ECONOMIA
Alta dos Juros no Brasil: o impacto das declarações de Lula na credibilidade do Banco Central e no bolso dos brasileiros
Nos últimos meses, o cenário econômico brasileiro tem sido marcado por um intenso debate em torno da taxa básica de juros, a Selic, e da política monetária adotada pelo Banco Central (BC). O pano de fundo desse debate é a transição iminente no comando da instituição, que passará a ter uma maioria de indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a partir de janeiro de 2025. Nesse contexto, as declarações de Lula e a postura de seus indicados têm gerado incertezas e pressões sobre o mercado, refletindo-se diretamente na vida dos brasileiros, que se veem diante de uma perspectiva de juros mais altos.
Recentemente, tanto o atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, quanto o diretor de Política Monetária da autarquia, Gabriel Galípolo, adotaram um tom mais assertivo em relação ao combate à inflação. Essa mudança de postura foi percebida nas comunicações da instituição com o mercado, alterando significativamente as expectativas sobre a trajetória da Selic.
O principal motivo dessa mudança é a necessidade de reforçar a credibilidade do Banco Central, especialmente diante da desconfiança que se instaurou após as críticas frequentes de Lula à condução da política monetária. Durante meses, o presidente teceu comentários que sugeriam a existência de uma suposta conspiração no Banco Central para sabotar a economia brasileira, personificada na figura de Campos Neto, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Essas declarações acabaram por gerar dúvidas sobre o compromisso dos futuros indicados de Lula com a meta de inflação, o que, por sua vez, encareceu o custo da confiança no mercado financeiro.
Até a semana passada, o consenso no mercado era de que havia uma possibilidade considerável de manutenção da Selic nos atuais 10,50% ao ano, com uma chance não desprezível de alta de 0,25 pontos percentuais na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para setembro. As curvas futuras de juros indicavam uma alta de 24 pontos-base, e as opções de Copom da B3 apontavam para uma probabilidade de 59% de manutenção da taxa.
Contudo, a partir das declarações mais recentes de Campos Neto e Galípolo, esse cenário começou a mudar. Ambos os dirigentes do Banco Central deixaram claro que as expectativas de inflação precisavam ser desencorajadas e que o balanço de riscos da autoridade monetária indicava maiores chances de pressões inflacionárias persistentes. Esse posicionamento firme foi interpretado pelo mercado como um sinal de que o BC estaria disposto a elevar a Selic para manter o compromisso com a meta de inflação de 3%.
A necessidade de um choque de credibilidade tornou-se evidente à medida que o mercado ajustou suas expectativas. Campos Neto garantiu que o compromisso com a meta de inflação estava “sedimentado” entre os diretores do BC, indicando que essa diretriz não seria alterada, mesmo com a mudança na composição do colegiado a partir de 2025.
Galípolo, apontado como o favorito para assumir a presidência do BC no próximo ano, também se pronunciou publicamente para afastar qualquer temor de que pudesse adotar uma postura mais leniente em relação à inflação. Ele foi enfático ao afirmar que a autoridade monetária faria o necessário para atingir a meta de inflação, e que, se o governo desejasse taxas de juros mais baixas, deveria então alterar a meta estabelecida.
Diante da necessidade de preservar a credibilidade dos seus indicados ao Banco Central, o próprio Lula adotou um tom mais cauteloso. Em entrevista à Rádio Gaúcha na última sexta-feira, 16 de agosto, o presidente falou sobre a importância de nomear uma pessoa “com muito caráter, seriedade e responsabilidade” para o comando do BC. Lula enfatizou que o futuro presidente da autarquia não deve favores ao presidente da República e deve ter compromisso com o povo brasileiro, destacando que essa pessoa deverá ter a coragem de tanto reduzir quanto aumentar os juros, conforme necessário.
Essa ambiguidade no discurso de Lula foi interpretada pelo mercado como uma tentativa de evitar uma mudança brusca em sua retórica, ao mesmo tempo, em que sinalizava um possível alinhamento com as diretrizes tradicionais de política monetária do BC.
Como resultado dessas declarações e do novo cenário que se desenha para o Banco Central, as expectativas de mercado mudaram rapidamente. Se, até recentemente, a principal discussão girava em torno da manutenção ou não da Selic no patamar atual, agora a questão passou a ser de quanto será o aumento na próxima reunião do Copom. As curvas futuras de juros já precificam uma alta de 32 pontos-base, indicando que um aumento de 0,25 pontos percentuais na Selic em setembro é o mínimo esperado. As opções de Copom da B3 agora apontam para uma probabilidade de 38% de alta de 0,25 p.p., 32% de alta de 0,5 p.p. e apenas 30% de manutenção da taxa.
A pressão sobre o Banco Central para demonstrar sua independência e compromisso com o combate à inflação, em meio às críticas e incertezas geradas pelas declarações de Lula, fez com que o custo da credibilidade subisse. Isso se traduz em uma Selic potencialmente mais alta, o que impacta diretamente o crédito, o consumo e o investimento no país. Para os brasileiros, isso significa um custo de vida mais elevado e uma economia que precisa lidar com os desafios impostos por uma política monetária mais restritiva. A atuação do Banco Central nos próximos meses será crucial para definir os rumos da economia e para restaurar a confiança no compromisso do Brasil com a estabilidade econômica.