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TSE absolve Moro, frustra PT e PL, mas repreende conduta do “ex-presidenciável” na pré-campanha
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) rejeitou nesta terça-feira (21) ações para cassar o mandato do senador Sergio Moro (União–PR), frustrando assim planos do PT e do PL para ocupar sua vaga. Apesar do resultado favorável, vários ministros criticaram a conduta dele durante a pré-campanha, considerada dispendiosa em recursos públicos e “errática”, em razão de sucessivas mudanças de seus planos políticos.
Relator do caso, o ministro Floriano Peixoto afirmou que os gastos realizados no período, que antecede a fase de propaganda oficial, “causam bastante estranheza”. “Tais gastos se mostram censuráveis até sobre um prisma ético, mormente por candidatos que empunharam a bandeira da luta contra o desvio, o locupletamento e a corrupção”, afirmou.
Vice-presidente do TSE, Cármen Lúcia disse que a conduta de Moro “não é exatamente um modelo ético de comportamento na pré-campanha”. “Quando isso acarreta dispêndios e são feitos com dinheiro público, é preciso que se tenha cuidado exagerado […] É preciso apenas alertar que esse período não é algo tolerável para qualquer tipo de comportamento”, disse a ministra, referindo-se aos gastos de Moro antes da campanha oficial.
Desde o julgamento no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), em abril, no qual Moro também foi absolvido, mas por 5 votos a 2, nunca houve consenso sobre o total dessas despesas, efetuadas pelo Podemos e pelo União Brasil para alavancar a candidatura de Moro à Presidência, depois a deputado federal por São Paulo e finalmente o senador pelo Paraná. Os valores variavam de R$ 2 milhões a R$ 5,5 milhões. E a tese de PT e PL era de que Moro teria dissimulado uma candidatura à Presidência, e depois a deputado, para poder gastar mais, e se projetar mais do que seus rivais na disputa pela única cadeira do Senado pelo Paraná disponível.
Por unanimidade, os sete ministros do TSE rechaçaram essas teses, que acusaram Moro de abuso de poder econômico, uso indevido de meios de comunicação, fraude, compra de apoio político, corrupção, desvio de finalidade e lavagem de dinheiro no período que foi de novembro de 2021 e julho de 2022. Para a Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE), que opinou pela absolvição, o trajeto foi marcado por “atabalhoamento”, não por uma suposta intenção de obter vantagem e desequilibrar a disputa contra outros candidatos.
Inicialmente, Moro lançou-se à Presidência, num ato de filiação ao Podemos, em Brasília, festejado por aliados. Aos poucos, a pré-candidatura, no entanto, perdeu força, por falta de apoio interno no partido – pré-candidatos da legenda não acreditavam na vitória, achavam que Moro não traria votos para candidatos a deputado e ainda retiraria deles parte significativa dos fundos partidário e eleitoral, de tamanho menor que os partidos concorrentes.
Em março de 2022, Moro decidiu migrar para o União Brasil na esperança de obter apoio de Simone Tebet (MDB) e Luciano Bivar (ex-PSL) para manter a candidatura presidencial. Se alistou em São Paulo para impulsionar a campanha, mas, no mesmo dia da filiação, outros caciques do partido, especialmente oriundos do DEM, já descartavam seus planos. Restou a ele contentar-se para uma disputa a deputado federal. Mas novos adversários contestaram sua migração de domicílio, apontando falta de ligação com o estado, e ele teve de voltar para o Paraná.
Para tentar a cassação, o PL – que lançou o ex-deputado Paulo Martins ao Senado em 2022 e agora cogitava a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro para a vaga – acusou Moro de uma série de supostos ilícitos nos gastos – como, por exemplo, a contratação de empresas do seu suplente, o advogado Luís Felipe Cunha – para prestar serviços à campanha, de consultoria e advocacia, que superaram R$ 1 milhão. “É uma farra com dinheiro público”, disse, no julgamento, o advogado do partido, Bruno Cristaldi.
