Internacional
Como opera a UNRWA, que apoia palestinos e está sob críticas
Dez grandes doadores suspenderam seus repasses à agência da ONU de assistência aos refugiados palestinos, que já sofre falta de recursos há anos. Como ela surgiu e por que está sendo questionada?
Dez dos principais países financiadores da Agência das Nações Unidas de Assistência e Obras para Refugiados da Palestina (UNRWA) suspenderam temporariamente suas doações à entidade: Alemanha, EUA, Austrália, Japão, Itália, Holanda, Canadá, Finlândia, Suíça e Reino Unido.
O motivo são acusações de um suposto envolvimento de funcionários da UNRWA nos ataques terroristas do Hamas a Israel em 7 de outubro de 2023, que a agência já começou a investigar. O Hamas é classificado como uma organização terrorista por União Europeia (UE), Alemanha, Estados Unidos e outros países.
O comissário-geral da UNRWA, Philippe Lazzarini, fez um apelo aos doadores para que reconsiderem sua decisão. “A UNRWA é o ator mais importante para a ajuda humanitária em Gaza”, disse o diplomata suíço-italiano em um comunicado. Mais de dois milhões de pessoas na Faixa de Gaza não conseguiriam sobreviver sem essa ajuda. “Gerenciamos abrigos para mais de um milhão de pessoas e fornecemos à população alimentos e cuidados médicos essenciais”, afirmou.
Entenda a história e as tarefas dessa agência internacional de ajuda:
Por que a UNRWA foi criada?
A agência foi fundada pela Assembleia Geral da ONU em 8 de dezembro de 1949 e entrou em atividade em 1º de maio de 1950. O objetivo era fornecer ajuda aos mais de 700 mil palestinos expulsos de suas casas em decorrência do conflito com Israel.
Israel proclamou o seu Estado em 14 de maio de 1948. No dia seguinte, unidades militares de uma aliança entre Egito, Síria, Líbano, Jordânia e Iraque invadiram a área do antigo Mandato Britânico da Palestina e declararam guerra a Israel, que a venceu no ano seguinte. Ao fim da guerra, Israel detinha cerca de 40% da área inicialmente destinada aos palestinos sob o plano de partilha da ONU de 1947.
A UNRWA tem como mandato fornecer assistência e proteção aos refugiados palestinos até que seja encontrada uma solução política duradoura para sua situação. A gama de atividades inclui educação, assistência médica, serviços sociais e de assistência, infraestrutura de campos de refugiados, microcrédito e ajuda emergencial para refugiados palestinos.
De acordo com a agência, metade de seu orçamento é investido em educação. Ela mantém mais de 700 escolas, o que faz dela a única organização da ONU a operar um sistema escolar completo, de acordo com um comunicado à imprensa de maio de 2023.
Como a UNRWA é financiada?
Quase todo o orçamento da agência vem de doações voluntárias dos países membros da ONU. Os EUA são os maiores doadores, seguidos por Alemanha, União Europeia e Suécia.
Em 2023, a agência tinha um orçamento estimado de 1,745 bilhão de dólares, mas apenas 44% dos fundos necessários foram doados. Em 2022, as doações totalizaram 1,17 bilhão de dólares, sendo que cerca de metade veio de países da UE.
A organização de assistência palestina sofre de subfinanciamento há uma década. No início de 2023, suas dívidas totalizavam cerca de 80 milhões de euros. Isso deve-se não apenas ao aumento das crises e conflitos na região, mas também ao crescente número de refugiados palestinos.
Quem é considerado um refugiado palestino?
De acordo com a definição da Assembleia Geral da ONU de 1952, os refugiados palestinos são “pessoas cujo local normal de residência no período de 1º de junho de 1946 a 15 de maio de 1948 era a Palestina e que perderam suas casas e seus meios de subsistência como resultado do conflito de 1948”.
Segundo a lei internacional e o princípio da unidade familiar, não apenas os refugiados, mas também seus filhos e descendentes desfrutam do status de refugiado. Conforme estabelecido pelas Nações Unidas, esse é um princípio que se aplica a todos os refugiados, não apenas aos palestinos. E ele se aplica até que os motivos da fuga deixem de existir.
Qual é a diferença entre o ACNUR e a UNRWA?
Tanto o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) como a UNRWA foram fundados pela Assembleia Geral da ONU em 1949.
O ACNUR cuida de refugiados em todo o mundo e pode conceder a eles esse status de acordo com a Convenção de Genebra de 1951. Seu mandato também abrange o reassentamento de refugiados e a sua repatriação a seus países de origem.
A UNRWA, por outro lado, é uma organização humanitária que não concede o status de refugiado, mas fornece assistência às pessoas que têm direito a esse status. O mandato da UNRWA envolve o fornecimento de ajuda aos refugiados palestinos em suas cinco áreas de operação: Cisjordânia (incluindo Jerusalém Oriental), Gaza, Síria, Líbano e Jordânia.
Quais são as críticas à UNRWA?
As críticas que políticos de Israel e de outros países têm feito à UNRWA estão relacionadas principalmente à definição de refugiados palestinos. Como os descendentes também são considerados refugiados, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu chamou a organização de ajuda de “agência de consolidação de refugiados” e a há muitos anos defende a sua dissolução.
Outra acusação comum é de que os livros didáticos da UNWRA disseminariam o ódio e a violência. Alemanha, Israel, EUA e outros países acusam a agência de ter professores que aplaudem o terror do Hamas e livros didáticos que pregam o ódio aos judeus. O instituto israelense Impact-SE, que vem trabalhando com a UNRWA há anos, concluiu em uma investigação que “a deslegitimação e a demonização do Estado judeu” dominam os materiais didáticos e que a violência é glorificada.
As acusações mais recentes feitas por Israel de que doze funcionários da agência teriam ajudado o Hamas no ataque a Israel em 7 de outubro ou o apoiado nos dias que se seguiram tiveram grande impacto, e motivaram a suspensão das doações.
De acordo com os números israelenses, cerca de 1.200 pessoas foram mortas em Israel durante o ataque terrorista de Hamas, e cerca de 240 foram sequestradas e levadas para Gaza. Permanecem dentro da Faixa de Gaza 132 reféns, dos quais se estima que 25 possam estar mortos. No lado palestino, mais de 24 mil pessoas morreram desde então, sendo cerca de 70% mulheres e menores, segundo fontes ligadas ao grupo radical islâmico.