, cada um suas contribuições físicas, virtuais e imaginativas. “Isso não implica que todos os componentes contribuam igualmente. Na verdade, ter esse mapa permite começar a pensar sobre quais componentes são mais relevantes e contribuem mais para a experiência. É uma tentativa de compreender os elementos de uma experiência subjetiva,” explicou James.
É no cruzamento desses elementos que emerge uma experiência única, como a de um abraço real. E foi aí que o abraço virtual não ficou muito a dever.
“O que percebemos foi que cada componente, exceto um, o chamado interpessoal-físico, era traduzível para o espaço digital. E não apenas traduzível, mas em alguns casos, até mesmo amplificável. Isto é, as pessoas que conseguem ‘aumentar o volume’ de outros componentes da interação parecem ser capazes de compensar um pouco a ausência daqueles que não estão disponíveis, como o toque físico,” explicou o pesquisador.
Você sabia que as pessoas têm uma preferência no lado que gostam de beijar e abraçar?
Tato digital
Mas abraçar digitalmente pode não ser tão simples quanto abraçar no mundo real. Assim como leva tempo para cultivar habilidades interpessoais para interações sociais, os abraços digitais dependem largamente da habilidade pessoal, algo que os pesquisadores batizaram de “tato digital”.
“Ao observar pessoas que tendem a se sair bem nas interações sociais digitalmente nós começamos a identificar um conjunto de habilidades, que chamamos de tato digital. São pessoas sintonizadas com a realidade de que mesmo no espaço online existirão normas e convenções, que haverá melhores práticas e, fundamentalmente, que há outras pessoas partilhando esse espaço, pessoas com corpos que sentem emoções e têm necessidades, algumas das quais serão diferentes das suas,” descreveu James.
A noção de tato, que compreendemos e reconhecemos nas interações face a face, e que conota o tátil, pretende lembrar-nos que são, de fato, pessoas encarnadas, com todas as suas necessidades corporais, que continuam a povoar os espaços online, mesmo que às vezes estejamos interagindo apenas com seus avatares.
Resta então saber se você ou alguém do seu interesse tem tato digital, ou não. Não é difícil; por exemplo, se você ouvir seu interlocutor lavando as mãos ou cuidando de outra tarefa enquanto fala com você, ele não tem esse tato porque não está lhe dando seu tempo e sua atenção, como se espera em um relacionamento.