O advogado do PT, Miguel Novaes – sigla que estudava lançar a presidente do partido, Gleisi Hoffmann, ao Senado, em caso de cassação –, também tentou convencer os ministros com acusações duras. “Esse caso constitui um dos maiores escândalos em pré-campanha. Não há dúvida que o juiz Sergio Moro condenaria o candidato Sergio Moro. As provas são fartas em todos os aspectos. Desde os gastos realizados pelo Podemos, muitos deles incontestados, que evidentemente apontam para um excesso de gastos na pré-campanha. Somados, são R$ 5,6 milhões”, disse na tribuna.
Para todos os sete ministros do TSE, porém, não havia provas sequer de irregularidades, muito menos de fraudes e corrupção para cassar um mandato e retirar Moro da vida política. “Não há possibilidade aqui de dizer que houve fraude na campanha para se aproveitar de recursos maiores […] Para cassação de registros e decretação de inelegibilidade, esse Tribunal Superior Eleitoral exige provas cabais. São decisões graves que afastam pessoas da vontade do eleitorado e da vida política”, resumiu Alexandre de Moraes, que preside a Corte.
Ele e os demais disseram, em seus votos, que faltam regras sobre a pré-campanha. Advogados que acompanham o caso esperavam que o julgamento colocasse limites aos gastos. Um precedente apontava que se essas despesas, bancadas com recursos públicos do fundo partidário, passassem de 10% do teto de gastos permitidos na campanha, haveria abuso. Mas, no julgamento de Moro, os ministros não avançaram para formar uma tese sobre isso. “Sem regulamentação, temos que analisar caso a caso”, afirmou Moraes.
No mais, alguns ministros consideraram que é normal, na política, um pré-candidato tentar cargos maiores e depois perceber que não teria êxito, passando então a uma candidatura menor. Foram lembrados os casos do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), que também tentou ser candidato à Presidência em 2022; e do empresário Pablo Marçal (PROS), que também teve de abdicar da candidatura presidencial naquele ano.
“Não há registro de vereador que seja alvo por tentar de forma embrionária ser pré-candidato a prefeito. Ações que busquem cassar candidaturas é mais uma faceta da criminalização da política”, disse Kassio Nunes Marques em seu voto – numa sinalização que isso poderá ocorrer nas eleições municipais deste ano.
Em regra, ainda é possível ao PL e ao PT recorrerem da decisão ao próprio TSE e também ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas a chance de sucesso é mínima, e não só nesse caso. A Corte Eleitoral é sempre formada por três ministros do Supremo, e mais dois advogados indicados por eles, por isso reversões são quase impossíveis no TSE. A decisão sobre se haverá ou não recurso caberá, no entanto, aos partidos.
Fator político pesou na decisão favorável a Moro
Também contou para a rejeição dos recursos do PT e do PL o fator político. Na semana passada, antes do início do julgamento, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), intercedeu junto a Moraes, que tem ampla influência sobre a maioria dos ministros do TSE, pela preservação do mandato de Moro. Oficialmente, divulgou que a conversa foi “institucional”, para defender “prerrogativas” dos senadores, a representatividade de seus mandatos, mas que o TSE deveria julgar dentro do “devido processo legal”.
Nas entrelinhas, o apelo foi um sinal para que Moraes não provocasse uma nova revolta por parte de senadores, os quais há tempos pedem seu impeachment, por enxergarem em seus atos e decisões uma perseguição à direita, especialmente aquela mais ligada ao ex-presidente Jair Bolsonaro. Nas últimas semanas, a avaliação no mundo político é de que Moraes está numa fase de “recuo tático”, sem decisões de impacto contra aliados de Bolsonaro.
A mesma trégua pode beneficiar o senador Jorge Seif (PL-SC), também alvo de um processo de cassação no TSE por suposto abuso de poder político. O julgamento de seu caso já começou, mas foi interrompido e pode voltar quando Moraes já estiver fora do TSE, em junho, quando termina seu mandato.